Código de governança sob medida — e acolhido pelo regulador
Marta Viegas

Marta Viegas

Há muita expectativa em torno da versão final da nova Instrução 480 da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), cuja minuta foi mantida em audiência pública até o último dia 20 de fevereiro. Afinal, a alteração da instrução que dispõe sobre o registro de companhia aberta tem potencial para elevar substancialmente o nível e a transparência das práticas de governança das companhias abertas brasileiras, em uma guinada capaz de promover avanço semelhante aos de marcos como o lançamento do Novo Mercado da BM&FBovespa, em 2000, ou a criação do formulário de referência, pela própria CVM, em 2009.

Diferentemente dessas inovações que emanaram de um ente específico, o que se obtém agora é a coroação de um projeto colaborativo. Em uma iniciativa inédita em sua história, o regulador decidiu exigir das empresas a divulgação do seu grau de aderência ao Código Brasileiro de Governança Corporativa – Companhias Abertas, conjunto de recomendações de governança elaborado por participantes do mercado — companhias, investidores, intermediários e demais públicos interessados reunidos no Grupo de Trabalho Interagentes (GT Interagentes). A audiência pública serviu para a CVM ouvir sugestões sobre a melhor forma de solicitar esse tipo de informação.

O acolhimento do código pela CVM demonstra uma visão moderna de disciplinamento do mercado; evita o risco da mão pesada do Estado na imposição de regras que poderiam desconsiderar o contexto de quem vive a aplicação diuturna das normas.

Baseado no princípio do “pratique ou explique”, o código do GT Interagentes confere a flexibilidade necessária para que cada empresa escolha as práticas que mais agregam valor a sua realidade. A abordagem “pratique ou explique” e suas variações (“comply or explain”, “apply or explain”, “if not, why not”) são mais flexíveis que a regulação tradicional: em vez de simplesmente cumprir a regra, pode-se apresentar uma explicação para uma aparente desconformidade. No fundo, está se admitindo que não há fórmula única para se atender a necessidades e atributos de empresas de diferentes portes, estratégias e setores de atuação.

O GT Interagentes teve o cuidado de reconhecer o mérito de rotas já pavimentadas pelo mercado. A forma do texto reflete a estrutura do código da Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca), desenvolvido segundo o regime “aplique ou explique”. Já as 54 práticas selecionadas pelo grupo têm como base o conteúdo do Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa do IBGC, bastante atual em função da revisão incorrida ao longo de 2015.

Ao recepcionar o código na Instrução 480, o regulador do mercado chama para si a responsabilidade pela supervisão das respostas das companhias, algo que foi enfaticamente recomendado por especialistas do Banco Mundial. Isso significa que a CVM poderá agir, de acordo com a sua metodologia de supervisão baseada em risco, caso identifique informações falsas, incompletas, inconsistentes ou que induzam o investidor a erro.

Mas para o sistema funcionar bem será preciso mais do que supervisão formal. Espera-se que as companhias reflitam sobre suas escolhas, para então amadurecerem seus modelos de governança. Os investidores, por sua vez, devem usufruir a transparência que lhes é proporcionada, analisando as informações com a devida profundidade e considerando que a ausência de adoção de uma determinada prática não significa necessariamente descumprimento ou má governança.

O lançamento do Código Brasileiro de Governança Corporativa – Companhias Abertas pelo GT Interagentes e sua adoção pela CVM devem ser celebrados. Em última instância, sobreleva o fato de que há forte correlação inversa entre integridade do ambiente regulatório dos mercados e custo de capital. As empresas que visam emitir valores mobiliários buscam mercados mais transparentes, estáveis e previsíveis, nos quais a qualidade do arcabouço normativo é fator decisivo. E uma das razões para isso é o menor custo de capital em termos absoluto e relativo nesses mercados.


*Marta Viegas ([email protected]) coordenou a equipe responsável pelo desenvolvimento do Código Brasileiro de Governança Corporativa – Companhias Abertas


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