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Banido na crise
Criticado lá fora e aliado das novatas na bolsa brasileira, guidance de resultados é deixado de lado diante do ano imprevisível

, Banido na crise, Capital AbertoA Microsoft e a rede varejista Cotso, a europeia Unilever e as brasileiras Bematech e Rodobens tomaram uma decisão comum sobre suas práticas de divulgação em 2009: cortaram o guidance das apresentações. E elas não foram as únicas. Do total de 179 companhias do índice norte-americano S&P 500 que divulgavam projeções de resultados até 2008, 16% desistiram de fazê-lo para o primeiro trimestre deste ano, segundo dados da consultoria Thomson Reuters. Definido pelo Comitê de Orientação para Divulgação de Informações ao Mercado (Codim) como “qualquer informação prospectiva de natureza quantitativa ou qualitativa fornecida pela companhia sobre seu desempenho futuro”, o guidance também foi abandonado por boa parte das empresas brasileiras novatas no pregão.

A explicação dos administradores é, invariavelmente, a dificuldade de determinar as premissas econômicas para projetar o desempenho financeiro ou operacional da companhia diante das inúmeras incertezas sobre o desfecho da crise internacional. O argumento é utilizado até pelas companhias que acertaram nas projeções. A fabricante de equipamentos e de sistemas de automação Bematech alcançou a margem Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização) de 22,7% — dentro da faixa projetada para 2008, que ficava entre 22% e 25%. Mesmo assim, optou por não mais divulgar o guidance.

Há quem veja com pesar a suspensão dessa prática. Para Orlando Viscardi Neto, diretor de Relações com Investidores (RI) da incorporadora Rodobens, a projeção é um importante instrumento de prestação de informações ao mercado. “Queria continuar a divulgação, mas seria pouco útil”, afirma. Sua expectativa é que o novo pacote do governo para o setor de habitação, de R$ 34 bilhões, lançado no fim de março, mude as premissas de avaliação da companhia.

A experiência da Rodobens com o guidance vinha sendo positiva. Em 2008, foi projetado um Valor Geral de Vendas (VGV, indicador muito usado por incorporadoras) de R$ 634 milhões, pouco inferior aos R$ 659 milhões atingidos no ano. Ao suspender o guidance, a companhia anunciou ao mercado a decisão, “conforme determinam as boas práticas editadas pelo Codim.”

CONQUISTANDO O MERCADO — A divulgação das metas projetadas pela administração da Rodobens vinha desde antes da oferta pública inicial (IPO), em janeiro de 2007. Era uma indicação do banco de investimento para a realização do road show que foi mantida após a abertura de capital. “Apresentei ao conselho a ideia. É uma prática típica de uma companhia pequena com projeto de crescimento forte”, reconhece Viscardi Neto. Boa parte das 14 incorporadoras que estrearam na bolsa em 2007 também viu no guidance uma maneira de cativar o mercado. Ao projetar e acertar a meta, a administração dessas empresas conquistaria a confiança de analistas e investidores — prêmio valioso para uma novata de um setor tão concorrido. Com a virada do mercado, porém, o que era virtude virou inconveniente.

A Helbor mantém as metas, mas não as divulga. “O guidance está desacreditado. Nem os analistas pedem mais”

A Helbor é um exemplo. A incorporadora projetou um VGV para 2008 de R$ 1,1 bilhão. Depois de entregar apenas R$ 776 milhões, desistiu de divulgá-lo. A administração continua a trabalhar com metas, embora não mais as divulgue ao mercado. “O guidance está desacreditado. Nem os analistas pedem mais”, diz Roberval Toffoli, diretor de RI da companhia. O executivo confessa que a Helbor nunca se sentiu confortável em divulgar as projeções, mas o fazia por se tratar de uma prática do setor. Ele lembra que, em 2007, para que o guidance fosse atingido, algumas companhias pressionaram para cima o número de lançamentos no mercado imobiliário, desconsiderando a capacidade real de venda. “O segredo da incorporação é lançar e vender. Não atingimos o guidance em 2008 porque estaríamos colocando o negócio em risco.” No terceiro trimestre de 2008, quando era nítido que a companhia não conseguiria atingir o VGV de R$ 1,1 bilhão, o diretor de RI pensou em rever a meta. “Mas não foi necessário. O mercado já havia entendido a escolha da companhia em frear os lançamentos.”

As regras para divulgar as projeções, suas revisões e cancelamentos ficam, até então, numa área cinzenta. Algumas companhias apresentam o guidance nas Informações Trimestrais (ITRs) e não atualizam a informação. Outras o fazem por meio de comunicados ao mercado, e um terceiro grupo utiliza fato relevante. Há também empresas que comunicam as metas de maneira informal, em reuniões com analistas. A minuta de Instrução da Nova 202 traz uma proposta para colocar ordem no assunto. A divulgação de estimativas e projeções continua sendo facultativa, mas a companhia que fizer essa opção terá de seguir alguns procedimentos. Primeiro, a informação deve estar no Formulário de Referência, que será o principal documento de comunicação com o mercado. As perspectivas de desempenho futuro precisarão ser acompanhadas das premissas e da metodologia utilizadas. Também se torna obrigatória a revisão das metas. A minuta da instrução não determina um prazo específico para comunicar eventuais mudanças de rumo, mas o intervalo não pode ultrapassar um ano. Trimestralmente, será preciso confrontar os dados estimados com os resultados obtidos no período. Em caso de descompasso, é preciso deixar claro por que a corporação não cumpriu a meta prevista.

POR CONTA PRÓPRIA — O analista do Santander, Marcello Milman, não vê grandes problemas na suspensão do guidance. “Entre uma abertura ampla da situação da companhia e o guidance para o ano, eu fico com a primeira opção.” Milman prefere se basear nas projeções próprias, elaboradas a partir dos fundamentos apresentados. Em sua opinião, o artifício vai cair em desuso aos poucos, naturalmente. “A origem do bom humor do mercado com uma determinada companhia não está no erro ou no acerto das suas projeções. Está nos resultados que ela entrega.”

Pesquisa da Thomson Reuters afirma que empresas adeptas das projeções recebem um prêmio dos investidores

A incorporadora PDG Realty não só atingiu o alvo divulgado como também o superou. Havia projetado um VGV entre R$ 2 bilhões e R$ 2,1 bilhões no início de 2008. Durante o ano, foi revendo para cima o guidance até chegar a R$ 2,6 bilhões — volume que efetivamente atingiu. O diretor de RI, Michel Wurman, diz que, se fosse o caso, não haveria problema em reduzir os números das projeções. Ele é um forte defensor do guidance, e a hipótese de interromper a política de divulgação por força da crise o deixa incomodado. “Uma empresa que adota o guidance tem de continuar divulgando a projeção, independentemente de cumprir ou revisar. O investidor merece saber a visão dos administradores; isso faz parte da governança corporativa de uma empresa em expansão.” Abandonar o guidance, segundo Wurman, pode deixar a impressão de que, para algumas empresas, as boas práticas não se encaixam em maus momentos econômicos. Mesmo admitindo que a turbulência prejudica a análise de curto prazo, o diretor de RI observa que cortar o guidance não é a única forma de evitar erros. Para 2009, a PDG aumentou o intervalo da projeção. A meta é um VGV entre R$ 2 bilhões e R$ 3 bilhões. “Durante o ano, vamos calibrar esse número e informar os investidores por meio dos resultados trimestrais.”

, Banido na crise, Capital AbertoRuim com ele, pior sem — A análise feita pela Thomson Reuters com as empresas que compõem o S&P 500 contou pontos a favor do guidance. Em setores que não costumam divulgar projeções, as companhias que adotam a prática apresentam um múltiplo Preço/Lucro por ação (P/L) estimado para 12 meses 11% superior ao daquelas que não oferecem projeções. O prêmio é atribuído pelos investidores mesmo quando as estimativas anunciadas indicam queda nos lucros futuros. Na conclusão do estudo, a consultoria aponta a divulgação como um dos paliativos para enfrentar a crise.

Mas o fato é que o guidance vem perdendo adeptos, e não é de hoje. Nos Estados Unidos, a projeção trimestral vem em declínio desde 2005. Naquele ano, o presidente da câmara de comércio norte-americana, Tom Donohu, clamou pelo seu fim num evento com analistas de Wall Street. Os efeitos foram percebidos nos anos posteriores. Em 2006, de acordo com pesquisa realizada pelo National Investor Relations Institute (Niri), com 370 companhias do país, 66% forneciam guidance. No ano seguinte, esse número havia caído para 51%.


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