RELEVO | Pedro Matos
“A reforma do Novo Mercado deveria estar alguns passos adiante”
Pedro Matos

Pedro Matos

Criado em 2000, o Novo Mercado consolidou-se como o principal segmento de listagem da bolsa brasileira. Hoje abriga 131 companhias e prepara-se para receber mais nomes importantes, como o Atacadão, que controla as operações do Carrefour no Brasil, e a Vale, proveniente do nível tradicional. A adesão ao segmento premium de governança corporativa da B3 tem suas recompensas. Na última década, as companhias listadas no Novo Mercado apresentaram um desempenho melhor que as demais, segundo Pedro Matos, professor da Universidade da Virgínia e autor do estudo “Uma avaliação de ‘dual class shares’ no Brasil”. O levantamento, encomendado pelo CFA Institute em parceria com a Amec (associação que representa minoritários), revela que as empresas que emitem apenas ações ordinárias geram mais valor para os acionistas, além de serem mais lucrativas. O histórico positivo faz do Novo Mercado um benchmark para outros países, mas não reduz os desafios do segmento. Na visão de Matos, a reforma em curso, apesar de positiva, está atrasada. “Parte do debate atual começou em 2010. A discussão poderia estar alguns passos adiante”, observa. Neste mês, as companhias estão votando as propostas da Bolsa. Confira a seguir os principais trechos da entrevista que Matos concedeu à CAPITAL ABERTO.

 Avanço e retrocessos

“Diversos países estão discutindo os rumos da governança. Nesse contexto, há duas corridas em curso: uma que pretende elevar o padrão para o topo e outra que quer levá-lo para baixo. O Brasil é um exemplo do primeiro grupo, mas há o receio de que outros mercados retrocedam. Nos Estados Unidos, empresas de tecnologia estão oferecendo ações com direitos distintos e até mesmo sem direitos, como foi o caso do Snap. A questão é que o mercado americano oferece muita proteção legal aos investidores, ao contrário de outras jurisdições nas quais o sistema judicial não é forte e a saída é a autorregulação.”

Direitos diferenciados

“No S&P1500, o principal índice de ações dos Estados Unidos, menos de 10% do valor de mercado corresponde a companhias emissoras de ações com direitos diferenciados. Já entre as companhias que fizeram IPOs recentes, esse percentual sobe para 15%, sobretudo por causa das ofertas do setor de tecnologia. Há o receio de que mercados como os de Hong Kong e Cingapura abram mão do ‘one share, one vote’ para capturar novos IPOs — a listagem do Alibaba [em 2014], em Nova York, ilustra esse fenômeno.”

Reforma no Brasil

“Ela está um pouco atrasada. Parte do debate começou em 2010. Por isso, acredito que a discussão poderia estar alguns passos adiante. Um ponto que merece ser observado é o conselho de administração das companhias brasileiras, ainda minúsculo. Num cenário de maior dispersão acionária, a tendência é o conflito deixar de ser entre minoritários e controladores, como hoje, para ser entre acionistas e administração. Por isso precisamos de conselhos maiores, mais especializados e independentes. Outra questão é a remuneração dos administradores, que precisa de transparência. Nos Estados Unidos há, inclusive, divulgação de benefícios como o uso de motorista particular e jatos executivos. A utilização excessiva dessas compensações diminuiu depois que os dados se tornaram públicos. “

OPA obrigatória

“No S&P1500, observamos um movimento de retirada de poison pills. A ideia é dar mais poder ao acionista. Na Europa essa discussão também ocorreu e não se chegou a um consenso. Na minha visão, a OPA obrigatória proposta na reforma do Novo Mercado [a sugestão da Bolsa é que a OPA seja disparada sempre que um acionista acumular entre 20% e 30% do capital social — o percentual exato será deliberado pelas companhias que ainda não tiverem o dispositivo em seus estatutos] é uma barreira um pouco restrita ao funcionamento do mercado, mesmo levando em consideração a elevada concentração acionária das companhias brasileiras. Pessoalmente, não acredito muito na OPA obrigatória, mas talvez faça sentido adotá-la numa transição [entre a concentração acionária e a ampla dispersão].”

Problema global

“Nos Estados Unidos, o número de companhias listadas caiu de 8 mil para menos de 5 mil na última década. Capturar empresas para o mercado de capitais é um problema global, assim como a concentração das companhias em poucas bolsas — que acabam baixando exigências para continuarem atrativas. Nesse ponto, a bolsa brasileira merece ser aplaudida. Ao criar o Novo Mercado, procurou, de forma orgânica, resolver problemas que o Estado não resolveu.”

Capital de longo prazo

“Para captar esses recursos estrangeiros [de endowments e fundos de pensão] é preciso estabelecer regras previsíveis. Há um círculo vicioso no Brasil: o investidor não vem porque o mercado local é pequeno e o mercado é pequeno por falta de investidores. Para transformar esse círculo em virtuoso dependemos de iniciativas como a do Novo Mercado. Governança atrai investidor de longo prazo e um ambiente estável atrai investimentos com horizonte de 20, 40 anos.”

 Quem paga a conta

“Será importante a chegada de companhias grandes, como a Vale, ao Novo Mercado. Quando ocorre esse tipo de migração, acredito que quem deve pagar a conta da diluição é o controlador. Foi o que aconteceu com o grupo Ultrapar. Em 2011, a empresa converteu as preferenciais em ordinárias na proporção 1 para 1. Antes da migração, os controladores tinham 66% das ONs e, depois da ida para o Novo Mercado, passaram a ter apenas 24%. Eles aceitaram esse custo porque ganharam liquidez.”

 

 

 

 


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