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Caos aéreo
Falta de investimento em infraestrutura limita projeções de companhias do setor para os próximos anos

, Caos aéreo, Capital Aberto

A fusão da TAM, principal companhia aérea brasileira, com a sua concorrente chilena LAN Airlines deu origem, em agosto, ao maior consórcio aéreo da América Latina: a Latam Airlines. Com capacidade para atender a 115 destinos em 23 países, a união das duas segue um movimento de consolidação mundial do setor. Nos últimos anos, uniram-se British Airways e Iberia, Air France e KLM, United e Continental, e Delta Airlines e Northwest. A operação representa, para a TAM, uma oportunidade ímpar de aumentar seus voos internacionais e crescer em áreas onde não tem tanta experiência, como a de transporte de carga. Ao olhar para fora, a companhia dos saudosos tempos do comandante Rolim também encontrou sua maneira de driblar um problema, por enquanto, sem solução: o caos que se instalou nos aeroportos brasileiros.

O setor aéreo vem crescendo à taxa de 10% ao ano desde 2003. O número de passageiros por quilômetro transportado passou de 18 milhões em 2005 para cerca de 38 milhões em julho de 2010. Mas todo esse avanço não foi acompanhado por melhorias na infraestrutura dos aeroportos, que estão à beira de um colapso. Filas para check-in, para embarque e até para os banheiros passaram a ser uma constante no dia a dia dos passageiros.

Os investidores bem que poderiam esperar por um céu de brigadeiro. Há expectativa de aumento de capital estrangeiro nas companhias, demanda em franco aquecimento e possibilidades de ofertas públicas iniciais de ações (IPOs) de mais empresas e de novas fusões e aquisições. No entanto, uma tempestade está se formando nessa rota aparentemente tranquila. A falta de estrutura para suportar tanta atividade pode limitar o crescimento do setor, se algumas medidas não forem tomadas. “Se nada for feito, corremos o risco de enfrentar um novo ‘apagão’ no setor nos próximos dois anos”, alerta Vicent Baron, da consultoria Naxentia.

FORTES TURBULÊNCIAS — Dos 20 principais aeroportos do País, 13 apresentam gargalos nos terminais de passageiros, de acordo com a consultoria McKinsey. A situação em Congonhas e Guarulhos, principais aeroportos de São Paulo, é crítica. Guarulhos só conta com duas pistas de pouso e decolagem, e o espaço para a terceira foi ocupado por uma favela. A reforma das pistas, prevista há dois anos, deveria ter começado no mês passado, mas foi adiada para março de 2011.

“O crescimento do setor, com a entrada da classe C, não é sustentável ao longo dos anos se investimentos não forem feitos”, avalia o analista Brian Moretti, da Planner Corretora. Às companhias aéreas não resta saída a não ser se virar como podem. Para contornar o problema, a maioria remanejou parte dos seus voos de São Paulo para outros aeroportos menos movimentados. A TAM, por exemplo, aumentou o número de decolagens a partir do Rio de Janeiro, cujo aeroporto internacional, Antonio Carlos Jobim, é menos saturado que o de Guarulhos. A Gol também diminuiu o número de conexões saindo de Guarulhos e Congonhas. Muitas delas ocorrem, hoje, no Rio de Janeiro, em Brasília e em Belo Horizonte. Em breve, Salvador deve entrar nessa lista.

A companhia também tem investido na substituição de aviões de menor porte por aeronaves com maior capacidade — a empresa trocou boeings 737 300, de 140 lugares, por 737 800, de 164 lugares. A expectativa é que essas iniciativas ajudem a desafogar o tráfego aéreo.

“Esses remanejamentos são suficientes para sustentar nossa expansão nos próximos dois a três anos. Depois, a situação deve melhorar com os investimentos anunciados pelo governo na infraestrutura dos aeroportos, por conta da Copa do Mundo e da Olimpíada”, prevê Leonardo Pereira, vice-presidente de finanças e de relações com investidores (RI) da Gol. “Se não fossem esses eventos, a conversa seria outra.”

Adalberto Febeliano, diretor de relações institucionais da Azul, também acredita que os problemas nos aeroportos serão resolvidos a tempo e a contento. “Os aeroportos de São Paulo é que são o maior gargalo. No restante do País, eles precisam ser melhorados, mas geralmente os sítios aeroportuários existentes permitem expansão.”

A questão é que, por enquanto, nem mesmo a proximidade da Copa do Mundo de 2014 parece ter sido o bastante para tirar o governo da inércia. “Infraestrutura não é um negócio para quatro anos. Requer um planejamento de 30 anos”, avisa Eduardo Padilha, professor de avaliação de empresas e especialista em infraestrutura do Insper. Ele ressalta que, sem suporte adequado, as companhias aéreas não têm motivos para operar de forma eficiente, uma vez que sempre podem jogar a responsabilidade pela má operação no governo. “O espaço para crescer remanejando voos é limitado. O fato é que não há como deslocar toda a demanda.”

Num cenário de restrição aos voos, com mais atrasos, os custos operacionais das companhias aumentariam pela necessidade de manter as aeronaves no ar por mais tempo. Outra possibilidade é que as empresas não consigam atender à demanda, não pela falta de aviões, mas sim de autorizações para pousos e decolagens. Há quem cogite até uma elevação nos preços de passagens, já que seria impossível expandir a oferta no mesmo ritmo da procura por voos pelos clientes. Tal movimento poderia interromper o crescimento das vendas.

PASSAGEIROS EM ALTA — Mesmo diante dos percalços, os analistas não estão pessimistas. A expectativa desses profissionais é que o setor continue crescendo de 15% a 20% nos próximos dois anos. Ele tradicionalmente acompanha de forma vigorosa o aumento do produto interno bruto (PIB) — a cada ponto percentual que o índice cresce, o setor aéreo cresce três. O fortalecimento da classe média e a irrigação de crédito para a compra de passagens também devem garantir uma demanda aquecida. “Há cem milhões de pessoas com renda disponível para viajar de avião, mas, atualmente, apenas 16 milhões usam o transporte aéreo”, afirma Pereira, da Gol.

A possível elevação da participação do capital estrangeiro nas companhias, dos atuais 20% para 49%, é outro fator que deve dar ânimo ao setor. O assunto será votado na Câmara dos Deputados em meados de 2011 e deve estimular mais empresas aéreas a abrirem o capital. É o caso da Trip e da Azul, que já manifestaram interesse em fazer IPOs. O lançamento de ações permitirá que as companhias se capitalizem e facilitará futuras fusões ou aquisições por meio da troca de ações.

“A consolidação que deve ocorrer no médio e longo prazo é atraente para o investidor”, observa Rosangela Ribeiro, analista da corretora SLW. Ela pondera que o interesse pelo setor também está condicionado à definição sobre o futuro da Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero). A entidade tem sido criticada por sua ineficiência na manutenção da infraestrutura dos aeroportos, no controle do espaço aéreo brasileiro e na destinação de investimentos. Por isso, muitos especialistas defendem que a Infraero seja privatizada e, até mesmo, abra o capital.

ROTA ALTERNATIVA — Num cenário caótico para os aeroportos brasileiros, aumentar o número de voos internacionais pode ser uma questão de sobrevivência. Ao se unir à LAN, a TAM abriu novas rotas para o exterior — do Brasil para a Europa e a África, e de Lima (Peru) para a América do Norte e a América Central —, ficando em posição privilegiada em relação à Gol. “A TAM ganhou massa e ficou bastante forte para competir nos mercados doméstico e internacional”, diz Marcelo Varejão, analista da corretora Socopa. Segundo dados de julho da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), TAM e Gol têm participação de 43% e 38%, respectivamente, do mercado doméstico.

Os ganhos de sinergia entre a TAM e a LAN estão estimados em US$ 400 milhões por ano. Apesar de a marca ser mantida, o capital da TAM será fechado. A companhia que frequentará os pregões da BM&FBovespa será a Latam, por meio de Brazilian depositary receipts (BDRs). Os papéis da Latam serão também negociados em Nova York e Santiago.
A esperança dos investidores brasileiros que quiserem aproveitar o potencial expansão do setor e ter alternativas de investimento além da Gol e dos BDRs da Latam é a abertura de capital da Azul e da Trip.

Para Marcio Macedo, sócio-gestor da Humaitá Investimentos, o bom posicionamento da TAM no mercado doméstico — que deve crescer em função das viagens de negócios, segmento em que ela tem imagem sólida — e a liderança no internacional, outrora ocupada pela Varig, tornariam as ações da nova companhia mais atraentes do que os de sua maior rival. A fusão resultará em ganho de escala graças à economia na aquisição e na manutenção de aviões, adiciona Macedo.

Em comunicado oficial após a criação da Latam, a Gol informou que manterá sua estratégia de negócios e projeções já divulgadas. Declarou que é a empresa com maior rentabilidade operacional do País e que “continuará oferecendo serviços de alta qualidade a preços competitivos, utilizando, principalmente, seus custos mais baixos, inovação, pontualidade e regularidade como alavancas de crescimento.” A verdade é que atingir essas metas, como se sabe, não depende só de sua vontade.

Trip e Azul são aguardadas na bolsa

A possível abertura de capital de companhias aéreas como Trip e Azul são esperadas ansiosamente por analistas e investidores. As duas aspirantes à Bolsa têm histórias de sucesso para contar.

Em menos de dois anos, a Azul conquistou 6,31% do mercado doméstico de aviação comercial. Começou a operar em 2008, a partir de aeroportos menos movimentados como o de Viracopos (Campinas), restabelecendo rotas que deixaram de existir na década de 90, quando as principais companhias se concentraram nos grandes centros, deixando desassistida a população de localidades menores. “É possível crescer oferecendo um serviço conveniente em cidades que hoje não têm atendimento”, diz Adalberto Febeliano, diretor de relações institucionais (RI) da Azul. “O setor aéreo demanda capital a uma velocidade impressionante. Não conheço companhia aérea que queira crescer e que não precise abrir o capital”, acrescenta.

No primeiro semestre deste ano, a companhia recebeu um aporte de recursos do fundo de private equity norte-americano TPG, que comprou participação de 10% por um valor estimado de US$ 20 milhões. Fundada pelo empresário David Neeleman, a Azul voa para 24 destinos e espera terminar o ano com 26 aeronaves (atualmente são 21). A empresa não divulga o seu faturamento.

A Trip, por sua vez, é uma companhia aérea regional que voa desde 1998 para 79 cidades no Brasil. Atualmente, conta com 35 aeronaves. Seu plano é terminar 2010 com faturamento de R$ 760 milhões, 68,8% superior ao do ano passado. A empresa é controlada pelos grupos Caprioli e Águia Branca, que atuam com transporte rodoviário. Em setembro de 2008, a norte-americana SkyWest (maior do mundo em transporte regional) comprou 20% do capital da Trip. A empresa espera obter o registro de companhia aberta até o fim deste ano, mas ainda não tem data definida para realizar sua oferta pública inicial de ações (IPO).

Para se preparar para o grande dia, a Trip está adequando sua estrutura de governança. Recentemente, admitiu dois membros independentes (Wilson Maciel Ramos e Eduardo Gentil) no conselho de administração e implantou três comitês: de estratégia de mercado, de auditoria e finanças, e de gestão. A empresa detém 2,46% do mercado doméstico.

O analista Brian Moretti, da Planner corretora, acredita que haverá forte interesse dos investidores pelos papéis. “Essas companhias serão especialmente atraentes se o aumento do capital estrangeiro nas empresas aéreas for aprovado”, afirma. Além disso, o chamado ‘yield’ (receita por passageiro por quilômetro voado) costuma ser maior nas linhas regionais, embora elas operem em escala menor, com aviões de capacidade para até 90 passageiros, observa Marcio Macedo, sócio gestor da Humaitá Investimentos. (L.D.C.)


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