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Depois do rebaixamento…
O dia seguinte dos caçadores de pechinchas na Bolsa de Valores

, Depois do rebaixamento…, Capital AbertoA cadela de estimação Vick saiu para um passeio especial no dia 6 de agosto. Era uma manhã de sábado, um dia — ou melhor, horas — depois que a Standard & Poor’s (S&P), a principal agência de avaliação de risco de crédito do mundo, garfou uma letra da poderosa, e máxima, nota dos papéis do Tesouro norte-americano, rebaixando-a de “triple A” para “AA mais”, algo que não acontecia desde 1917. Ciente de que o corte cirúrgico da vogal sacolejaria os mercados na segunda-feira seguinte, André Gordon, sócio da gestora de recursos GTI e dono de Vick, correu para o escritório no fim de semana e redigiu uma carta atenuante aos cotistas da GTI. Talvez por intuição, o gestor experiente, egresso do extinto Bozano, Simonsen e com passagem pelo Itaú BBA, tenha levado Vick para inspirá-lo na redação do texto de cinco páginas em que, além de tentar aplacar o pânico, indicaria as oportunidades de investimentos que possivelmente emergiriam da crise. A cadela é uma Lhasa Apso, raça canina típica do Tibete, onde reza a crença de que o animal é um amuleto de boa sorte.

A GTI, ao lado da Fama Investimentos, da Orbe, e da Capitânia, formou o quarteto de gestoras que aceitou contar à CAPITAL ABERTO como a notícia sobre o rebaixamento dos Estados Unidos movimentou as suas rotinas.

PERDA DIGERÍVEL — Na mesa do restaurante paulistano La Mar, no miolo do bairro Itaim Bibi, em São Paulo, o relato de André Gordon veio ao sabor de cebiches. Mas a acidez e o azedinho peculiares ao prato de origem peruana não traduziam, nem de longe, o humor desse gestor de 38 anos, dos quais 20 no mercado. Ao admitir que, sim, este ano está perdendo dinheiro, Gordon parecia calmo.

Até 26 de agosto, a Bolsa acumulava perda de 9,3% no mês, e o principal fundo da GTI, o GTI Value FIA, uma carteira de ações, prejuízo de 10,9%. Já num intervalo de dois anos, enquanto a Bolsa acumula perda de 7,5%, o fundo tem ganho de 18%. “É preciso entender que a GTI não investe simplesmente num papel, mas na aquisição de pedaços de empresas, o que inclui a administração dos negócios, os mercados de atuação e diferentes graus de exposição a risco”, diz Gordon. O gestor fareja empresas que tenham um modelo de negócios consistente e boas práticas de governança corporativa, além de ações, é claro, subavaliadas. “É aí que está a oportunidade.”

Na segunda-feira 8 de agosto, a bolsa brasileira caiu 8%, e a GTI pôs-se a comprar. “Reduzimos o caixa ao menor nível possível”, comenta o gestor. Uma das principais apostas foi dobrar a posição do fundo em papéis do Itaú. E também adquirir ações de Braskem, Usiminas e Gerdau, porque elas estavam aquém do seu valor e poderiam recuperar-se em pouco tempo. “Um gestor não deve comprar a ‘foto’ do mercado no dia. Tem de avaliar um prazo maior”, ensina Gordon. “Dificilmente saímos de um investimento antes de dois anos.”

O rebaixamento da nota pela S&P não representou nada que os agentes não soubessem: os EUA já não eram AAA fazia muito tempo.

INVESTINDO NA PAQUERA ANTIGA — Quem aposta em prazos mais longevos, superiores a cinco anos, igualmente revisitou seu portfólio de investimentos para ver se era hora de sair ou entrar em algum negócio novo. Poderia pintar a chance de se investir numa empresa que vinha sendo paquerada há um bom tempo, mas cujo preço estava fora do alcance da gestora. Uma turbulência provoca ondas de baixa no mercado, e o investidor passional corre para se desfazer das ações temendo uma depreciação ainda maior. Quem não tem pressa, porém, pode se beneficiar da volatilidade. “Tem de estar atento aos movimentos”, diz Rodrigo Sancovsky, sócio da Fama Investimentos, que administra um patrimônio de R$ 1,3 bilhão e é conhecida por manter suas participações nas empresas por anos e anos.

Sancovsky estava jantando num restaurante quando soube do rebaixamento dos títulos do Tesouro norte-americano. Não engasgou, mas, daquele minuto em diante, até a abertura dos mercados na segunda-feira, embarcou em uma movimentada troca de e-mails com seus sócios e demais gestores. A ideia era discutir quais companhias seriam alvos de compras. “Predefinimos alguma investida durante o fim de semana, por e-mail, e chegamos um pouco mais cedo na segunda para batermos o martelo”, lembra. Uma das opções foi ampliar de 14,7% para 16,4% sua fatia na Log-In, uma companhia do ramo de navegação de cabotagem da qual a Vale detém 31,3% do capital total. Em comunicado enviado à Comissão de Valores Mobiliários (CVM), o fundo informou que “as recentes aquisições de ações da empresa têm o exclusivo objetivo de investimento, não havendo interesse em alterar a composição do controle ou estrutura administrativa”.

A aposta, segundo Sancovsky, foi certeira, porque os papéis da empresa já foram muito desprezados e agora tendem a subir. Além disso, a Log-In tem uma dívida de longuíssimo prazo com o BNDES e boas chances de dar uma virada, independentemente da pressão sobre as bolsas neste momento. Os clientes da Fama, diz Sancovsky, já conhecem o tempera mento ruidoso e intempestivo do mercado e, por isso, preferem apostar no longo prazo. “Não há cliente desesperado ligando assustado.”

LUPA PARA PINÇAR O OURO — Filosofia semelhante é partilhada pela gestora de recursos Orbe, com dez anos de vida e um patrimônio de R$ 530 milhões sob administração. “Usualmente, não compramos ações que estão dentre as 20 mais líquidas da BM&FBovespa, por acreditarmos que dificilmente encontraremos nelas o tipo de oportunidade que desejamos”, justifica o sócio Fernando Camargo de Carvalho Luiz. “Por isso, não há pânico diante dos movimentos de massa, com efeito manada na Bolsa.”

Isso não quer dizer, no entanto, que os gestores não se preocupem com situações de desequilíbrios imprevistos. “Ao contrário, trabalhamos muito mais, até 10 ou 11 da noite.” A sobrecarga, de acordo com Carvalho Luiz, se dá justamente em função da necessidade de reavaliar os setores e buscar, com lupa, informações e oportunidades onde todos só vêem desgraça. “Setores cíclicos, como mineração, siderurgia e papel e celulose, não têm como estar com preços tão baixos”, analisa, sem revelar em quais empresas exatamente a gestora fez novos aportes.

DE BEM COM A VOLATILIDADE — Se os fundos de ações sentem uma fisgada com o chacoalhar das bolsas, há outros que são favorecidos por esse cenário, como os fundos que servem ao investidor com aversão a risco. A Capitânia, que administra um patrimônio na casa dos R$ 2 bilhões, perdeu nas suas carteiras de ações, mas foi bem em fundos multimercados de arbitragem, que oferecem retornos ponderados pelo risco superiores. “Apostamos na volatilidade implícita de ações de Petrobras e Vale, e o fundo Capitânia Hedge está até 200% acima do CDI no mês”, ressalta Rodrigo Sgavioli, sócio da gestora. Para os executivos da Capitânia, a crise é grave, mas não maior que a de 2008. “Um país não quebra.
O Lehman Brothers era ‘triple A’ quando ruiu”, recorda Eduardo M. Miziara, gestor e analista fundamentalista de ações da Capitânia.

Talvez por isso, quando começou a redigir a carta aos seus gestores, André Gordon, da GTI, tenha dito que o rebaixamento da nota pela S&P marcaria gerações futuras, mas não representou nada que os agentes, de maneira geral e intuitiva, não soubessem: “os EUA já não eram AAA fazia um bom tempo”.


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