O nome do jogo é escala
Consolidação das gestoras de recursos tende a fortalecer o mercado
André Leite (andre.leite@taginvest.com.br) é sócio e diretor de gestão da Tag Investimentos (colaborou Marcelo Pereira, sócio e diretor de risco e compliance da empresa)

André Leite ([email protected]) é sócio e diretor de
gestão da Tag Investimentos (colaborou Marcelo Pereira, sócio e
diretor de risco e compliance da empresa)

A base de dados do sistema de informações financeiras Quantum mostra que existe hoje no mercado brasileiro um total de 798 empresas de administração de recursos. Dentre elas, as que trabalham com patrimônio sob gestão em ativos líquidos somam 584. A fim de refinar ainda mais a nossa pesquisa (e para evitar dupla contagem de patrimônio em estruturas do tipo master-feeder, em que um fundo usualmente com taxa zero recebe aplicações de diversos fundos com diferentes valores mínimos e taxas de administração), fomos buscar os dados filtrados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima).

De acordo com a entidade, 535 das gestoras são responsáveis pela administração de um patrimônio de cerca de R$ 2,86 trilhões — o que dá uma saudável média de R$ 5,3 bilhões por empresa. O problema da média, entretanto, é justamente esse: o sujeito está com a cabeça congelando no freezer e o pé queimando no forno, mas na média está em uma temperatura agradável. Na indústria de gestão de recursos nada é mais enganador do que a média.

Para se ter uma ideia, as dez maiores gestoras do País respondem por R$ 2,1 trilhões do total de recursos administrados. Isso mesmo: um percentual inferior a 2% das gestoras fica com pouco mais de 73% dos ativos sob gestão. Na verdade, o dado faz muito sentido se olharmos mais a fundo e verificarmos que, das dez maiores, sete pertencem a grandes bancos de varejo e que as três restantes fazem parte de grandes bancos de atacado.

Um exercício interessante é tentar fazer uma estimativa de qual seria o patrimônio sob gestão mínimo necessário para que uma gestora no Brasil conseguisse honrar os seus compromissos e remunerar minimamente o custo de oportunidade de seus executivos seniores. Partindo de uma estrutura básica (composta de uma sala com cem metros quadrados, um terminal Bloomberg, um sócio responsável pela gestão, um sócio encarregado da avaliação de risco e do compliance, dois analistas não tão seniores e um funcionário administrativo) atingimos um custo anual de aproximadamente R$ 1,2 milhão. Assumindo que essa gestora hipotética cobre uma taxa média de gestão de 1,75% (entre fundos abertos exclusivos) e que remunere a distribuição externa com 30% da taxa de administração, chegamos a uma receita líquida da ordem de 1,2% ao ano. Com isso, obtemos um número de R$ 100 milhões para o patrimônio — montante necessário para se fazer jus ao custo anual estimado de R$ 1,2 milhão.

Estressando um pouco os números (basicamente deixando os sócios com zero de remuneração), chegamos a um patrimônio mínimo de R$ 50 milhões para que a empresa possa rodar “no osso”. Abaixo desse valor, portanto, já teríamos uma estrutura bem aquém do que seria o mínimo desejável.

Antes de vermos como esses patrimônios “de corte” se encaixam na indústria brasileira de administração de recursos, cabe ressaltar que a figura do sócio responsável pela gestão do risco e pelo compliance é nova, tendo sido introduzida pela Instrução 558 da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Cada vez mais o regulador cria exigências adicionais em termos de estrutura e custos, o que naturalmente eleva a “barra” para os gestores. E essa tendência não caminha para se enfraquecer — ao contrário, deve se intensificar ao longo do tempo, em nossa visão. Novas regulamentações devem ser anunciadas, visando garantir maior transparência e mais controles internos na administração de recursos.

Voltando ao ranking da indústria. Os dados mostram que 187 gestoras têm atualmente um patrimônio sob administração menor do que R$ 50 milhões, e nada menos do que 250 empresas fazem a gestão de um volume inferior a R$ 100 milhões. Somados, esses dois grupos representam perto de metade do total e têm sob administração um patrimônio em torno de R$ 8 bilhões — o que resulta em uma média de apenas R$ 32 milhões por empresa, bem abaixo do já citado “corte” mínimo de R$ 50 milhões em patrimônio para uma empresa de gestão poder operar com condições adequadas.

Claramente, estamos descrevendo uma indústria que necessita passar por um processo de consolidação. O nome do jogo é escala. Afinal, uma equipe de gestão de cinco pessoas que trabalhe com renda variável, por exemplo, consegue gerir R$ 100 milhões ou R$ 300 milhões sem praticamente adicionar qualquer custo extra conforme aumenta o patrimônio sob sua responsabilidade.

Em nossa função de alocadores, estudamos e interagimos com uma parte significativa desses gestores. A nossa avaliação é de que as gestoras nem sempre têm uma visão empresarial do próprio negócio — muitas vezes são formadas por excelentes executivos, oriundos de bancos ou gestoras maiores, mas que creem que um banquinho e um violão são suficientes para se fazer um grande show. Nem sempre. Aliás, quase nunca.

Parece meio básico, mas notamos em boa parte dessas empresas a falta do conceito dos “4 Ps” do marketing (produto, preço, promoção e ponto). Nem sempre elas têm uma grade de produtos coerente ou produtos em que se note uma diferenciação em relação à indústria. O preço costuma ser padronizado no mercado e a percepção é de que, em geral, é alto para os resultados entregues pela média (claro que existem exceções, mas são pontos fora da curva). Promoção é outro item em que se observa muito pouca ação. Ponto (o equivalente a distribuição, no caso da administração de recursos) é um pilar importante frequentemente renegado por muitos gestores (afinal, quando não se tem uma rede de varejo, o uso de acordos e de canais digitais é fundamental para a distribuição dos produtos). Além de uma boa equipe de gestão, uma gestora demanda sempre um executivo de primeira cuidando desses quatro pilares.

Com isso, nos parece inevitável (e saudável) que a indústria brasileira de gestão de recursos caminhe para uma consolidação, com compras e fusões entre empresas. Exemplos recentes não faltam, como a absorção da Corttex pela Mauá, a compra da MPV pela Bozano e a aquisição da Sunset pela Guepardo. Somente esse processo, darwiniano, será capaz de prover o País de uma indústria de gestão de recursos cada vez mais forte e capacitada.


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