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Para o bem — ou para o mal?
A implementação de sofisticados sistemas eletrônicos de controle pode, ironicamente, ajudar a esconder malfeitos nas organizações
, Para o bem — ou para o mal?, Capital Aberto

Eliseu Martins*/ Ilustração: Julia Padula

Foi-se o tempo em que o empresário sonegador precisava do conluio de uma rede formada por comprador, funcionário da portaria, estoquista, vendedor, tesoureiro e, finalmente, contador, para comprar, receber, estocar e entregar mercadoria sem nota, com meia-nota ou com outros tipos de irregularidades.

Ele podia virar refém de um ou de vários integrantes dessa cadeia e, conforme a empresa crescia, dependia da cooperação e do silêncio de mais pessoas dessas áreas e de outras igualmente vitais para a sonegação. Houve casos de empresas que quebraram por causa da insatisfação de um desses elos — que tinha as provas na mão.

O mesmo valia para situações em que se corrompia alguém. Muitos visualizavam com facilidade o que ocorria nos pontos-chave da empresa, o que multiplicava os riscos. Em grandes organizações, dezenas e dezenas poderiam ter conhecimento do que se passava.

A recente implementação de sistemas de controle provocou algo curioso: se manipulados para o bem, eles realmente ajudam como nunca a evitar irregularidades — principalmente quando operam de forma integrada. Mas, se manipulados para o mal, pouquíssimas pessoas, e somente do alto escalão (às vezes duas, apenas), fazem a sonegação grassar e a corrupção aumentar. Importante ressaltar que isso era impossível antes, quando sempre se precisava de vários componentes “de baixo”.

Agora basta alguém de sistemas em cumplicidade com mais alguém “do dinheiro” e tudo está feito.

Comumente, as ações irregulares hoje passam ao largo do contador, do auditor interno e do auditor externo. Ninguém precisa mais da colaboração desses personagens — muito menos dos chefes de portarias, dos controladores de estoques e afins, principalmente nas empresas maiores, que têm sistemas parrudos sob a guarda de um comandante.

O caixa acha que tudo está realmente sendo registrado, o comprador e o vendedor também; o chefe da obra, o engenheiro-chefe, o precificador, o controlador da produção, o apontador da mão de obra, o estoquista, o auditor interno, o contador — todos ignoram olimpicamente o que se passa. Assim como o auditor externo.

Nesse novo esquema, todo o recurso malversado vai para o bolso de alguém (o pior, se é que se pode usar essa expressão nesse contexto, é quando até o dono está alheio a tudo que acontece). Daí para a corrupção, o passo é fácil.

Interessante notar que antes a empresa crescia e na mesma medida aumentava a dificuldade em sonegar ou simplesmente retirar dinheiro de dentro dela. Hoje ocorre o contrário: quanto mais cresce a empresa, fica mais fácil esconder a malversação do dinheiro, para qualquer rumo que seja.

E mais longe desse processo podem ir ficando os profissionais da contabilidade e das auditorias. Com isso é possível entender muitos dos questionamentos feitos sem razão a esses profissionais e muita da falta de atenção que se dá a outras áreas.

O eixo da Terra vai entortando, e às vezes não se percebe.


* Eliseu Martins ([email protected]) é professor emérito da FEA-USP e da FEA/RP-USP, consultor e parecerista na área contábil


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