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Aposta no verde lucrativo
Fundos de venture capital preparam-se para investir em projetos de sustentabilidade e companhias buscam oportunidades de negócios no mercado internacional de créditos de carbono

, Aposta no verde lucrativo, Capital AbertoOs funcionários da siderúrgica independente Plantar, de Belo Horizonte, não se espantam mais quando escutam do dono da empresa, Geraldo Moura, que a companhia pode ganhar muito dinheiro quantificando o gás carbônico que deixa de lançar na atmosfera. Em 2001, ele fechou um contrato com o Banco Mundial (Bird) de venda de crédito de CO2 a partir da produção do ferro gusa “limpo” – sem o uso de carvão mineral, o coque, que é altamente poluente. Pelo acordo, a siderúrgica vai receber US$ 5 milhões por 1,5 milhão de tonelada de carbono que será entregue ao longo de sete anos, a partir de 2004.

A lógica do negócio é fácil de entender. Para cada tonelada de ferro produzida com coque, é emitida 1,9 tonelada de CO2. Quando utilizado o carvão vegetal, é retirada da natureza 1,1 tonelada de CO2, já que, durante o crescimento das florestas mantidas pela siderúrgica e transformadas depois em carvão, há o seqüestro do carbono da atmosfera pela fotossíntese. Assim, a fabricação de 1 tonelada de ferro com carvão vegetal permite um ganho ambiental de 3 toneladas de CO2.

Projetos como esse estão despertando cada vez mais a atenção dos investidores e fazendo cair por terra a idéia de que meio ambiente e desenvolvimento sustentável são preocupações exclusivas de ecomilitantes ou de ativistas xiitas vinculados a organizações não-governamentais. Pelo menos quatro fundos de venture capital estão sendo estruturados no Brasil com o objetivo de financiar empreendimentos com gestão de sustentabilidade. Isto é, estratégias de negócios que integram os desempenhos econômico, ambiental e social.

Um deles é o da assessoria financeira Ecoinvest. O fundo está em análise na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e terá parte de sua receita voltada para projetos de seqüestro de carbono. A Stratus Investimentos também está de olho em companhias ambientalmente responsáveis. Desde o fim do ano passado, trabalha na estruturação de um setor específico para investimentos nesse ramo.

, Aposta no verde lucrativo, Capital AbertoOutro movimento que reforça essa tendência é a chegada ao Brasil do programa New Ventures, da ONG americana World Resources Institute (WRI). A entidade está trazendo o modelo já adotado na China e na América Latina. Com a ajuda de parceiros locais, o New Ventures seleciona empresas incipientes e ambientalmente responsáveis para participar de um fórum com potenciais investidores. Os escolhidos ganham consultoria gratuita de universidades e instituições financeiras, entre outros parceiros. Segundo Luiz Roz, coordenador do New Ventures, a abertura de um escritório no Brasil justifica- se pela abundância de riqueza natural e pela crescente conscientização social das companhias e da população (veja box). “O Brasil está entre os países com maior potencial para negócios sustentáveis e ambientais”, afirma Roz.

MENOS CO2 NA ATMOSFERA – Entre as oportunidades que seguem esses preceitos, a mais discutida no momento por empresas e investidores é exatamente aquela explorada pela siderúrgica Plantar: redução de emissão de gás carbônico na atmosfera. E tanto interesse em torno do tema tem um motivo: a expectativa de ganhos altos após a criação do Protocolo de Kyoto em 1997, que tem como objetivo a estabilização das concentrações atmosféricas de gases causadores do efeito estufa em níveis seguros. Depois de muitas discussões entre governos, coordenadas pela Organização das Nações Unidas (ONU), sobre as mudanças climáticas no planeta, o tratado estabelece que a emissão desses gases deve ser reduzida em torno de 5% em relação ao que era emitido em 1990. Os países teriam até 2008 para implementar esses projetos com o compromisso de comprovar a redução no período fixado entre 2008 e 2012.

Como a industrialização dos países desenvolvidos foi a maior responsável pela poluição causada até hoje, ficou acordado ainda que essas nações devem ser as responsáveis pela redução. O Protocolo de Kyoto também oferece um trunfo às nações menos desenvolvidas. Trata-se do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), uma espécie de cooperação internacional que permite aos países ricos deduzir de seus níveis de emissão os créditos acumulados por conta de investimentos em projetos “limpos” dos países pobres. Esse mecanismo pode gerar um mercado de até 2,4 bilhões de dólares para as nações em desenvolvimento.

Para que entre em vigor, o Protocolo de Kyoto precisa ter adesões de países que somem pelo menos 55% das emissões totais de CO2 em 1990. A porcentagem de países que já ratificaram o documento até o momento é de 44,2%. Os Estados Unidos – responsáveis, sozinhos, por 36% das emissões de dióxido de carbono na atmosfera – rejeitaram. Sendo assim, para que a meta de 55% seja atingida, falta a Rússia aderir ao acordo que promete melhorar o clima do planeta na próxima década.

Quatro fundos de venture capital estão sendo criados para financiar projetos sustentáveis

APOSTA NOS MERCADOS REGIONAIS – Mesmo que isso não aconteça, especialistas acreditam que os mercados regionais, que hoje já existem na Europa e nos Estados Unidos, continuarão vigorando. Afinal, países como a Holanda das terras baixas, por sua posição geográfica, tem razões de sobra para se preocupar com a redução do efeito estufa. Uma das graves conseqüências que ele pode trazer, com o aquecimento do clima, é o aumento do nível do mar, provocando a inundação dos países que se situam abaixo desse nível.

“O maior mérito do Protocolo de Kyoto foi o de conscientizar governos, empresas e sociedades civil da importância do tema e da necessidade de mudarmos nossos hábitos para não colocar em risco a própria sobrevivência do homem”, diz Marco Antônio Fujihara, diretor de sustentabilidade da PricewaterhouseCoopers. “Portanto, independentemente de sua entrada em vigor, já existe um mercado estabelecido e em franca expansão.” Nesse mercado, chamado de non-compliance Kyoto, mais de dez estados norte-americanos já aderiram às regras propostas pelo protocolo (estados que não contam no cálculo de adesão dos países, de 44,2%) e o Banco Mundial formou o maior fundo para a compra de crédito de carbono, o Prototype Carbon Fund.

Mais tarde surgiram outros fundos na mesma linha, esses de agentes privados, como o Clean Tech, o Singapore-Asean Carbon, o International Carbon Bank and Exchange, e dois programas do governo holandês (Erupt e Cerupt). Além disso, empresas americanas como DuPont, Ford e General Motors já formaram, por conta própria, em outubro de 2003, uma espécie de bolsa privada, a Chicago Climate Exchange (CCX). O objetivo é promover reduções gradativas (até atingir 4% em 2006) em relação à média anual de gases emitidos nos EUA e Canadá entre 1998 e 2001. Para isso, também serão comprados créditos gerados no Brasil a partir de projetos florestais.

ONG norte-americana aposta em fórum que une empresas incipientes e potenciais investidores

As nações industrializadas sabem que dificilmente cumprirão as cotas estabelecidas pelo acordo e terão de ir às compras de crédito. É aí que países em desenvolvimento podem levar vantagens nesse negócio. De olho no mercado, além da Plantar, empresas como Usina Piratini, Usina Catanduva, Companhia Siderúrgica Tubarão (CST), Siderúrgica V&M do Brasil e Companhia Açucareira Vale do Rosário estão se antecipando à aprovação do protocolo e já fecharam ou estão negociando acordos de venda de créditos de carbono.

Preocupação sócio-ambiental virou vantagem competitiva


A sustentabilidade está ultrapassando os verdes limites do meio ambiente. As organizações que quiserem se destacar nas bolsas de valores e chamar a atenção do mercado deverão adotar cada vez mais uma linha de ação que produza igual valor nas dimensões econômica, ambiental e social – o tripé do desenvolvimento sustentável. Algumas pesquisas revelam que as empresas brasileiras já estão se conscientizando disso.A mais recente foi realizada pela PricewaterhouseCoopers. Das 239 companhias consultadas pela consultoria, 53% contam com uma área específica para cuidar do meio ambiente. A maioria, de acordo com a pesquisa, é do setor industrial, pois suasatividades podem ser agressivas ao meio, com geração de gases e resíduos perigosos.Se ainda não chegaram na gestão sustentável, muitas companhias estão pelo menos preocupadas em demonstrar ética empresarial. Prova disso é o crescimento da quantidade de publicações de balanços sociais nos últimos anos. Em 1997, apenas 14 empresas publicaram balanços do gênero. Já em 2003, o número passou de 300. Uma pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) calcula em R$ 5 bilhões o volume de recursos que as companhias destinam à responsabilidade social.

“As empresas brasileiras estão mudando sua atitude em relação às iniciativas sócio-responsáveis”, diz Ada Gonçalves, coordenadora de um dos departamentos do projeto Inovar, ligado à Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). “A responsabilidade passou a ser fator de competitividade.” Ela tem razão. Empresas com esse tipo de conduta só têm a ganhar. O banco ABN Amro, além de ter criado um fundo de investimento exclusivo para empresas socialmente responsáveis, o Ethical, só aprova créditos para companhias que têm iniciativas sócio-ambientais.

Os fundos de pensão também estão de olho nesse nicho de mercado e até estão elaborando um documento com critérios para facilitar a identificação de empresas com responsabilidade social. Essas companhias terão maior visibilidade na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) a partir de junho de 2004, quando o Índice Social entrará em operação.

OPORTUNIDADES PARA OS EMERGENTES – A Usina Catanduva, que tem um projeto para gerar energia a partir do bagaço de cana-de-açúcar, foi uma das ganhadoras de um leilão realizado pelo governo holandês para adquirir créditos de CO2. A energia fornecida de uma fonte renovável substituirá matérias- primas fósseis e assim gerará os créditos. Em troca de pouco mais de US$ 1 milhão, a companhia vai fornecer, a partir de 2005, 200 mil toneladas de CO2 em dez anos. Já a Usina de Piratini negociou seus créditos com o governo do Canadá. Ela produz energia com a queima das cascas de madeira oriundas de serralheiras da região, numa máquina a vapor. O dióxido produzido pela queima da madeira é consumido pelas áreas de reflorestamento manti das pelas madereiras, no processo de fotossíntese, o que fecha o ciclo do carbono na atmosfera.

Outra empresa que já comercializou seus créditos de carbono é a siderúrgica V&M do Brasil, subsidiária do grupo Vallourec & Mannesmann Tubes, que produz aço a partir de carvão vegetal de florestas plantadas pela própria empresa. Segundo Marco Antônio Castello Branco, presidente da companhia, a transação foi realizada com o IFC Netherlands Carbon Facility, do IFC – braço financeiro do Banco Mundial. Foram cedidos 5 milhões de toneladas de crédito de carbono por US$ 18 milhões.

Para participar do mercado, a empresa deve encomendar de uma consultoria um documento demonstrando a quantidade de créditos que seu projeto pode gerar. Feito isso, uma auditoria checa essa hipótese e o governo concede uma carta de crédito para ser negociada. “Um dos critérios de elegibilidade dos projetos de seqüestro de carbono é o grau de sustentabilidade que oferecem”, diz o advogado Vladimir Abreu, sócio do escritório de advocacia Tozzini, Freire, Teixeira e Silva Advogados.

O problema, segundo ele, é que os critérios para identificar a sustentabilidade são genéricos, tanto no texto do Protocolo de Kyoto como na resolução publicada pela Comissão Interministerial sobre Mudanças do Clima formada no Brasil. Para Abreu, os critérios não podem ser muito abrangentes, nem muito rígidos a ponto de afastar potenciais investidores. Outro cuidado que o Brasil deve tomar, observa, é com a data de divulgação da sua regulamentação. “Isso é estratégico, pois não podemos ser prejudicados com vantagens oferecidas por regras de outros países. Temos que elaborar um modelo semelhante ao das outras nações emergentes.

Atualmente, os créditos de carbono estão cotados no mercado internacional entre US$ 3 e US$ 5 por tonelada. A perspectiva para 2010 é que essa cotação salte para US$ 14,3 (veja gráfico). É pela possibilidade de comprar barato hoje para vender mais caro amanhã que muitos fundos de capital de risco estão buscando essas oportunidades. Já há também perspectiva de mercado secundário no Brasil. O presidente da Bolsa de Mercadorias e Futuros (BM&F) anunciou publicamente que pretende criar, ainda em 2004, um mercado futuro para negociação de contratos de seqüestro de carbono.

Empresas brasileiras se antecipam ao Protocolo e fecham contratos de venda de carbono

A AxialPar – empresa de investimentos focada em companhias ambientalmente responsáveis criada em 2000 – lançará um fundo no final de 2004 com patrimônio de US$ 20 milhões. Entre os projetos em análise, um é de redução de gás carbônico na atmosfera. Experiência a empresa já demonstrou ter. Hoje participa de três projetos diferentes no ramo.

O principal deles é o Rio de Una, em São José dos Pinhais (PR), que produz vegetais frescos. Há dois anos, quando a empresa entrou no negócio, o Rio de Una faturava R$1,8 milhão por ano e produzia 60 toneladas por mês. Em 2003, faturou R$ 4 milhões e 700 toneladas. A empresa tem ainda dinheiro aplicado num agronegócio de soja especial e numa produtora de pescados nativos brasileiros, em Itaporá (MA). “A idéia de que negócios com sustentabilidade não são lucrativos não é verdade. Se forem bem administrados, podem oferecer ganhos como outro investimento qualquer”, afirma Filipe Augusto de Souza, diretor de projetos da AxialPar.

Como é de praxe no mercado financeiro, as aplicações mal geridas, seja de qual tipo for, tendem a desaparecer. Com o investimento ambiental não é diferente. Um exemplo é o fundo Terra Capital – primeiro do gênero criado no País, no fim de 1998. Com o objetivo de angariar recursos para projetos como o da Mauá Alimentos, exportadora de açaí da Ilha de Marajó (PA), foi desfeito recentemente. Fontes próximas da operação dizem que houve erros na administração do empreendimento.

Especialistas acreditam que, mesmo sem o Protocolo, os mercados regionais continuarão em vigor

No que se refere ao comércio de crédito de carbono, o que se tem feito até agora é, em grande parte, pura especulação. Afinal, a dinâmica do mercado e a quantidade de oportunidades que ele pode criar ainda não estão claras. É algo parecido com a internet. Ninguém sabia o destino do barco, mas todos queriam embarcar. Alguns lucraram e outros morreram na praia. Ainda não dá para saber quanto dinheiro se pode ganhar com o gás carbônico. A única certeza é de que o caminho não tem volta. E quanto antes ele for percorrido, menores serão os efeitos da devastação ambiental sobre a economia dos países.

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