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As virtudes do capitalismo
Uma breve exposição das ideias da intrigante Deirdre McCloskey

, As virtudes do capitalismo, Capital Aberto

Evandro Buccini*/ Ilustração: Julia Padula

Normalmente os textos desta coluna são encadeados de forma a permitir o aprofundamento em algum assunto, driblando a restrição de espaço. Desta vez, ao contrário do indicado na publicação anterior, o tema não será a dívida pública. No começo de novembro, em São Paulo, Deirdre McCloskey fez várias palestras ligadas à série “Fronteiras do Pensamento”. Mulher de difícil descrição, ela assim se define: “Sou uma mulher de Boston literária, quantitativa, pós-moderna, defensora do livre mercado, anglicana progressista, que já foi um homem. Não sou conservadora! Sou uma libertária cristã”. A oportunidade de falar sobre seu trabalho, especialmente neste momento de prematuro debate eleitoral, em que nenhum grupo defenderá a economia de mercado de forma tão inteligente quanto ela, me pareceu justificar a quebra de sequência, que será retomada no primeiro texto de 2018.

Autora de extensa obra em vários campos do conhecimento — economia, religião, história, ética, retórica, política e questões de gênero — desde a década de 1990 McCloskey se dedicou a escrever a trilogia A Era Burguesa. As quase duas mil páginas se dispõem a mostrar que o avanço das ideias e das inovações é a causa do crescimento extraordinário dos últimos séculos. Mais do que isso, os livros defendem as virtudes do capitalismo.

O primeiro capítulo do primeiro livro oferece um resumo da empreitada. Intitulado “Apologia”, defende que a burguesia tem mais virtudes do que apenas a prudência, que sempre foi ligada ao capitalismo, o comprar barato e vender caro. Mesmo essa tem seu outro lado: a prudência em fazer comércio em vez de invadir. As outras virtudes são a coragem em aventurar-se em novos negócios e também em correr o risco de falir; a justiça em insistir na propriedade privada adquirida honestamente, mas também em honrar o trabalho e quebrar privilégios; a temperança em poupar, mas também em se educar na sua área e na vida. Além dessas, três virtudes cristãs — a fé, a esperança e o amor.

As origens usuais do “grande enriquecimento”, como McCloskey designa o período desde 1800 — em que a renda per capita aumentou entre 2.500% e 5.000% nos países desenvolvidos — são a acumulação de capital, a exploração e as instituições. Para ela, a humanidade sempre acumulou capitais, e sem inovações esse capital não teria levado aos avanços desde então. A exploração é uma explicação marxista que volta ao primeiro argumento, a acumulação primitiva. Se assim fosse, a industrialização teria acontecido quando o faraó escravizou os hebreus, como ela diz no segundo livro. As instituições também existem há séculos, e muitas comunidades desde Moisés ou Sólon até o primeiro imperador da China já garantiam o direito de propriedade.[1] O que gerou o “grande enriquecimento”, em sua opinião, foi a liberdade que as pessoas tinham de pensar, de ter ideias, de inovar.

O capitalismo hoje, acima de tudo, encoraja a inovação. A liberdade para ter ideias e transformá-las em inovação foi o que levou ao erro autores que apontaram as contradições do capitalismo, como Schumpeter, Weber e Fukuyama. O capitalismo manteve sua criatividade e não abandonou a ética.

Desde meados do século 19 (após 1848), os intelectuais se voltaram para o nacionalismo e para o socialismo e contra o liberalismo. Ideias seculares e religiosas tinham forte inclinação antimercado. Enquanto isso, o mundo moderno passou por uma lenta revolução ética sobre os vícios e virtudes. “O capitalismo não corrompeu o espírito. Pelo contrário, não tivesse o capitalismo enriquecido o mundo por um centavo, ainda assim suas virtudes burguesas, antifeudais, teriam nos feito pessoas melhores[2]. ”

Para os leitores mais assíduos de sua obra, é evidente a ampliação do escopo de suas fontes e de temas de seus estudos. Questionada por Gustavo Franco no debate após a palestra no evento em São Paulo, ela respondeu categoricamente que isso está ligado com a sua transição de gênero, feita há cerca de 20 anos. Para terminar o debate, a mediadora perguntou a McCloskey se vale a pena ser mulher atualmente. Ela se despediu dizendo que sim, apesar de não ver seus filhos também há pelo menos 20 anos e de não conhecer seus netos.


*Evandro Buccini é economista-chefe da Rio Bravo Investimentos


[1] The Institution of Douglass North Deirdre Nansen McCloskey July 2009, https://mpra.ub.uni-muenchen.de/21768/1/MPRA_paper_21768.pdf

[2] The Bourgeois Virtues, Deirdre McCloskey

 


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