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Desequilíbrio na Instrução 481?
Assimetria de informação pode favorecer administradores na disputa por pedidos públicos

, Desequilíbrio na Instrução 481?, Capital AbertoNão há dúvidas de que a Instrução 481, editada recentemente pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), traz transformações positivas para o mercado de capitais brasileiro. Disciplina as informações que devem acompanhar os anúncios de convocação de assembleia, bem como os documentos relativos às matérias a serem deliberadas e os pedidos públicos de procuração de voto. Contudo, algumas questões originadas nas discussões sobre a implementação da norma merecem reflexão. Como resolver, por exemplo, a assimetria informacional em uma disputa por procurações (“proxy fight”) existente entre os administradores da companhia — que inevitavelmente têm maior acesso a informações — e os demais acionistas?

Segundo a Instrução 481, são considerados pedidos públicos de procuração aqueles que empregam meios públicos de comunicação e são dirigidos a mais de cinco acionistas. Isso quando promovidos, direta ou indiretamente, pela administração ou por acionista controlador. Quando realizados por outra pessoa e dirigidos a mais de dez acionistas, tais pedidos também são considerados públicos. A Lei das S.As. não indica, expressamente, quem tem legitimidade para formular um pedido de procuração. Porém, a Instrução 481 dispõe que tanto a administração da companhia quanto seus acionistas podem disputar a outorga de mandatos.

Para que se viabilizem os pedidos de procuração desvinculados da administração, a lei societária possibilita ao acionista que represente, no mínimo, 0,5% do capital social solicitar a relação de endereços dos acionistas. A Instrução 481 determina que a companhia forneça essa lista classificada em ordem decrescente, conforme o respectivo número de ações de que o acionista seja titular, sem indicar, entretanto, sua efetiva participação acionária. Tal fato pode favorecer os integrantes da administração (ou os controladores), na medida em que eles detêm essas informações em detrimento dos acionistas minoritários ou não controladores. Essa assimetria pode ser determinante para o sucesso de uma disputa por grupos antagônicos.

Há outros aspectos de assimetria informacional que devem ser considerados e merecem uma orientação futura da CVM. São eles: 1) o momento em que as procurações outorgadas devem se tornar públicas e, com elas, o teor do mandato conferido pelo acionista; 2) se os destinatários dos pedidos de procuração receberão informações — recomendações — de todos os grupos de interesse e não apenas as da administração sobre a proposta, como, por exemplo, quando a matéria tratar de interesse de parte relacionada; e 3) se, durante o período do pedido público de procuração, os acionistas poderão ser livremente contatados pelos diversos grupos de interesses e se, nesse caso, o material eventualmente entregue a essas pessoas deve ser divulgado.

Também merece reflexão a compatibilidade do pedido público de procuração com o regime de voto múltiplo, previsto no artigo 141 da Lei das S.As.. Para que seja utilizado na eleição de membros do conselho, é preciso que acionistas representando, pelo menos, 10% do capital votante, requeiram, com 48 horas de antecedência, a adoção desse procedimento. Cabem aí algumas perguntas: 1) como acomodar o prazo legal, de modo que a documentação exigida na indicação de conselheiros seja colocada à disposição dos demais acionistas, como pede o artigo 10 da Instrução?; 2) seria possível a acionistas cujas ações representem menos de 10% do capital social votante fazer um pedido público de procuração com duas finalidades: alcançar o percentual de 10% do capital votante (para requisição de adoção do procedimento de voto múltiplo antes da assembleia) e indicar um ou mais candidatos para o conselho?; 3) obtida uma procuração para votar em um conselheiro de administração pelo regime de chapa, como deve se comportar o procurador diante da adoção do voto múltiplo?; 4) seria o caso de a CVM, diante de uma situação nova e a pedido do acionista, suspender a deliberação desse item, de modo que novo pedido de procuração já considere o voto múltiplo?; 5) nesse caso, como lidar com o fato de que os acionistas decidem pela distribuição de seus votos entre os candidatos após a mesa diretora dos trabalhos assembleares informar a quantidade de votos mínimos para eleger um membro do conselho?; 6) poderia o representante em assembleia alterar a direção e o sentido do voto, ou transigir num contexto de composição de forças?

Easterbrook e Fischer, em seu clássico livro The Economic Structure of Corporate Law, citam quatro aspectos sobre pedidos de procuração para o exercício do direito de voto que podem servir de guia para o exame da nova instrução: 1) disposições gerais sobre transparência de forma a manter os acionistas informados mesmo que não haja disputa; 2) regras gerais antifraude proibindo o uso de informações falsas ou que possam induzir alguém a erro; 3) normas regulando o fornecimento de informações por parte de grupos rivais no caso de uma disputa por mandatos, de modo que os acionistas fiquem adequadamente informados e aptos a votar inteligentemente; e 4) previsão permitindo que acionistas, salvo determinadas exceções, se comuniquem com outros por meio da inclusão de proposta no material distribuído. A regra básica, portanto, é a da total transparência.

Nos Estados Unidos, as regras para solicitação de procurações são desenhadas para que o mecanismo funcione o mais próximo possível de uma participação presencial do acionista em assembleia. Nesse sentido, os pedidos devem ser precedidos de registro na Securities and Exchange Commission (SEC), e o material a ser distribuído aos acionistas assemelha-se aos prospectos de emissão, contendo um conjunto mínimo de dados, suficientes para que tomem uma decisão informada.

Sem dúvida, diante da diversidade de cenários que a vida societária oferece no âmbito das assembleias, não serão poucos os desafios que os procuradores dos acionistas terão que enfrentar no Brasil. Experiência e prudência, além do conhecimento das questões colocadas em discussão, serão os requisitos mínimos a serem observados.


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