Risco ambiental e a precificação de ações
Quais riscos ambientais entram no valuation de empresas como Vale e Samarco?

, Risco ambiental e a precificação de ações, Capital Aberto

Alexandre Póvoa*/ Ilustração: Julia Padula

No dia 5 de novembro, ocorreu o rompimento de uma barragem de detritos de minério pertencente à mineradora Samarco. Parecia mais uma notícia corporativa, mas, com o passar do tempo, uma das maiores tragédias ambientais da história do Brasil foi se configurando, com perda de vidas humanas, destruição de vilarejos, prejuízos econômicos incalculáveis em alguns municípios, “morte” de um rio e lama chegando a mais de 600 quilômetros de distância, no mar do Espírito Santo. Hoje, muitos críticos questionam uma suposta falha dos analistas do mercado por não colocarem em seus modelos de precificação de ativos os riscos ambientais em que cada empresa está incorrendo.

Discordo dessa crítica. Risco é uma palavra normalmente associada a um episódio negativo, por se tratar de um fator não esperado. Estatisticamente, risco é simplesmente o desvio-padrão de um valor esperado (média), para cima ou para baixo. Alguns modelos de valuation trabalham com cenários aleatórios (Simulação de Monte Carlo). Outros, cada vez mais usados (como o modelo de opções reais), assumem que qualquer estimativa apresenta uma volatilidade associada. Mas, por incrível que possa parecer para um leigo, uma ação deve “valer mais” (e não menos) por causa de surpresas potenciais. Da mesma forma como uma barragem pode provocar uma catástrofe ambiental no Rio Doce (risco negativo de multas pesadas para a empresa), um súbito aumento agressivo de demanda na China tem o potencial de levar a pelota a dobrar de preço (risco positivo de benefício ao fluxo de caixa da Samarco); da mesma maneira como a Volkswagen (de forma totalmente inesperada) burlou em seus testes a questão da emissão de poluentes, a empresa poderia ter inventado, como uma surpresa não mapeada, um mecanismo novo de motor que reduzisse drasticamente o custo da produção, catapultando os resultados.

Enfim, a valuation trabalha com valores esperados, dentro de cenários plausíveis. Fatores-surpresa completamente fora do controle — sejam relativos à empresa ou à macroeconomia — são levados em conta pelos bons analistas. Porém, como a probabilidade de algo totalmente aleatório e não mapeado acontecer, por definição, é baixa, o impacto hoje no cálculo do valor justo de uma ação acaba se tornando modesto. Erro de valuation seria forçar a barra e atribuir como alta a probabilidade de estouro de uma barragem.

Objetivamente, no caso de empresas que trabalham com riscos ambientais, existem dois fatores a serem considerados no processo de precificação. O primeiro é, ex ante, quanto uma empresa pode sofrer de multas e qualquer tipo de sanção financeira em decorrência do acidente. O rigor brasileiro tem se mostrado incomparavelmente menor do que o observado em outros países — vide o caso da British Petroleum, que pagou cerca de US$ 20 bilhões em multas e indenizações no caso do acidente no Golfo do México em 2010. O segundo fator, mais subjetivo, consiste no abalo de reputação da empresa: os investidores passam somente a aceitar a comprar um papel daquela empresa com desconto (retorno exigido maior).

Desde o dia 5 de novembro, as ações da Vale e da BHP, que dividem o controle da Samarco, caíram ao redor de 30% em dólar, enquanto papéis de concorrentes diretas, como Rio Tinto e Anglo American, perderam 15% e 50%, respectivamente. Cabe ressaltar que foi um período difícil para o setor por causa da continuidade da queda das cotações do minério de ferro em 20%, além do anúncio de guidances decepcionantes (no caso da Anglo American). Não fica clara, portanto, uma grande penalização por parte do mercado em relação aos acidentes ocorridos.

Cabe lembrar que, em janeiro de 2000, a Petrobras provocou um gigantesco dano ecológico, um dos maiores da história brasileira, ao derramar 1,3 milhão de litros de petróleo na Baía de Guanabara. Os investidores chegaram a vender as ações com receio das pesadas multas, que nunca vieram. Portanto, a triste conclusão, infelizmente, é de que quedas fortes de preços de papéis após esse tipo de acidente no Brasil podem até criar oportunidades de compra, dado que as punições nunca se confirmam — pelo menos na magnitude observada no exterior. Cabe lembrar, no entanto, que a legislação ambiental evoluiu bastante nos últimos 15 anos. O caso Samarco será um bom teste nesse sentido.


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