É lugar comum falar da transformação que a tecnologia provocou em vários setores da economia a partir da década de 1990. No entanto, costumamos nos referir à mudança na maneira de servir aos clientes e negociar, e não à evolução da estrutura das empresas. Nesse sentido, as bolsas de valores e de futuros oferecem um exemplo singular de instituição modificada pela tecnologia, desde o espaço de negociação (do pregão em viva voz ao eletrônico) até a sua estrutura societária (de associação a companhia de capital aberto). Protagonista desse processo Leo Melamed apresenta, em Gritando ainda mais alto, as delicadas conversações que conduziram a Chicago Mercantile Exchange (CME) ao papel de precursora e consolidadora nessa indústria.
Melamed dedicou a vida ao desenvolvimento dos mercados futuros. Sua trajetória confunde-se com a própria história da Bolsa de Chicago. Com o diploma de advogado na mão, enamorou-se pelos mercados futuros e iniciou carreira na CME quando era uma pequena bolsa que transacionava futuros de ovos e manteiga, na década de 1960. Criou e implementou o primeiro mercado futuro de moedas pós-Bretton Woods e sobreviveu ao crash de 1987. Entretanto, o grande desafio ainda estava por vir. A sua força de vontade seria posta à prova ao desafiar o que Milton Friedman chamava de “tirania do status quo”.
O vertiginoso progresso tecnológico da década retrasada permitiu a criação de plataformas eletrônicas de compra e venda que ameaçavam subtrair a liquidez das bolsas tradicionais, devido aos custos de transação mais baixos e à janela de negociação mais ampla. Gigantes como Reuters e Bloomberg avançavam rapidamente nessa seara, enquanto os donos das bolsas — as corretoras — viviam o drama de investir em um padrão que poderia “matar” o pregão em viva voz. No meio desse ambiente tumultuado, Melamed conduziu os acordos entre os milhares de associados da Bolsa de Chicago para aprovar a elaboração da plataforma eletrônica. Mas não parou aí. Percebendo que a estrutura organizacional associativa era incompatível com o ambiente de elevada competição entre as bolsas mundiais por liquidez, ele também capitaneou a primeira experiência de desmutualização de bolsas. Assim, abriu caminho para a CME fazer um IPO e tornar-se companhia aberta.
Quem transita em grandes organizações, públicas ou privadas, sabe quão difícil é fazer uma instituição que define o status quo tornar-se o agente de uma mudança que o desafia. Melamed atuou com extrema maestria e empenho ao gerenciar a delicada interlocução com os associados e com os conselheiros de administração. A parte do livro que relata isso é de grande valia a quem passa por modificações agudas na empresa, seja como protagonista das transformações, seja apenas como testemunha. A seção final da obra, por outro lado, acaba sendo um tanto repetitiva e enfadonha, ao reproduzir ensaios e discursos do autor.
Atribui-se a Leo Melamed, entre outros, a paternidade do mercado de futuros moderno. O seu grande legado, o CME Group, consiste em uma das bolsas mais relevantes no mundo. Relembrando as palavras do filósofo inglês Charles Spencer, quem sobrevive não é o mais forte, mas aquele que melhor se adapta às metamorfoses do ambiente.
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