Engenheiro e economista, Leonardo Pereira assumiu a presidência da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) em novembro passado. Sua nomeação chamou a atenção por colocar no comando da autarquia não um especialista em regras, mas um executivo de companhia aberta. Antes de liderar a CVM, Pereira era vice-presidente e diretor de relações com investidores da empresa aérea Gol. Sua entrada trouxe novidades: pela primeira vez, a autarquia vai lançar um plano estratégico com horizonte de dez anos, nos moldes do que é feito pela iniciativa privada. “Saber aonde você quer chegar e como vai fazer isso é governança”, avalia.

Desafio do regulador
“Tomar decisões equilibradas ou as que mais se aproximam disso. Sempre haverá críticas, pois no equilíbrio você nunca pende para nenhum dos lados. Comparo o nosso trabalho ao do pêndulo de um relógio, que inevitavelmente passa pelo centro. No caso do regulador, essa amplitude tem que ser pequena, para passarmos mais vezes pelo centro.”

Derivativos
“O mercado de derivativos seguirá crescendo. É um instrumento criado para gerenciar riscos e permitir o hedge que acabou dando origem a diferentes tipos de produto. Na essência, o derivativo é bom. A questão é que ninguém percebeu o crescimento desse mercado, que acabou sem regulação. No Brasil, temos um ambiente estruturado para derivativos. Somos, inclusive, uma referência para outros países. Mas, em termos globais, com as fronteiras cada vez mais abertas, o risco de um problema se propagar é grande.”

Referências
“Precisamos destacar os bons exemplos de conduta. É importante chamar a atenção para quem está tentando acertar. Como se faz isso? As histórias de boa conduta precisam se transformar em estudos de caso. Isso encorajará aqueles que têm boas intenções e constrangerá quem está em outro caminho. O arcabouço legal precisa ser forte, e as regras, claras, mas nada substitui os bons exemplos.”

Redes sociais
“Veja a velocidade com que a informação se propaga hoje. É possível controlar isso? Já pensou que, ao editar uma norma sobre a divulgação de informações por meio de redes sociais, ela pode estar caduca em três anos ou menos? Há cerca de quatro anos o Brasil era o maior usuário mundial do Orkut, e isso acabou. Não podemos ignorar que o canal existe, mas daqui a pouco tudo pode ser diferente. Por isso, pessoalmente acredito que é preciso avançar pela questão da conduta — do que pode e do que não pode ser feito.”

Acesso ao mercado
“Os acionistas controladores estão entendendo cada vez mais como o mercado funciona. Há uma evolução: eles compreendem que, para ter acesso ao mercado, é preciso se estruturar internamente. Os fundos de private equity têm um papel importante na questão cultural. A empresa que hoje fatura R$ 500 milhões ao ano e quer chegar a R$ 1 bilhão deve ter em mente que, talvez, necessite de uma estrutura da qual ainda não dispõe. O auditor é caro? Mas e os benefícios que ele gera? O que oferece um conselho de administração? São coisas imprescindíveis para quem deseja crescer e ser perene.”

Papel da CVM
“É importante que as pessoas entendam: tem coisas que elas gostariam que fosse mandato da CVM, ou gostariam que a autarquia fizesse, mas não pertencem à nossa alçada. Nós somos zeladores do mercado e temos um papel a desempenhar. É como se, num edifício, o morador chamasse o zelador para consertar o cano que se rompe. Essa não é a função dele.”