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Forno quente, demanda fria
Matéria-prima cara e grande produção mundial de aço mantêm Usiminas em crise

, Forno quente, demanda fria, Capital AbertoO ano de 2010 parecia ser o da redenção para a Usiminas. Nas demonstrações financeiras do primeiro trimestre, lucro de R$ 309 milhões, compra da mineradora J. Mendes e anúncios de reajuste no preço do aço. Muito diferente do ocorrido em 2009, quando os altos-fornos da imensa capacidade instalada da Usiminas esfriaram junto com a economia. Já no segundo trimestre de 2010, a produção de aço bruto cresceu 105% quando comparada com o mesmo período do ano anterior. Mas o valor do minério de ferro, principal matéria-prima da indústria, também dobrou, bem como cresceu a participação de siderúrgicas estrangeiras no mercado nacional. O excesso de oferta, tanto de aço quanto de dólares, começou a maltratar a Usiminas.

O resultado pode ser medido na bolsa: queda de 25,48% entre o fim de março e setembro. É verdade que a euforia do início do ano contribuiu para a queda tão acentuada. “O otimismo da Usiminas no primeiro semestre foi um pouco exagerado”, constata Carlos Lima, sócio da XP Gestão de Recursos. Em conversas com analistas, a direção da companhia falava em aumento de preços da ordem de 30%. Até aquele momento, a Usiminas vinha contabilizando aumento no custo, com as subidas do minério de ferro e do carvão, sem poder repassá-lo aos consumidores. Cabe a explicação de que, após 40 anos, as mineradoras mudaram o padrão dos contratos. Em vez dos acertos anuais, depois da crise os preços passaram a se reajustar a cada três meses.

Para se defender, a Usiminas cogitava usar o mesmo método para o mercado de aço. A ligeira recuperação da economia e a euforia dos preços altos do minério de ferro indicavam ter chegado a hora da mudança. Um dos piores anos da história da indústria, 2009 havia ficado para trás. Mas a política de reajustes não contava com o tropeço da economia mundial no segundo semestre. As impressoras de dólares do Tesouro americano e as siderúrgicas estrangeiras continuaram com o mesmo ritmo de produção.

Antes da crise, o aço importado representava menos de 5% do mercado brasileiro. “Hoje, esse patamar passa de 20%. Tem entrado aço de tudo quanto é lado no Brasil”, diz Pedro Galdi, analista de siderurgia da corretora SLW. Culpa do dólar barato, mas não só dele. Com a capacidade instalada bem acima da demanda, siderúrgicas — especialmente da China — têm jogado para empatar, se equilibrando nas margens para não serem obrigadas a tomar a mais drástica das decisões: desligar altos-fornos.

No jargão da indústria, o verbo usado é “abafar.” Uma operação cara, demorada e irreversível no curto prazo. O alto-forno é projetado para funcionar ininterruptamente, a uma temperatura constante. Semanas são necessárias para que o abafamento seja concluído, o alto-forno, limpo, e o equipamento, reparado. Com o esfriamento, o aço que gruda nas paredes do alto-forno tem de ser tirado. Tudo isso para interromper a produção e tentar equilibrar a demanda. Para se ter ideia do tamanho da crise, dos cinco altos-fornos da Usiminas, três foram desligados em 2009.

A capacidade de produção da Usiminas em aço plano é de 9,5 milhões de toneladas por ano, ou 2,3 milhões a cada três meses. Entre abril e junho de 2009, saíram dos altos-fornos apenas 944 mil toneladas. Um crescimento constante fez a produção atingir 1,8 milhão de toneladas no segundo trimestre de 2010. A má notícia é que esse deve ser o recorde do ano. “No terceiro trimestre, a produção não deve passar de 1,6 milhão de toneladas”, projeta Galdi, da SLW. E a perspectiva é a mesma para os últimos três meses de 2010.

Para não dizer que a Usiminas caminha para mais um ano perdido, a companhia anunciou a criação da sua própria mineradora. O sugestivo nome de Musa (Mineração Usiminas S.A.) foi dado em junho, quando a siderúrgica apresentou a japonesa Sumitomo como sua sócia estratégica no negócio. Por algo em torno de US$ 2 bilhões, a participação nipônica na empresa chega a 30% do capital. Os ativos originais da Musa foram adquiridos em 2008, com a compra da mineradora J.Mendes. A participação na empresa de logística MRS também foi transferida para a nova empresa, que pretende produzir 29 milhões de toneladas de minério de ferro em 2015. A Musa trará mais independência à Usiminas em relação aos preços de sua principal matéria-prima.

Enquanto isso não acontece, a agonia da indústria continua sendo grande. Tanto é que sensibilizou o governo federal. No fim de outubro, o imposto de importação de 16 tipos de aço passou a ser calculado sobre uma tabela de preços mínimos. A incidência dos 12% do imposto de importação deixou de ser sobre o valor da nota. Esses preços estariam subfaturados pelo excesso de oferta mundial.

Elaborada pelo Instituto Aço Brasil, representante das siderúrgicas nacionais, a tabela leva em consideração o custo de produção de cada uma das especificações do aço. As ações da Usiminas subiram 3,9% no dia do anúncio da nova política fiscal. Mas, enquanto as temperaturas da demanda por aço e dos altos-fornos estiverem descoladas, os investidores continuarão chamuscados.


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