Na agenda do Planalto
Reestréia do GT Capital pode ser indício de que o governo olhará com mais atenção para o mercado de capitais

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O governo começa a se movimentar para cumprir a promessa anunciada em campanha de promover o desenvolvimento do mercado de capitais. Em meio a esforços para retomada do crescimento econômico, foi criado através da Portaria Interministerial 240, editada em 26 de agosto, o chamado GT Capital, grupo de trabalho composto por dez instâncias do Executivo e dedicado a formular uma política de longo prazo para fortalecimento do mercado.

“A formação desse grupo é um indicativo forte de que o governo quer olhar o problema com mais atenção”, afirma Adacir dos Reis, secretário de Previdência Complementar do Ministério da Previdência Social. O GT Capital é semelhante ao grupo de trabalho que existia no governo FHC e estava inativo desde o início do governo Lula. Em sua agenda de atividades, constam desde questões mais estruturais como o de bate em torno da nova Lei de Falências, a reforma da Previdência e um novo marco regulatório para setores como saneamento básico e energia até projetos como o que permite o uso de parte do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) nas aplicações em ações e o que promove a reforma contábil da Lei das S.As. Também na pauta estão a criação de políticas específicas para transferência de capital entre setores da economia e o estímulo à criação de novos fundos de investimentos imobiliários.

FUNDOS DE PENSÃO – A principal contribuição do GT Capital até agora foi a revisão do regulamento que rege os fundos de pensão. “A rigor, esse foi o primeiro grande passo”, diz Luiz Antônio de Sampaio Campos, diretor da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que participou de várias reuniões do grupo para reformulação da norma. Em 25 de setembro, a resolução 3.121 do Conselho Monetário Nacional (CMN) revogou a antiga 2.829 e introduziu novas regras para aplicação dos recursos dos planos de entidades fechadas de previdência complementar.

Passou a ser permitida a aplicação de recursos dos fundos de pensão em cotas de fundos de direitos creditórios, ampliando suas possibilidades de diversificação de risco. As entidades também foram habilitadas a aplicar 20% da carteira em papéis de renda fixa de alto e médio risco, independentemente do tipo de plano. Foi mantida a escala de participações em ações conforme o nível de boa governança corporativa e transparência da empresa investida. Se as companhias forem do nível 2 ou Novo Mercado, é permitida a aplicação de até 50% do patrimônio do fundo (ver tabela).

TRANSFERÊNCIA DE CAPITAIS – Promover a transferência de recursos entre setores da economia através do mercado de capitais é também um objetivo do GT Capital. Hoje o país vive uma verdadeira euforia com o estouro de negócios na agroindústria exportadora em contraste com a escassez de recursos para investimentos em outras áreas. Uma alternativa do grupo para reduzir essas diferenças é a criação de fundos de investimentos no âmbito do projeto batizado como PIPs – Programa de Incentivo à Implementação de Projetos Sociais. Lançado em junho pelo Governo Federal, o programa prevê investimentos em projetos sociais com recursos captados via fundos imobiliários ou de recebíveis. “Seria extremamente bom para o Brasil se agricultores com recursos abundantes em função do câmbio comprassem cotas de projetos de saneamento ou habitação, inclusive na própria região em que atuam”, afirma Joaquim Levy, secretário do Tesouro Nacional. “Seria uma maneira de termos a recirculação da poupança.”

A demanda é enorme na área social e os recursos no Orçamento são parcos. Em relação ao saneamento básico, o Ministério das Cidades estima que, para universalizar o sistema, seria necessário um investimento de cerca de R$ 160 bilhões em 15 anos. Por isso, a preocupação de Levy em propor a transferência de recursos via aplicações em fundos. Ele entende ainda que o governo poderia dar algum tipo de subsídio para equilibrar a taxa de retorno desses investimentos, na linha das parcerias entre iniciativa pública e privada que, conforme já disse o presidente Lula, serão o caminho para superar a falta de verba pública.

FGTS E REFORMA CONTÁBIL – Na agenda de trabalhos do GT Capital está ainda a reforma contábil da Lei das S.As. Aprovada a nova Lei de Falências, a idéia é voltar esforços para que o texto seja votado com rapidez, pois é considerado essencial pelos órgãos que participam do grupo. O projeto de número 3.741 é controverso e ainda está em discussão na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados. A reforma prevê a divulgação de novas demonstrações contábeis pelas companhias e, em seu artigo mais polêmico, passa a exigir a divulgação de balanços por empresas limitadas com ativos superiores a R$ 240 milhões ou receita bruta anual maior que R$ 300 milhões.

Também na pauta de discussões está o projeto em votação no Senado que prevê o uso do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) para aplicações em ações. O uso do fundo é amplamente defendido pelo presidente da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), Raymundo Magliano Filho, que já visitou inúmeros senadores com o intuito de convencê-los a votar a favor do projeto. Tasso Jereissati (PSDB-CE), escolhido para relator do texto, não tem posição oficial sobre o assunto e se esquiva de fazer comentários. O consenso está longe de ser obtido. O PT, por exemplo, sempre foi resistente à idéia. Líderes do partido defendem que o FGTS seja utilizado de maneira prioritária na construção de moradias.

REFORMA DA PREVIDÊNCIA – Reformas mais estruturais do país também estão sendo olhadas pelo GT Capital como meios importantes para restabelecimento da poupança indispensável para a existência de um mercado de capitais mais vibrante. O secretário Adacir Reis concentra suas atenções na reforma previdenciária, a qual tem previsão de ser promulgada até o final do ano pelo Congresso. Pelos cálculos preliminares do governo, o potencial de adesão de novos funcionários públicos aos fundos de previdência complementar é de 30 a 40 mil ao ano. Isso porque quem quiser se aposentar com mais de R$ 2,4 mil por mês terá de pertencer aos fundos que serão criados a partir da entrada em vigor da emenda constitucional.

De acordo com o deputado e ex-ministro da Previdência, Roberto Brant (PFL-MG), a inclusão do artigo que cria a previdência pública complementar para os novos funcionários é o grande mérito da reforma proposta por Lula. Hoje, os fundos de pensão têm em carteira cerca de R$ 215 bilhões, com a participação de 2,5 milhões de pessoas, número considerado modesto por Adacir Reis. A estimativa, segundo ele, é de que em 10 anos esse valor possa dobrar e os fundos tenham a participação de 8 milhões de poupadores. “Boa parte desse dinheiro pode perfeitamente ir para o mercado de capitais, desde que seja algo atrativo”.

Primeira tarefa do grupo foi a revisão do regulamento que rege os fundos de pensão

A nova Lei de Falências, em votação no Congresso, também está no foco do governo e entre as prioridades do GT Capital. Segundo declarações de Antonio Palocci, a nova lei se soma aos esforços do Executivo para levar regras mais modernas e claras à iniciativa privada. Luis Suzigan, economista-chefe da LCA Consultores, observa que mudança na lei é um sinal positivo também para o investidor externo. A votação da medida foi incluída como parte dos compromissos do Brasil com o Fundo Monetário Internacional (FMI). “A previsibilidade e a velocidade do governo em decisões conflituosas também são importantes para o bom funcionamento do mercado de capitais”, argumenta Joaquim Levy.

NOVO MARCO REGULATÓRIO – Questões relacionadas ao marco regulatório são vistas como fundamentais para recuperar o interesse e a confiança dos investidores, principalmente nos segmentos de saneamento e energia elétrica. No primeiro caso, o governo de Fernando Henrique Cardoso, em 2001, chegou a enviar um projeto de lei para a Câmara que mudava a titularidade dos serviços dos municípios para os estados. Esse ponto foi considerado fundamental por especialistas para desatar o nó que impede a formação de escala pelas empresas do segmento, principalmente no momento em que se discute a privatização dos serviços de tratamento de água e esgoto do País.

Entretanto, o projeto foi engavetado pela própria bancada governista (tucanos e pefelistas) no Congresso Nacional. O principal problema foi o lobby de empresas nacionais, que querem o serviço como está hoje, em poder dos municípios. Com o governo Lula, o tema volta à pauta legislativa. O governo está convicto de que, sem um novo formato legal para o segmento, as boas intenções ficarão relegadas outra vez à gaveta.

O setor elétrico também carece de regras melhores, ao mesmo tempo em que precisa de novos investimentos. O governo e a indústria reconhecem o risco de haver um novo apagão em 2007 se a economia voltar a crescer a um ritmo médio superior a 5,5% do Produto Interno Bruto (PIB) a partir do ano que vem. O desafio na busca de recursos não é modesto. De acordo com a Associação Brasileira de Investidores em Energia Elétrica, o setor requer R$ 15 bilhões anuais, mas os cofres públicos só podem arcar com R$ 5 bilhões. Apenas a Usina de Belo Monte (Pará), um dos projetos em curso, tem previsão de gasto de US$ 6 bilhões.

A ministra das Minas e Energia sinaliza no sentido de que o Executivo envie um projeto a ser estudado pelo Legislativo ainda este ano. Mas o presidente da Câmara dos Deputados, João Paulo Cunha (PT-SP), prevê que a votação da matéria ocorrerá apenas em 2004. Entre os aspectos a serem revistos, está a verticalização do sistema. No momento, geração, transmissão e distribuição estão interligados. Precisariam ser desmembrados por lei.

MUDANÇA DE RUMO – A criação do GT Capital em agosto mostrou uma nova disposição do governo em tratar assuntos que propiciem o desenvolvimento do mercado de capitais. Até então, predominava no mercado o sentimento de que o governo não estava dando a devida atenção a suas promessas de campanha no que diz respeito esse tema. Antes de ser eleito, Lula compareceu a um evento comemorativo na Bovespa em que anunciou o seu plano de desenvolvimento para o mercado de capitais, na mesma linha do Plano Diretor que havia sido criado meses antes por entidades privadas. O descaso do governo com o mercado foi sentido dentro da CVM. Luiz Leonardo Cantidiano, presidente da comissão, se mostrou desconfortável com a situação por diversas vezes, principalmente devido à falta de indicações para duas vagas a serem preenchidas no colegiado da CVM. Uma delas está em aberto desde o ano passado e a outra é hoje ocupada por Luiz Antonio de Sampaio Campos, que já demonstrou a intenção de deixar a comissão mas ainda aguarda uma solução por parte do governo. Nos bastidores do Congresso, houve rumores de que as indicações poderiam ser políticas e não técnicas.

Essa hipótese decepcionou a cúpula da CVM e Cantidiano chegou a manifestar a intenção de deixar a comissão. Mas a criação do GT Capital e as propostas definidas para o grupo nos últimos meses diminuíram o desgaste e até animam o comando da comissão. Quanto à escolha dos novos diretores, Adacir dos Reis coloca panos quentes sobre a questão. “A seleção será feita por critérios técnicos, até onde eu tenho conhecimento”, afirma. “Não tenho motivos para duvidar de que esse critério prevalecerá”, concorda Sampaio Campos.

Outros indícios de que as indicações poderão ser mesmo técnicas vêm da trajetória de Palocci à frente da pasta mais importante da Esplanada. Até agora, todos os postos-chave da Fazenda e do Banco Central foram preenchidos por técnicos, inclusive alguns remanescentes da administração do ex-ministro Pedro Malan.


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