O ano de 2008 terminou sem respostas sobre o destino da Bovespa diante da crise financeira global. Em meio aos estragos no pregão, todos querem saber quais ações vão se dar bem (ou menos mal) no cenário de falta de liquidez e desaceleração econômica previsto para 2009. Não há, claro, respostas definitivas para essa pergunta. Mas também não há dúvidas de que melhor do que começar o ano no escuro é consultar especialistas de investimentos sobre seus papéis favoritos. Foi o que fez a CAPITAL ABERTO, numa sondagem com meia dúzia de fontes. Nossa grata surpresa foi perceber que, em meio a tantas indefinições, alguns papéis são apontados com ênfase.
As ações da Itaúsa, holding do grupo Itaú, são um desses casos. A fusão com o Unibanco — que gerou o maior grupo financeiro do Hemisfério Sul, com ativos de R$ 575,1 bilhões — colocou a instituição em condições de brigar com os grandes players do setor lá fora. “A união trará uma escala que dificilmente será atingida por outro banco brasileiro e promoverá sinergias que tornarão a Itaúsa mais eficiente”, comenta Paulo Esteves, analista-chefe da Gradual Corretora.
A holding não está sozinha. Os papéis dos grandes bancos foram citados por todos os especialistas consultados. Além de essas instituições apresentarem liquidez satisfatória em termos operacionais e uma base de depósitos significativa, suas ações possuem bom nível de negociação. As virtudes não anulam os percalços previstos, como o aumento da inadimplência e a diminuição da rentabilidade. “Mas estes já estão precificados nos papéis”, diz Guilherme Kobylko, gestor de renda variável do Banco CR2.
DENTRO DE CASA — Um dos mandamentos para 2009 é privilegiar setores focados no mercado doméstico. No cenário de crise, o consumo interno passará por duas situações distintas. Enquanto o ímpeto de compra de bens duráveis, em especial automóveis, promete uma redução significativa, a compra de artigos não duráveis tem chances de se manter elevada. “A crise não deverá impactar de forma profunda o comportamento dos brasileiros na hora de comprar roupas e alimentos”, diz Tiago Franceschini, analista de investimentos da Lafis.
Lojas Renner aparece como boa opção nessa seara. A companhia de varejo gaúcha ostenta uma liquidez satisfatória, uma operação bem estruturada e margens de lucro confortáveis. No estouro da crise, cancelou a aquisição da concorrente Leader por R$ 670 milhões. O plano para 2009 é retomar as compras, aproveitando o colchão de reservas e o preço mais convidativo das empresas. Mesmo com as perspectivas de baixo impacto no consumo, a Renner é cautelosa: anunciou plano de corte de custos e ganhos de produtividade. O uso de matéria-prima importada, que em 2008 chegou a 15% do total, deve cair para 12% neste ano. “A combinação de bons produtos e preços atraentes faz da Renner a melhor opção no setor”, afirma Clodoir Vieira, economista-chefe da Corretora Souza Barros.
Outra favorita dentre os papéis das empresas de consumo é a Marfrig. Para os analistas, a companhia do segmento alimentício tem potencial para apresentar bons resultados, a despeito do cenário econômico. “A turbulência afetará pouco o consumo de proteína”, pondera Jayme Alves, analista de investimentos da Spinelli Corretora. “Além disso, há possibilidades de bons ganhos de sinergia com a aquisição de ativos da OSI”, completa. Em junho de 2008, a Marfrig comprou 15 unidades européias de processamento do maior fornecedor de carne do McDonald’s, o OSI, por US$ 680 milhões — um passo definitivo para avançar no mercado europeu.
NA ESTRADA CERTA — Quando o desafio é identificar as poucas possibilidades de ganho na bolsa, estudar as peculiaridades da empresa é fundamental. Veja-se o caso das concessionárias de rodovias. Diretamente relacionado à atividade econômica, o segmento tem tudo para ser afetado pela crise em 2009. Estudo realizado pela Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR), em dezembro, mostra que o fluxo de automóveis por rodovias com pedágios já diminuiu 0,5% em novembro, na comparação com o mês anterior. Ainda assim, a Companhia de Concessões Rodoviárias (CCR) está na lista azul dos analistas. A companhia exibe ótima posição de caixa e práticas de austeridade financeira. Nos leilões de 2008, não deu lances arrojados e perdeu disputas importantes, como a das rodovias Dom Pedro e Ayrton Senna/Carvalho Pinto, em São Paulo. Considerada uma decepção no passado, a atitude tornou-se um trunfo para a CCR. “Como as outras concessionárias se endividaram muito para vencer os últimos leilões, nos próximos a CCR pode obter concessões por preços mais baratos”, comenta Eduardo Kondo, analista de investimentos da Concórdia. “A empresa foi muito criticada na época, os papéis sofreram, mas o tempo mostrou que a estratégia foi acertada”, lembra.
Quando o assunto é o setor de energia, os papéis da Cemig são freqüentemente citados. A companhia tem forte geração de caixa e uma situação financeira equilibrada, com baixa exposição em dólar. “A Cemig vem aumentando o investimento em geração e transmissão, dois segmentos que têm margens superiores às da distribuição”, diz Vieira, da Souza Barros.
E o que falar das perspectivas de desaceleração da atividade industrial, uma das principais fontes consumidoras de energia elétrica? De fato, o setor produtivo tem participação importante na composição da receita de distribuição da Cemig. Mas, como a empresa tem boa parte de sua energia contratada no longo prazo com clientes industriais, a situação está confortável. “Seus resultados são imunes à redução esperada no nível de atividade econômica e tornam a receita bastante previsível”, diz Luciana Pazos, analista da Gradual. Com essas características, é um papel recomendado para quem pretende ficar na defensiva.
Em novembro, a Cemig foi a única do setor elétrico da América Latina a entrar para a carteira do novo índice The Global Dow Index — que reúne empresas líderes de países desenvolvidos e emergentes e serve como referência de papéis blue chips ou com potencial de se tornar ações de primeira linha. Petrobras e Vale foram outras brasileiras a entrar no índice composto de 150 companhias de 25 países.
No time dos papéis defensivos, figura ainda o setor de telecomunicações, cujas operadoras costumam ter receitas previsíveis e pagar bons dividendos. Um dos destaques é a Telesp. A expectativa é de que a companhia sofra menos com a tendência de redução do uso da telefonia fixa, pois atua em concessão de serviços de banda larga e TV por assinatura — dois segmentos com excelente potencial no Brasil.
Kobylko, do Banco CR2, lembra que as ações consideradas defensivas oscilam pouco. Assim, podem tanto preservar o patrimônio do aplicador no momento de baixa quanto dever um crescimento mais exuberante na alta. “Numa eventual recuperação da bolsa, esses papéis tenderão a subir modestamente, porque também caíram pouco”, diz. A queda mais acentuada da Telesp desde a quebra do Banco Lehman Brothers, em 15 de setembro, se deu no dia 1º de dezembro, quando foi de R$ 36,12 a R$ 33,84. No dia 11 de dezembro, os papéis já valiam R$ 36,3. Portanto, se o investidor estiver disposto a aproveitar a baixa para semear ganhos mais polpudos, os papéis defensivos podem não ser a melhor opção.
FIM DO CICLO — Como era de se esperar, a opção por commodities — principal figurante de carteiras de investimento dos últimos anos — não foi das mais exaltadas pelos analistas. Relatório divulgado, em novembro, pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) prevê retração de 0,3% no PIB das economias desenvolvidas para 2009. Os países emergentes não devem entrar em recessão — a perspectiva é de crescimento médio de 5% —, mas o avanço será substancialmente menor que o observado em 2007 e 2006 (6,6% e 8%, respectivamente). Com isso, a demanda pelas commodities será pequena, e os preços vão se manter em baixa. A previsão para o preço médio do barril do petróleo em 2009 é US$ 68, o que definitivamente contribui para um ano de pouco crescimento para as empresas do setor. Ainda assim, companhias de commodities podem ser encontradas em algumas recomendações dos analistas. A explicação está mais relacionada à depreciação dos papéis do que às condições de mercado. “A Petrobras está mais barata do que antes do anúncio do Présal”, observa Vieira, da Souza Barros.
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