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Onda de incentivos
Especialistas analisam medidas em curso para alavancar o mercado de acesso

, Onda de incentivos, Capital Aberto, Onda de incentivos, Capital AbertoO mercado de capitais brasileiro não é receptivo às pequenas e médias empresas (PMEs). Entre as principais bolsas do mundo, a BM&FBovespa tem um dos mais elevados valores médios de ofertas públicas de ações: US$ 693 milhões, atrás apenas da bolsa suíça, com US$ 1,3 bilhão. Nosso número é mais de sete vezes maior do que os US$ 99,3 milhões captados na National Stock Exchange of India (NSE) e esmagadoramente superior aos US$ 11 milhões que as empresas levantam na polonesa Warsaw Stock Exchange, que possui um dos mercados de acesso mais bem-sucedidos do mundo. Desde que a abertura de capital se tornou uma opção viável para as companhias brasileiras, em 2004, apenas quatro tiveram a coragem de fazer uma listagem levantando menos de R$ 100 milhões. A última delas foi a desenvolvedora de softwares Senior Solution, que captou R$ 57 milhões em março de 2013. Os principais agentes do mercado brasileiro — bancos de investimento, escritórios de advocacia, reguladores e bolsa de valores — querem que ofertas como essa deixem de ser exceção. Desde 2012, quando se uniram para criar o Comitê Técnico de Ofertas Menores (COM), eles vêm estudando soluções e buscando apoio político para mudar a situação. O amplo conjunto de medidas, descrito no quadro da página 31, foi discutido no Círculo de Debates promovido em 16 de abril na redação da CAPITAL ABERTO, com o tema: “Incentivos à listagem de empresas médias: estamos no rumo certo?” Confira os melhores trechos a seguir.

CAPITAL ABERTO: Luciana, qual é a visão da CVM sobre o acesso das PMEs à bolsa?

Luciana Dias: Analisamos mercados internacionais e o brasileiro e percebemos que o ponto mais sensível é a demanda. Nesses outros mercados, ela era local, e não de investidores estrangeiros. Temos que criar uma demanda local que não existe hoje, por várias razões. Primeiro porque a cultura é diferente. Mesmo os veículos que investem em ações no Brasil não estão preparados. Às vezes, eles têm um mandato que os impede de comprar uma ação menos líquida, porque os volumes que eles se autoimpõem dificultam a participação nesse tipo de oferta. O resultado dessa análise foi a alteração das Instruções 391 e 409, para estimular a compra desses ativos. A grande diferença, entretanto, virá se houver um incentivo tributário. É que, de um lado, a alteração da 409 traz flexibilidades, mas, de outro, obriga o investimento no mercado de acesso. Não acho que seja um produto tão popular sem estímulo fiscal.

Bernardo Gomes: Ao apresentar nossa oferta, sentimos que muitos veículos gostaram do segmento, da empresa, do plano, das perspectivas… mas, na hora de fazer o investimento, tinham restrições e não podiam participar. Então, de todas as medidas que estamos avaliando aqui, talvez a mais importante seja abrir a possibilidade para que novos veículos façam investimentos nesse tipo de oferta.

Luciana Dias: Outro impedimento que notamos foi a falta de uma oferta mais célere, mais barata e simples do que a feita por meio da Instrução 400. Esperançosamente, no segundo semestre, teremos uma Instrução 476 de ações, na qual a oferta pública com esforços restritos, tão bem-sucedida no mercado de dívida, será estendida para ações. Não será tão simples quanto a 476 de dívida [por causa de questões como o direito de preferência], mas é mais simples do que a 400. Por isso, creio que teremos mais 476 do que 400 para ações. Às vezes, não fará sentido propor uma oferta pela 400 para uma operação de até R$ 100 milhões se a 476 vai poder acomodá-la.

CAPITAL ABERTO: Também se discute politicamente o incentivo fiscal para empresas listadas, e não apenas para os investidores. O que o COM pensa disso?

Cristiana Pereira: Em nenhum dos países que pesquisamos encontramos incentivos fiscais para empresas. A Espanha é o único que tem algo do tipo, mas mesmo lá é diferente. Trata-se de uma linha de financiamento, estadual, para arcar com custos. Diagnosticamos que o ponto central é a demanda; o custo para abrir o capital não é um obstáculo. É preciso entender que isenção implica custo para o governo — ele abre mão de uma receita, por mais que estejamos falando de um mercado ainda não existente.

Luciana Dias: No ano passado, 40% das empresas que pediram registro de oferta na CVM desistiram. Esses emissores tiveram todo o trabalho, contrataram advogado e banco, mas na hora da precificação das ações chegaram a um valor que não fazia sentido para eles e desistiram. O número demonstra que existe vontade das companhias de acessar o mercado. O que falta é mais demanda. Além disso, já tivemos incentivo para companhias abrirem o capital na história do Brasil e isso gerou inúmeras distorções.

CAPITAL ABERTO: Quais são as estratégias para atrair investidores?

Bernardo Gomes: Tivemos mais de 40 corretoras trabalhando na distribuição, o que nos permitiu trazer um número significativo de pessoas físicas interessadas. Isso mostra que existem investidores dispostos a encarar oportunidades diferentes, ainda que com menor liquidez. É tudo uma questão de trabalhar um pouco mais para aproveitar o potencial existente no mercado.

Fernando Machado: O Bovespa Mais não é para qualquer tipo de empresa. Os investidores estão olhando para aquelas com potencial de crescimento grande, pois vão querer sair desse investimento em algum ponto. Por isso, a empresa tem que dar retorno. Companhias de tecnologia ou de serviços, que devem crescer muito acima do PIB, são potenciais candidatas ao Bovespa Mais.

CAPITAL ABERTO: Hoje, a maioria dos IPOs se concentra em poucos escritórios de advocacia e bancos de investimento. Eles se interessariam por um mercado menos líquido?

Antonio Felix de Araujo Cintra: Lá fora existe um mundo à parte de Wall Street, que cuida de ofertas menores. Há alguns bancos de investimento de que nunca ouvimos falar aqui e que estão lá fazendo ofertas. Isso ainda vai acontecer no Brasil. Acho que haverá um mercado focado nisso, mas todo mundo vai se preparar. Talvez os bancos grandes criem um segmento especial para PMEs.

Fernando Machado: Concordo em que vai haver uma segmentação. Ninguém vai criar estruturas agora para focar só em ofertas menores, já que ainda estamos discutindo como aumentar a demanda. O Banco Votorantim tomou uma decisão estratégica de fomentar o mercado de PMEs. Estamos conversando com vários emissores e outros players para mostrar como ele funciona, mas não há condições de focar apenas essas ofertas. Precisamos competir com os grandes bancos nas grandes operações.

CAPITAL ABERTO: Em países com mercados de acesso mais desenvolvidos, como a Polônia, existe um grande número de pessoas físicas negociando na bolsa. Esse tipo de investidor é um desafio para o mercado de PMEs no Brasil?

Daniel Utsch: Esse mercado tem de ser pautado no institucional, sem dúvida.

Fernando Machado: Não é no contexto de ofertas menores que vai se mudar a estrutura do mercado brasileiro de ações, pautado em investidores institucionais. No fim das contas, vivemos num mercado em que o rendimento da caderneta de poupança e o da renda fixa são altos em relação ao risco. É muito difícil convencer qualquer pessoa física a colocar seu patrimônio na bolsa hoje. Daqui a cinco ou dez anos, podemos discutir como trazer mais pessoas físicas. Agora, temos que focar no investidor institucional local para conseguir fazer as ofertas menores funcionarem.

CAPITAL ABERTO: E, depois que essas empresas estiverem listadas, como garantir visibilidade e liquidez?

Daniel Utsch: A questão mais difícil de ser resolvida é a liquidez. Alguns pontos ainda precisam ser trabalhados, como o formador de mercado, que é pouco desenvolvido no Brasil. Não diria que os serviços são ruins, mas são aquém da expectativa. Muitas empresas contratam formador de mercado e a liquidez aumenta no momento inicial, mas acaba se precificando a existência dele, e depois ela cai para o nível anterior ou até abaixo. A criação de índices alternativos, abaixo do índice small caps, também pode ser interessante. Muitos investidores só aplicam em papéis que estejam em algum índice de liquidez. Na mesma linha, estaria o fomento do mercado de ETFs. O investidor pode não ter mandato para investir numa ação que negocia R$ 100 mil por mês, mas pode ter para investir num fundo de índice, e o gestor desse fundo vai ter que comprar e vender essas ações, suscitando um aumento de liquidez.

Cristiana Pereira: Se olharmos o mundo todo, as empresas de baixa capitalização têm liquidez reduzida. Mesmo o AIM [Alternative Investment Market, mercado de acesso da Bolsa de Londres] tem a liquidez muito concentrada em algumas grandes empresas. Avaliamos que os formadores de mercado são mais efetivos quando a empresa já tem certa liquidez e um valor razoável em free-float.

Luciana Dias: A grande importância do diagnóstico feito pelo Comitê [COM] foi justamente nos permitir redimensionar algumas expectativas. Percebemos, por exemplo, que em nenhum país o mercado de acesso tem tanta liquidez assim. Esperamos criar um mercado hiperlíquido de empresas? Não. Esperamos que haja um mercado primário bastante ativo. O secundário vai ser sempre menos ativo do que o de empresas grandes.

CAPITAL ABERTO: Bernardo, como a Senior Solution lida com a questão da visibilidade depois da abertura de capital?

Bernardo Gomes: Temos duas coberturas de analistas patrocinadas pela Bovespa e também recebemos cobertura do Banco Votorantim e da XP, entre outras. Tem sido interessante, porque permite que o mercado conheça um pouco mais o nosso setor, que até então tinha poucas empresas.

Antonio Felix de Araujo Cintra: O que precisamos mesmo é de empresas com coragem de ir a mercado. É isso o que vai fazer diferença. Na hora em que tivermos várias listadas no mercado de acesso, as pessoas vão começar a olhar mais para o segmento. Nós vimos a dificuldade que foi para o Novo Mercado decolar. É a mesma história.

Daniel Utsch: O sucesso pós-oferta também é muito importante. Assim, começamos a criar um histórico. Os investidores e outros empresários vão poder olhar para a Senior Solution e falar: “Eles captaram R$ 57 milhões e estão executando o plano de negócios que prometeram”. Assim como os casos de insucesso do Grupo EBX deterioram o mercado de empresas pré-operacionais, os casos de sucesso do Bovespa Mais vão, aos poucos, fomentar o desenvolvimento desse segmento.

Antonio Felix de Araujo Cintra: O momento agora não está favorável às ofertas públicas, mas o private equity está muito agitado. É a hora de os bancos conversarem com os gestores que investem nesse setor e mostrarem as oportunidades. Temos que dar dois passos atrás, conversar com quem está olhando onde colocar os recursos e dizer: “Vá, pois o mercado está surgindo e já temos casos de sucesso”. Temos conversado muito com o pessoal de private equity e percebemos que as ofertas menores estão entrando no horizonte deles.

Cristiana Pereira: Outra questão na qual temos insistido muito com as empresas e com os gestores é a separação dos momentos da listagem e da oferta. É comum que nos perguntem por que ter esse custo sem captar nada. Respondemos que a empresa já tem um benefício ao se listar, tanto de visibilidade quanto de redução de custo de capital, porque muda a percepção do banco que empresta para aquela companhia. Mas, além disso, para uma empresa menor, o esforço de fazer tudo ao mesmo tempo é grande.

Bernardo Gomes: Fazer a listagem antes da oferta é bom porque a empresa se torna conhecida dos investidores ou potenciais investidores. Ela se habitua com o processo de companhia aberta, tem um tempo para o aprendizado e, principalmente, tem um timing melhor para aproveitar a janela da oferta. O mercado é dinâmico, muda a toda hora. A partir do momento em que a empresa está listada, o tempo para conseguir fazer a oferta é menor. Então, para quem nos consulta, recomendo fazer a listagem e a oferta posteriormente.

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