Imprudências do Iasb?
Mudanças na estrutura conceitual das normas podem desnortear o trabalho dos contadores
, Imprudências do Iasb?, Capital Aberto

Eliseu Martins*/ Ilustração: Julia Padula

No ano passado, o International Accounting Standards Board (Iasb), responsável pela definição das normas internacionais de contabilidade (IFRS), introduziu modificações na sua estrutura conceitual das quais duas merecem destaque. Uma delas é a retirada do conceito da primazia da essência sobre a forma dessa estrutura — o que, à primeira vista, assustou muita gente. Esse conceito, afinal, sempre foi o pilar da contabilidade saxônica, berço da filosofia do Iasb.

O Iasb agora determina que apenas dois conceitos sejam considerados fundamentais na elaboração das demonstrações financeiras: relevância e representação fidedigna (relevance and faithful representation). Os demais, como comparabilidade, verificabilidade, tempestividade e compreensibilidade, passam a ser contribuições ao aprimoramento da informação contábil. As bases para definição da nova estrutura explicam que não há como atender ao conceito fundamental da representação fidedigna sem atender à prevalência da essência sobre a forma. Assim, diz o próprio Iasb, falar nessa prevalência é total redundância. Como resultado, então, a filosofia da prevalência da substância segue ainda mais fortalecida, contrariamente ao que uma leitura desavisada poderia concluir.

A segunda mudança foi a exclusão da menção ao conceito da prudência, mais conhecido entre os profissionais como conservadorismo. Novamente, as bases para conclusões dessas mudanças explicam: a prudência é incompatível com a representação fidedigna, porque pressupõe neutralidade, e a avaliação conservadora não é neutra. Isso significa que o Iasb não mais dá guarida a um conceito que tem caracterizado fortemente a profissão do contador, principalmente quando na função de auditor.

Nesse ponto, sim, temos uma guinada que pode trazer consequências práticas. Os julgamentos realizados pelos contadores ficam sem essa âncora, que justificava a adoção dos menores valores para os ativos e dos maiores para os passivos. Essa característica, julgada pelos profissionais como uma certa contraposição ao natural otimismo dos administradores, não servirá mais para suportar as posições dos gestores, dos contadores e dos auditores.

A teoria da contabilidade trata de um conjunto de conceitos que os teóricos — e também os práticos — desenvolvem com o objetivo de formar um arcabouço que justifique e explique todas as possíveis alternativas de elaboração de demonstrações contábeis, independentemente de serem ou não efetivamente utilizadas. Já os documentos denominados de estrutura conceitual da contabilidade são a parte dessa teoria que os normatizadores escolhem como base para guiar as suas regras. Assim, cada órgão regulador, como o Fasb, dos Estados Unidos, e o Iasb, tem sua estrutura conceitual — e elas podem divergir entre si. Por exemplo, a dos norte–americanos impede a adoção da reavaliação de ativos imobilizados, enquanto o Iasb a admite.

A eliminação formal da prevalência da essência tem, como vimos, total justificativa teórica. Mas seria mesmo necessária? Mesmo que redundante, seria bom se estivesse lá para ser sempre lembrada e relembrada. Quanto à eliminação da prudência, o Iasb pode ter exagerado. Será que já era o tempo dessa retirada? Estamos todos, principalmente os iniciantes na filosofia saxônica, preparados para isso? Terá sido o próprio Iasb imprudente?


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