“A ética é a estética de dentro”
Pierre Reverdy
Quando se trata de desenvolvimento econômico e social, uma pequena palavra estrangeira — gap, que em tradução livre significa lacuna, hiato — consegue bem dar conta dos enormes desafios que o Brasil tem no horizonte. Afinal, é gap para todo lado: gap de infraestrutura, de produtividade, de poupança, de comércio exterior (que faz do País um mercado semifechado). Isso sem falar no gap de desenvolvimento humano, que envolve deficiências nas áreas de educação, saúde, saneamento básico, segurança — os aspectos que definem qualidade de vida.
Mas há um outro gap que também faz enorme mal ao Brasil. Ele tem o poder de influenciar toda a sociedade, e de maneira perversa. Do primeiro escalão da política ao cotidiano dos cidadãos, ele deixa sua marca perniciosa. É o gap ético.
Na evolução de uma sociedade, algumas transformações só se materializam pela via da crise. É por isso que realmente creio que esses últimos anos recentes serão tratados pela história de uma maneira muito positiva no que se refere a seus impactos. Acredito, verdadeiramente, que sairemos dessa situação muito melhores do que jamais fomos.
E o sinal mais contundente dessa revolução será o culto à ética, acompanhado de sua prática no dia a dia.
Em algumas dimensões da vida, as pessoas sabem o que é certo, mas acostumam-se a aceitar o errado; em outras circunstâncias, fazem o errado e sequer conseguem vislumbrar o certo. Ocorre que, no contexto particular do Brasil, uma transformação já começou a ser desencadeada por esta que é mais grave crise que provavelmente o País já vivenciou. A necessidade de mudança conclama a atenção nacional para que se procurem os caminhos certos. Entretanto, isso não é suficiente para que a mudança seja sólida.
A única forma de efetivamente se gerar um movimento consequente de aprimoramento da moral e da ética na sociedade brasileira é pela via da educação. E isso, definitivamente, não se dará pelo investimento no ensino superior. Infelizmente, os investimentos públicos em educação no Brasil ainda são distribuídos de forma completamente contrária a qualquer propósito de se aperfeiçoar a ética. A grande massa dos investimentos é destinada ao ensino superior. Entendo que esse foco deveria ser voltado o ensino básico — afinal, é na infância que são aprendidos os conceitos básicos de cidadania e a necessidade da prática da empatia, e é nessa fase da vida que se desenvolve a autoestima.
Todos esses elementos são fundamentais no desenvolvimento de uma sociedade sadia, em que imperam os preceitos éticos. Enquanto não se consegue transformar de forma consistente a sociedade, as leis e regulamentos cumprem papel de altíssima importância. Mas não bastam. Cada agente econômico, cada empresa, deve ter também — e de forma muito clara — o seu propósito, sua cultura e seus valores. Não é por acaso que o tão propalado compliance se dá pela referência às leis e regulamentos, mas também pelo respeito à cultura e aos valores de cada uma das organizações que empregam a massa de trabalho no País. Elas têm papel vital no aprimoramento da prática de valores éticos.
Todavia, para que todas as organizações se alinhem a esses conceitos, é urgente que os governos e a sociedade civil estejam irmanados e imbuídos de objetivos convergentes. E, para que isso aconteça, o Brasil carece de uma liderança capaz de conquistar corações e mentes. Aguardemos, pois, a próxima campanha eleitoral, observando, vigilantemente, os compromissos que cada candidato apresentar e, ainda mais, as suas reais condições para de fato cumpri-los. A ética e a moralização da administração pública são condições inegociáveis e absolutamente inadiáveis.
Que os brasileiros encarem 2018 como o ano crucial para a arrancada do País rumo ao sonho do desenvolvimento socioeconômico em um contexto de sociedade ética. A alternativa a isso é, infelizmente, a permanência do Brasil no ocaso por muitos anos mais.
O Brasil tem jeito. Mas é pela via da ética. E isso está nas mãos dos cidadãos.
* Henrique Luz ([email protected]) é sócio e membro do comitê executivo da PwC Brasil e passa a escrever periodicamente como colunista para Capital Aberto
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