Pesquisar
Close this search box.
Gôndolas para investir
XP e Órama querem introduzir o modelo de supermercados financeiros no Brasil, mas enfrentam um obstáculo cultural: os investidores pessoas físicas estão dispostos a sair das asas dos bancos?

, Gôndolas para investir, Capital Aberto

 

Tudo começou com a eclosão da crise financeira, há três anos. A reputação dos bancos estava trincada, e Guilherme Benchimol, sócio–fundador da corretora XP Investimentos, enxergava ali uma oportunidade: era a hora de buscar os investidores que até então só operavam com essas instituições porque se sentiam mais seguros. “O cliente passou a pensar duas vezes antes de procurar um banco para aplicar em fundo de investimentos, fazer uma previdência ou comprar um seguro”, afirma Benchimol. Ele também percebia uma deficiência em seu principal concorrente: a impossibilidade de comparar produtos. Uma vez dentro do banco, o cliente fica refém dos produtos para ele oferecidos — uma situação que incomodava os aplicadores. Feitas as contas e analisados os riscos, Benchimol não tinha mais dúvidas: aquele era o momento certo de criar um supermercado financeiro. E na internet.

A empreitada do fundador da XP é um sinal de novas tendências na distribuição de produtos financeiros. No supermercado eletrônico, o cliente navega por prateleiras de ações, futuros, fundos, títulos de renda fixa, imóveis, previdência privada e seguros. Ali é possível analisar a taxa de administração e a rentabilidade de um fundo que mais interessou, por exemplo, e, se restarem dúvidas, compará–lo com a carteira similar de uma gestora independente. Para montar sua loja virtual, no ar desde 2009, a XP estudou os mercados norte–americano e europeu. E contratou para auxiliá–la o anglo–australiano Mark Collier, ex–CEO da Charles Schwab e da Fidelity, duas empresas que consolidaram o modelo de supermercados nos Estados Unidos. “Ambas chegaram à conclusão de que tinham uma enorme rede de distribuição e de que seus clientes queriam ter acesso, por meio de uma única conta e em um só lugar, a uma rede ampla de opções de investimentos”, diz Collier.

A Charles Schwab tinha menos de dez anos em atividade quando entrou nesse ramo, em 1988. Hoje, aos 30, tem 13,9 mil empregados e, de janeiro a setembro deste ano, acumulou uma receita líquida de US$ 3,5 bilhões. Os ativos de seus clientes somam US$ 1,58 trilhão. A companhia opera em 45 estados norte–americanos, com filiais em Porto Rico e Londres, além de uma subsidiária em Hong Kong. Seu nível de especialização é elevado. Diferentes serviços e produtos são oferecidos aos clientes investidores com base em seu estilo, sua língua e cultura. Como exemplo, a Charles Schwab oferece atendimento especializado para as comunidades asiáticas e latinas nos Estados Unidos. Todos os clientes têm acesso ao serviço de pesquisa, que oferece ferramentas para análise, relatórios de performance, e materiais educacionais e de análise de mercado.

Enquanto a XP optou por imitar a Schwab e fazer um supermercado de investimentos, a Órama criou sua delicatessen. Fundada pelos criadores da Ágora, iniciou suas operações em julho de 2011 com o objetivo de levar ao pequeno investidor a oportunidade de entrar em fundos prestigiados como os da Gávea Investimentos, JGP e Investidor Profissional, com uma aplicação mínima de R$ 5 mil. Normalmente, essas gestoras exigem desembolsos iniciais de R$ 50 mil a R$ 300 mil. “Além disso, nossos produtos são selecionados previamente, de modo que todos podem ser considerados uma boa opção”, afirma Guilherme Horn, CEO da Órama.

“Os investidores se cansaram de ser empurrados pelos bancos para produtos caros e de baixa performance”

BARREIRA CULTURAL — Ainda é cedo para julgar se o modelo de supermercado é uma tendência também no Brasil. Nos Estados Unidos, um dos fatores que fizeram esse segmento tomar impulso foi a aura de independência que reveste essas empresas, que distribuem, em sua maior parte, opções de aplicações geridas por terceiros. “Os investidores estavam cansados de ser empurrados pelos bancos para produtos próprios que eram caros e de baixa performance”, conta Collier. Mas, por aqui, quem está começando a investir ainda é muito suscetível à influência das agências bancárias. Benchimol reconhece que, apesar do empurrãozinho dado pela crise financeira, seu principal desafio ainda é convencer as pessoas a investir fora dos bancos. Na tentativa de transpor essa barreira cultural, a XP mantém uma agenda extensa de cursos — são mais de 300 por mês e 5 mil alunos no total, com perfis que variam de estudantes a aposentados.

A internet é outra grande aliada do modelo. Ao permitir que o cliente analise e compare as opções disponíveis, num formato de autosserviço, proporciona uma sensação de independência e autonomia que é apreciada pelos clientes. “A internet trouxe ao aplicador a possibilidade de tomar decisões sozinho”, observa Horn. A Órama aposta fortemente no potencial da rede. Seu site apresenta vídeos dos gestores contando como funcionam as carteiras e fazendo análises sobre as estratégias dos fundos. Esse é o máximo de contato humano que o endereço proporciona. Todo o restante do processo é feito online. De acordo com Horn, o mundo virtual ameniza os eventuais conflitos de interesses na indicação de determinados produtos, como ocorre nos bancos ou em outras casas de aconselhamento financeiro. “A internet veio para quebrar esse conflito e capacitar o investidor a tomar decisões por si.”

Para Collier, a internet é a vantagem que o Brasil tem em relação aos Estados Unidos, que iniciou seu processo de implantação de supermercados financeiros há 20 anos. Ele arrisca prever que a autonomia conquistada pelo investidor provocará mudanças significativas no sistema de distribuição ao longo dos próximos dois anos. Algumas consequências seriam o interesse até dos grandes fundos por essa forma de investimento e a aposta de grandes instituições financeiras nessa modalidade. “Os bancos vão acabar reconhecendo que os consumidores querem escolher os produtos”, conclui.

Professor de finanças do Ins–tituto Coppead, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Ricardo Câmara Leal não tem o mesmo entusiasmo com o sistema de supermercados. Ele lembra que o País já experimentou outras possibilidades de investimento por meio de portais, principalmente durante a bolha da internet, no início dos anos 2000. “Naquela época, era possível investir até a partir de sites de jornalismo.” Leal admite, no entanto, que a extensa oferta de aplicações financeiras proporcionada pela ferr amenta pode ser um atrativo para quem busca diversidade. Já Walter Ness, professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC–Rio), parece gostar mais da ideia. Ele acredita em seu potencial de estimular a concorrência. “O mercado brasileiro é muito concentrado”, justifica.

O aspecto cultural segue como o principal risco do supermercado. Apesar das ranhuras deixadas pela crise, ainda existe uma percepção geral de que os bancos não quebram — simplesmente porque os governos não os deixam quebrar. De outro lado, a queda dos juros e o surgimento de novas gestoras independentes são um impulso à maior diversidade de produtos e à presença de outros canais de distribuição. As iniciativas de XP e Órama são, em resumo, frutos da aposta num investidor menos dependente dos bancos, mais bem informado e autoconfiante. Como o crescimento dos investimentos e da poupança é interesse de todos, tomara que elas estejam certas.


Para continuar lendo, cadastre-se!
E ganhe acesso gratuito
a 3 conteúdos mensalmente.


Ou assine a partir de R$ 34,40/mês!
Você terá acesso permanente
e ilimitado ao portal, além de descontos
especiais em cursos e webinars.


Você está lendo {{count_online}} de {{limit_online}} matérias gratuitas por mês

Você atingiu o limite de {{limit_online}} matérias gratuitas por mês.

Faça agora uma assinatura e tenha acesso ao melhor conteúdo sobre mercado de capitais


Ja é assinante? Clique aqui

mais
conteúdos

APROVEITE!

Adquira a Assinatura Superior por apenas R$ 0,90 no primeiro mês e tenha acesso ilimitado aos conteúdos no portal e no App.

Use o cupom 90centavos no carrinho.

A partir do 2º mês a parcela será de R$ 48,00.
Você pode cancelar a sua assinatura a qualquer momento.