Encarando a ressaca
Mukund Rajan

, Encarando a ressaca, Capital AbertoFundado em 1868 e dono de um faturamento de US$ 83,3 bilhões em 2011, o grupo Tata é um dos símbolos mais óbvios do empreendedorismo indiano, com um leque de negócios que vão de cerâmicas a sistemas de gestão empresarial. Bagagem, portanto, não é problema para a multinacional, praticamente uma novata como gestora de private equity — se lançou como tal em 2007, por meio da Tata Capital, subsidiária de serviços financeiros do império empresarial de Ratan Tata. A Tata Capital poderia se lamentar por ter entrado um pouco tarde nesse mercado, no fim do pico de captações de fundos devotados à Índia (o ápice foi atingido entre 2007 e 2008). Porém, com sorte de principiante, a gestora se livrou da situação vexatória que várias das firmas que levantaram recursos fabulosos naquela época enfrentam hoje: dar explicações sobre retornos decepcionantes. Responsável pelo Opportunities Fund, maior fundo de private equity da Tata Capital, Mukund Rajan falou, nesta entrevista, do esfriamento da empolgação dos investidores internacionais com seu país e dos fundamentos que ainda inspiram confiança.

CAPITAL ABERTO — A Índia já foi a queridinha dos investidores globais de private equity e desbancou a China, em 2007, em termos de captação. Hoje, eles parecem desapontados. O que deu errado?
MUKUND RAJAN — Seu sentimento está correto. A decepção tem a ver com a natureza dos fundos levantados na época e o perfil das firmas que conseguiram captar. Investimento de private equity na Índia é algo relativamente novo. Podemos dizer que os primeiros gestores surgiram somente nos anos 2000, e a maioria viveu só um ciclo completo de investimento, desde a captação até a saída. Além disso, boa parte desses investimentos pioneiros nem era, exatamente, private equity no sentido mais puro. Muitos fundos se aproveitaram da euforia que tomava conta do mercado acionário até 2008 para comprar posições bem pequenas em empresas, mas cujo valor era capaz de expandir rapidamente, em dois ou três anos. Havia uma piada na Índia de que era só dar um passeio em Wall Street para voltar com uma mala cheia de dinheiro. A disponibilidade de recurso fácil era tal que os gestores passaram a investir, sem muita diligência, em empresas e projetos de baixa qualidade. Os bons negócios tiveram seus preços inflados devido à competição.

Mas o que interrompeu esse clima de euforia?
Em algum momento, o mercado ia parar de crescer daquele jeito, o que de fato ocorreu com a crise financeira internacional, em 2008. Vários daqueles investimentos afundaram e dificilmente trarão retorno. Ao entregarem seu patrimônio a quem não estava pronto, os investidores queimaram seus dedos. E grande parte dos gestores nem conseguiu erguer um segundo fundo desde então. A boa notícia é que esse ciclo se encerrou. Nossa expectativa é de que os próximos meses serão o melhor período para se investir na Índia.

Os investidores não parecem tão otimistas. No ano passado, a Índia ficou bem atrás de outros mercados emergentes em volume de recursos captados por fundos de private equity.
O nível de captação, realmente, permaneceu baixo. Em 2011, os investimentos em empresas indianas foram bastante elevados, mas feitos por fundos que já haviam se capitalizado há algum tempo. Tanto a China quanto a Índia, por exemplo, sofreram com o baque de 2008. No entanto, enquanto as captações para fundos dedicados à China se recuperaram e já se encontram em níveis superiores ao período pré-crise, na Índia, continuam abaixo das máximas históricas. Dois fatores explicam isso. O primeiro é internacional. No ano passado, investidores institucionais da América do Norte e da Europa demonstraram uma aversão elevada a risco, principalmente em relação a países com os quais não estão muito familiarizados, como a Índia. Na China, os investidores acumulam certa experiência, e os retornos também têm sido bons. Este ano, em certa medida, estamos percebendo uma vontade dos investidores de revisar as estratégias de alocação de capital, olhando com mais atenção territórios menos explorados. No lado doméstico, uma série de contratempos prejudicou a imagem da Índia em 2011, mas eles estão sendo superados.

O senhor se refere a corrupção e fraudes corporativas?
Não somente. Indefinições do governo quanto à regulamentação do setor de telecomunicações levaram a um grande número de litígios. Várias concessões foram canceladas, trazendo insegurança para os investidores. Mas escândalos de corrupção, como a prisão do ex-ministro de telecomunicações (Andimuthu Raja, condenado por receber propinas para a concessão de licenças), também assustaram os investidores. Um tiro no pé foram as medidas tomadas para injetar ânimo na economia, como os incentivos para investimentos no setor varejista, que não demoraram a ser retirados por pressão de certos partidos do Congresso. Isso também teve um impacto negativo. Certamente um número considerável de investidores que poderiam estar interessados em ingressar na Índia ao longo de 2011 decidiu adiar seus planos. Neste ano, alguns desses mesmos investidores concluíram que nunca haverá um tempo ideal para entrar na Índia.

“Nossa expectativa é de que os próximos meses serão o melhor período para se investir na Índia”

As vantagens da Índia no longo prazo são conhecidas: população numerosa e jovem e alto potencial de crescimento econômico. Mas, no curto prazo, existe algo que favoreça os investimentos, além dos preços depreciados?
Se você for um investidor de longo prazo, com certeza a Índia já o atraiu antes e vai continuar a atraí-lo. Percebemos esse apetite, principalmente, em fundos soberanos e fundos de pensão estrangeiros. Todos sabem que sempre haverá altos e baixos e, agora que as coisas vão mal, provavelmente é a melhor hora de investir. Recentemente, por causa do aumento da inflação, os juros subiram na Índia, o que favorece o papel dos fundos de private equity como fontes de financiamento, já que empresas com balanços alavancados começaram a sofrer.

O governo indiano é, hoje, um obstáculo para os investimentos estrangeiros de private equity? Além das denúncias de corrupção, ele também tem sido criticado por querer taxar fundos offshore que, antes, recebiam isenção fiscal.
Não acho que o governo boicote investidores estrangeiros, pois tem se esforçado em abrir as portas para o capital internacional. Só em 2011, os investimentos estrangeiros diretos na Índia somaram US$ 45 bilhões, um recorde. Mas o Estado indiano, como quase todos no mundo, também sofre com déficit fiscal e precisa encontrar uma maneira de incrementar suas receitas. Uma das bandeiras é o combate à evasão fiscal. As regras que serão implementadas até 2013 buscam evitar que indianos usem jurisdições offshore para fugir de impostos. O problema é que essa medida impactará investidores estrangeiros legítimos, e o governo está percebendo isso. Depois de suscitar questionamentos, o Ministério das Finanças deixou claro que está aberto a revisar qualquer ponto do pacote que ameace a confiança do investidor externo. Outra prova da boa vontade do governo indiano com o capital estrangeiro é o fato de a Sebi, a agência equivalente à SEC (Securities and Exchange Commission) dos Estados Unidos, ter deixado os fundos estrangeiros de fora da nova regulamentação, apresentada em maio, sobre fundos de investimentos alternativos. Somente os fundos domésticos estão sujeitos às normas (que exigem, dentre outras coisas, o registro dos fundos e certos procedimentos operacionais).

“Há vários novos players interessados em investir na Índia, sobretudo, em setores como o de infraestrutura”

Os grandes bancos internacionais eram os principais patrocinadores do crescimento indiano recente. Com o solavanco dos principais centros financeiros do mundo, essas instituições diminuíram sua importância?
O que vemos são vários novos players interessados em aportar recursos, sobretudo, em setores com grandes necessidades de capital, como infraestrutura. Fundos soberanos do Oriente Médio e fundos de pensão canadenses, que não vinham para cá, representam esse movimento. Não posso dizer que o papel dos bancos diminuiu. Alguns tiveram de vender participações para solucionar problemas nas matrizes. Mas é certo que o sistema se diversificou, sim.

O setor de infraestrutura oferece uma gama de oportunidades, mas também de desafios para a Índia. Em que medida a demora na entrega de projetos de infraestrutura básica machuca a performance das companhias?
Sem dúvida, a qualidade e o ritmo da execução de obras precisam melhorar. Estima-se que US$ 1 trilhão de investimentos seja necessário para suportar a demanda por infraestrutura na Índia nos próximos cinco anos. As parcerias público-privadas que ajudariam nisso e seriam um prato cheio para investidores não têm funcionado como deveriam. Alguns estados indianos estão promovendo “apagões” porque não há geração de energia elétrica para abastecer a população e a indústria. O governo tinha anunciado um plano de construir 20 quilômetros de estrada por dia, mas está longe de cumprir a meta. Tudo isso, claro, afeta os riscos e os custos de uma empresa. Na área de telecomunicações, além dos casos de corrupção, há um longo debate sobre a melhor política para a concessão de espectros. O governo garante que vai resolver essas questões, mas a velocidade das soluções preocupa.

A Tata Capital é subsidiária de um dos maiores grupos empresariais da Índia. Quais vantagens a gestora extrai desse ecossistema para a gestão dos investimentos?
O maior benefício de fazer parte de uma companhia que possui 28 empresas listadas e 70 fechadas, com receitas combinadas de mais de US$ 80 bilhões, é estar presente em quase todos os setores econômicos da Índia. Toda essa rede permite saber o que está acontecendo em qualquer mercado, o que traz informações valiosas para nossas investidas e sobre o tipo de empresas que procuramos. Frequentemente, as empresas do portfólio podem se envolver em joint ventures com outras companhias do grupo ou se tornarem suas clientes ou fornecedoras. O principal ganho, porém, é a inteligência de mercado que podemos compartilhar.

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