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Fim de jogo
Com as ações depreciadas e os resultados no vermelho, Brookfield deixa a bolsa de valores sob protesto de minoritários

, Fim de jogo, Capital AbertoQuando abriu o capital, em outubro de 2006, a Brookfield chamava-se Brascan Residential Properties (ela alteraria a marca em julho de 2009, para reforçar o vínculo com sua controladora indireta, a Brookfield Asset Management). Sua oferta pública inicial de ações (IPO), a maior da BM&FBovespa naquele ano, captou R$ 1,89 bilhão e fez dela a sétima companhia do setor imobiliário a vir a mercado. Cada ação foi negociada, na época, a R$ 12,63. A expectativa dos investidores era ver a incorporadora de médio padrão, atuante em São Paulo e Rio de Janeiro, surfar a onda de valorização imobiliária que se aproximava. Sete anos depois, o cenário se inverteu completamente: o papel da Brookfield atingiu irrisórios R$ 0,98, seu piso histórico, em 12 de dezembro de 2013. Diante do desmoronamento das ações, em 27 de janeiro a empresa anunciou que fecharia o capital.

A queda resulta de uma série de problemas. O último ocorreu no fim do ano passado, quando pipocaram na imprensa denúncias de que incorporadoras — a Brookfield incluída — haviam pagado propina a fiscais da prefeitura paulistana para aprovar projetos. A notícia devastou a credibilidade da companhia e pode prejudicar ainda mais seu resultado (veja gráfico abaixo): “Não se sabe ainda a multa a ser paga”, observa André Gordon, gestor da GTI Investimentos. A casa investe na empresa desde 2009, mas vem reduzindo sua posição, conforme é surpreendida negativamente por fatos como esse.

Uma das surpresas veio em abril. A Brookfield divulgou seus resultados de 2013 com atraso de mais de um mês em relação ao prazo estabelecido pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), devido a uma revisão das linhas de custos. Na apresentação do balanço, o diretor-presidente Nicholas Reade explicou que a administração havia identificado, ao finalizar o documento, ajustes a incorporar tanto aos orçamentos como às demonstrações financeiras de 2013. A retificação resultou em redução de R$ 170 milhões nas receitas, aumento de R$ 88 milhões nos custos e queda de R$ 38 milhões na linha de receitas com equivalência patrimonial. Do lucro líquido, foram subtraídos R$ 258 milhões.

O problema no balanço, segundo Gordon, não foi um ponto fora da curva. “Nos últimos nove trimestres ocorreram revisões”, observa. As deficiências, entretanto, não param por aí. Um indicador que evidencia problemas na gestão da companhia é o número de cancelamentos de contratos com clientes. O valor dos distratos soma R$ 600 milhões por ano, enquanto na concorrência esse número varia entre R$ 200 milhões e R$ 300 milhões. “A empresa vende para clientes que não têm capacidade de contratar um financiamento”, critica Gordon.

De 2006 a 2011, os resultados seguiam fortes; a incorporadora era uma das líderes em expansão no setor. Nos dois últimos anos desse período, a Brookfield levou o troféu de bronze no prêmio As Melhores Companhias para os Acionistas, realizado pela CAPITAL ABERTO. Na classificação, posicionou-se acima da mediana de seus pares (em valor de mercado) nos três principais quesitos da premiação: criação de valor para o acionista, retorno total da ação e governança corporativa. Em 2012, porém, os ventos começaram a mudar para a companhia.

A teleconferência repleta de problemas técnicos e quedas de sinal, em maio daquele ano, não foi nada alvissareira. A empresa anunciou que o ajuste fino nas despesas e investimentos, responsável por prejudicar o resultado do primeiro trimestre, iria se prolongar. De janeiro a março, havia reconsiderado os custos de seus projetos em R$ 30,7 milhões, devido a acréscimos de orçamento não previstos, e acabou por reduzir o lucro do período em R$ 21,4 milhões. “Mudamos os procedimentos. A checagem mensal do que foi incorrido e do que havia a incorrer era feita pelo gerente da obra e aprovada pelo seu chefe, sem passar de novo pela área de orçamentos. Hoje, tem que passar”, afirmou Nicholas Reade.

Em 2012, a companhia registrou seu primeiro prejuízo, com perda de R$ 388 milhões, como consequência das revisões orçamentárias. Ao divulgar o resultado, os principais executivos se esforçaram para passar a imagem de que a empresa estaria no caminho correto. Pretendia-se que o reexame de processos fosse o primeiro passo de uma virada operacional. O discurso acabou ficando no papel.

A história da Brookfield se inverteu naquele ano, mas algumas escolhas erradas foram feitas tempos antes. Em abril de 2008, quando a supervalorização imobiliária se iniciava e a crise financeira mundial ainda passava longe da economia brasileira, a Brookfield adquiriu a MB Engenharia, incorporadora e construtora do Centro-Oeste focada no segmento de renda média. A compra tinha por objetivo ampliar o leque de atuação da companhia, mas trouxe efeitos colaterais indesejáveis: alta nos gastos com abertura de pontos comerciais na região, atraso nas obras e reavaliação de custos em alguns empreendimentos. “A mão de obra e os serviços são menos qualificados no Centro-Oeste. Isso acabou pesando”, afirma um acionista minoritário que preferiu não se identificar. Em conferências com o mercado, a própria Brookfield reconheceu o problema.

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Sem cartas na manga
Perante o leite derramado, o investidor tem agora a opção de deixar a empresa. O problema é o preço oferecido na oferta pública de aquisição de ações (OPA): R$ 1,60 por papel. O valor é 88% inferior à cotação no IPO, porém maior do que a Brookfield teria que pagar de acordo com o laudo de avaliação do Santander. No documento, a instituição estima que o preço de compra deveria ficar entre R$ 1,29 e R$ 1,42 por ação. Em relação a 13 de fevereiro, data imediatamente anterior ao anúncio do valor a ser pago na OPA, o R$ 1,60 traz um prêmio de 29,03%.

Cabe lembrar que o fechamento de capital não foi a única opção cogitada pelo controlador da sociedade. No mesmo mês em que anunciou essa intenção, a Brookfield publicou fato relevante com uma alternativa para seu futuro: fazer um aumento de capital de R$ 500 milhões. “A Brookfield divulgou medidas opostas. Ou o minoritário colocava mais recursos no negócio ou receberia dinheiro, entregando suas ações. No fim, a companhia acabou fazendo o que era melhor para o controlador, e os minoritários vão pagar a conta”, destaca Gordon.

A GTI Investimentos pretende enviar uma reclamação para a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), alegando que a oferta de aquisição de ações lesa os acionistas minoritários e beneficia os majoritários. A alegação principal é que o controlador está recomprando papéis com preço bem abaixo do que os venderam em ofertas anteriores. Em 2006, em vendas primária e secundária, a empresa lançou ações a R$ 12,60. Três anos depois, alguns investidores chegarem a se desfazer delas por R$ 6,80. Em setembro de 2012, a companhia fez um aumento de capital, de R$ 400 milhões, precificando a ação a R$ 3,06. “Agora, querem comprar a R$ 1,60, para tirar a gente do jogo”, define um minoritário.

A GTI vem tentando articular a criação de um grupo de sócios minoritários para pleitear o cancelamento da oferta. Outros investidores não querem falar abertamente sobre o que farão, mas, nos bastidores, cogitam entrar com processos judiciais, alegando que a operação é danosa a seu patrimônio. Em sua visão, o preço ofertado pela ação não corresponde à realidade e a operação vai excluí-los de uma história de investimento que ainda poderia ser interessante. O estoque de terrenos apresentava um valor de vendas potencial de R$ 14,5 bilhões no fim de março — com a casa arrumada, afirmam, e o lançamento de bons projetos, haveria a possibilidade de voltar ao azul e recuperar as perdas com as ações.

O poder dos minoritários de evitar o fechamento de capital, no entanto, é pequeno. “A base acionária veio se deteriorando nos últimos dois anos. E, com o surgimento das denúncias de pagamento de propinas, o papel se tornou um prato cheio para especuladores”, diz Gordon. Se a ação desvalorizou-se 22,9% em 2012, sofrendo com atrasos na entrega de empreendimentos e revisões de custos, perdeu ainda mais força no ano passado, caindo 66,4%. Nesse cenário, o papel da incorporadora recebeu a tarja de especulativo. Com isso, passou a ser negociado por fundos de investimento e tesourarias de bancos, interessados em embolsar os valiosos percentuais de alta registrados em poucos dias, devido à baixa liquidez da ação em bolsa.

Os minoritários obtiveram uma vitória no início do ano, quando conseguiram nomear um representante para o conselho fiscal. Pelo andar da carruagem, entretanto, a participação do conselheiro não durará muito tempo. Os próximos episódios dessa história devem ser os últimos da Brookfield na condição de companhia aberta.

Ilustração: Marco Mancini/Grau180.com


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