Azar de alguns, sorte de outros
O mundo vai continuar em marcha lenta, e o Brasil poderá se beneficiar disso. A seu favor, o País tem a confiança de gestores de recursos estrangeiros

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A Europa está em frangalhos, os Estados Unidos se recuperam lentamente, e a Ásia já não anda tão bem. Com tantos mercados importantes seguindo devagar, o Brasil pode se considerar um sortudo. Profissionais de instituições estrangeiras ouvidos pela CAPITAL ABERTO revelaram que a tendência é manter os investimentos em bolsa no País ou até ampliá–los em 2012. Tudo vai depender dos resultados a serem exibidos pelo Brasil nos próximos meses. Se a economia interna sair dos trilhos e os maus resultados do terceiro trimestre — em que o produto interno bruto (PIB) não cresceu e o consumo das famílias deu sinal de desaceleração — se repetirem, é possível que os estrangeiros mudem de ideia. Mas, por enquanto, a perspectiva é positiva.

Espera–se que os países que compõem os Brics (grupo que inclui Brasil, Rússia, Índia, China e, mais recentemente, incorporou a África do Sul) sejam responsáveis por elevar a média de crescimento mundial neste ano. Uma pesquisa feita em setembro de 2011 pela universidade espanhola IE Business School, com 827 executivos de 61 países, apontou que 40% deles preveem para o Brasil a maior taxa de crescimento em 2012, enquanto 39% apostam na China, 17% na Índia, e 5% na Rússia.

Além de um mercado interno fortalecido, e de uma inflação que, apesar de alta, ainda tem apenas um dígito, o Brasil possui algumas vantagens em relação aos demais emergentes. A Rússia ainda patina no quesito governança. A Índia, de acordo com declarações recentes de Jim O’Neil, diretor da Goldman Sachs Asset Management e inventor do termo Bric, é, dentre os países da sigla, o que mais desapontou por sua inabilidade de atrair investimentos estrangeiros. Um relatório do Bank of America Merrill Lynch indicou a Índia como o único dos três países que os gestores de fundos têm evitado. A China, sempre atrativa com seu crescimento gigantesco, está dando sinais de saturação. O país vem sendo afetado pela crise de alguns dos maiores compradores de suas exportações. O Deutsche Bank calculou que o PIB chinês fecharia 2011 com alta de 9,1%. Para 2012, prevê crescimento de 8,3%.

ANO DE INTROSPECÇÃO — A visão dos gestores consultados pela reportagem é que os europeus seguirão empurrando seus problemas com a barriga ao longo dos próximos seis meses. Por essa razão, o ritmo lento da economia mundial fará com que as exportações em geral se tornem menos pujantes. Isso explica por que os estrangeiros têm olhado nossas principais blue chips, Petrobras e Vale, com algum desprezo. Essas empresas dependem da demanda externa para turbinar seus lucros. A queda no preço da ação das duas gigantes é a melhor expressão do mau humor com relação a elas. As preferenciais (PNs) da Petrobras valiam R$ 26,03 em 3 de janeiro de 2011. No fim do ano, em 22 de dezembro, eram negociadas a R$ 22,15, uma queda de 14,9%. No mesmo período, as PNs da Vale caíram 17%.

Nota–se que a Petrobras vem perdendo prestígio também devido à redução de sua participação na carteira teórica do Ibovespa, que varia conforme o volume de ações negociado. Nos últimos quatro meses de 2011, a petroleira representou 13,45% do índice. A indicação prévia da Bolsa é de que, até abril, ela representará 10,93%. A Vale, entretanto, vai ganhar mais peso: deve passar de 11,59% para 12,33%.

Apesar de as grandes exportadoras de commodities não estarem na lista de apostas para 2012, é provável que elas não demorem muito a voltar ao radar. Espera–se que a economia mundial engrene, lentamente, no fim de 2012, impulsionando esses papéis. “É preciso lembrar que a situação externa não muda os fundamentos e as vantagens competitivas de empresas como Vale e Petrobras”, diz Guilherme Paiva, chefe de estratégia de renda variável para América Latina do Morgan Stanley. O banco norte–americano trabalha com o Ibovespa em 65 mil pontos no fim de 2012. Segundo Paiva, o foco, no momento, são as ações defensivas, como energia e telecomunicação, e as empresas ligadas ao aumento da renda média da população, como educação, saúde e construção civil.

Não é à toa que esses setores chamam a atenção. Com a ascensão social, as pessoas podem pensar em fazer um curso superior, ter um plano de saúde ou comprar a casa própria. Por isso, para Raphael Lüscher, gestor de um fundo de investimentos em projetos sustentáveis da UBS Global Asset Management, as empresas expostas ao ambiente econômico interno são as mais adequadas. “À medida que a inflação for controlada e os salários aumentarem, essas companhias tendem a apresentar um resultado melhor”, explica.

APOSTA NA COMPETÊNCIA — Importante deixar claro, porém, que confiar nessas empresas é apostar na capacidade do País de superar os riscos de inflação e manter os fundamentos macroeconômicos estáveis. Basta lembrar que os índices setoriais da BM&FBovespa apresentaram queda ou estagnação ao longo de 2011. Até o dia 22 de dezembro, o indicador que mostra o resultado das ações do setor imobiliário caiu 28,42%, mais do que os 18,03% do Ibovespa. O Icon, que reflete as empresas de consumo, se manteve estável. Algumas estrelas passaram longe da desvalorização — como a AmBev, empresa com o maior peso no índice, cujas ações preferenciais subiram 33,6% entre o primeiro pregão de janeiro e 22 de dezembro; e a BRFoods, que no mesmo período valorizou 35,37%. Mas também houve micos na área do consumo, como a fabricante de medicamentos e produtos para cuidados pessoais Hypermarcas, que desabou 60,7%, e a produtora de carne bovina Marfrig, que caiu 43,38%.

Alex Duffy, gestor de portfólios de renda variável para América Latina da norte–americana Fidelity Investments, é da turma mais cética quanto à competência do Brasil para manter a casa arrumada. Ele diminuiu suas posições no País no último ano porque começou a ver uma deterioração dos fundamentos macroeconômicos brasileiros a partir de meados de 2010, agravada ao longo de 2011. A inflação, por exemplo, apesar dos esforços do governo para mantê–la sob controle, tem cedido devagar. Os últimos dados colhidos pelo IBGE apontavam o indicador acima do teto da meta de 6,5% do Banco Central em 2011. Essa percepção culminou com a divulgação dos resultados do terceiro trimestre, que mostraram um PIB estagnado em relação ao trimestre anterior e a demanda interna em queda de 0,1%. “Seremos cautelosos com relação aos fundamentos nos próximos 12 a 18 meses”, afirma o gestor.

Apesar do cuidado, a Fidelity aumentou sua participação em algumas empresas. Duffy destacou, por exemplo, além da AmBev, a fabricante de cigarros Souza Cruz, cujos papéis se valorizaram cerca de 35% no ano passado. Diferentemente de seus colegas, ele não cita o setor imobiliário dentre as boas perspectivas para 2012. Esse segmento, assim como o de petróleo e gás, precisa de muito capital para crescer, coisa que não promete estar abundante este ano. “Vamos nos posicionar em empresas com balanços sólidos, que gerem fluxos de caixa internos elevados e sustentáveis. O setor financeiro é interessante.”

Se a regra para as ações é ir com cuidado e observar como o mercado se movimenta, a disposição em elevar as aplicações em papéis de dívida parece mais clara. Cláudia Calich, gestora de renda fixa para mercados emergentes da Invesco Global, conta que estuda aumentar a alocação de recursos no Brasil. Atualmente, 40% dos investimentos de renda fixa da Invesco no País são voltados para o setor público e 60% para debêntures e outros títulos de dívidas de empresas privadas, como Telemar, Globopar e Itaú. Cláudia vê a renda fixa como uma opção interessante, mesmo com as expectativas de redução da taxa referencial Selic. “Acredito que essa é a melhor alternativa, mas a renda variável também pode ser uma boa escolha, porque muitas empresas sólidas estão baratas.”

A participação dos estrangeiros na BM&FBovespa tem sido relevante nos últimos anos. Desde 2005, eles representam cerca de um terço do volume negociado na Bolsa. Em 2011, até 14 de dezembro, foram responsáveis por 34,7%, parcela maior do que os 29,6% de 2010. Sinal de que estão preenchendo o espaço deixado pelas pessoas físicas, cuja participação caiu de 26,4% para 21,5% no mesmo período. Agora, os países emergentes têm chance de atrair recursos que iriam para a Europa, e o Brasil está bem posicionado nesse grupo. Se der conta do recado, assegurando o delicado equilíbrio macroeconômico, tem tudo para tirar proveito da crise.


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