Ano sem trégua
Empresas ampliam exportações, reajustam preços, enxugam custos e renovam suas linhas de produtos. Tudo para somente empatar em rentabilidade com 2002

, Ano sem trégua, Capital AbertoO ano 2003 não foi nada fácil para as empresas brasileiras. Exigiu de boa parte delas malabarismos de última hora para tentar ao menos manter o patamar de lucratividade do ano anterior. Com a economia brasileira praticamente estagnada, o jeito foi movimentar-se com agilidade para remeter a produção ao mercado externo. Ou, para quem não tinha a alternativa da exportação, soluções como realinhamento de produtos e preços, ganhos de produtividade e, mais uma vez, uma navalhada nos custos. No geral, os balanços de 2003 publicados até o fechamento desta edição mostravam um ano tranqüilo para poucos privilegiados. Mais especificamente, apenas para aqueles que tiveram alguma chance de assistir à recessão de longe.

Aracruz, produtora de celulose, Votorantim Celulose e Papel (VCP) e Companhia Siderúrgica Tubarão (CST), fabricante de placas de aço e bobinas a quente, são três exemplos de empresas que acompanharam à distância a escassez interna. Com a maior parte de suas vendas voltada às exportações, elas se aproveitaram da boa demanda dos asiáticos e dos europeus, contaram com a ajuda de um preço favorável para suas commodities no mercado internacional e com um dólar em patamar ainda elevado, embora menos favorável, na média, que o de 2002.

A Aracruz fechou o ano com receita líquida de R$ 3 bilhões, 51% maior que a de 2002 e recorde na história da companhia. Os volumes de vendas cresceram 36% e a produção foi praticamente toda (98%) comercializada no mercado externo. A empresa se aproveitou da demanda favorável na Ásia, principalmente por conta das importações da China, e ampliou a fatia das vendas para a região de 18% para 23%. Teve ainda a ajuda da cotação da celulose, cujo preço médio cresceu 10% em relação ao ano anterior, para R$ 1.561/tonelada. A soma dos ventos que sopraram a favor levou a um crescimento de 56% na geração operacional de caixa (Ebitda), acompanhado de um incremento de rentabilidade bem pouco comum no que se viu até agora para os resultados de 2003 (veja a tabela).

Também com a ajuda do mercado externo e dos preços da celulose, a VCP foi outra a comemorar em 2003 o melhor resultado da sua história. O feito exigiu certo reajuste nas vendas, que deixaram o difícil mercado interno em busca de oportunidades no exterior. De 58% do volume comercializado em 2002, o mercado brasileiro passou a responder por 41%, enquanto as exportações saíram de 42% para 59%. A estratégia levou a um crescimento de 96% nas vendas líquidas no mercado externo e a um aumento de 46% no Ebitda, para R$ 1,1 bilhão.

, Ano sem trégua, Capital AbertoNo setor siderúrgico, a CST, predominantemente exportadora, teve um ano parecido com o das fabricantes de celulose. Aproveitou-se de um aumento no preço médio da placa de aço de 24%, para US$ 237/tonelada, o maior dos últimos cinco anos, e da demanda nos mercados asiáticos. Ampliou sua geração operacional de caixa em 29% e atingiu um lucro líquido de R$ 910 milhões, parte dele distribuído aos acionistas em dividendos recordes.

EXPORTAR FOI A SAÍDA – A boa performance das três companhias, contudo, não significa que o ano tenha sido tão bom assim para todas as empresas de papel e celulose e siderurgia. A necessidade de contornar situações de escassez se mostrou mais evidente quanto maior a exposição da companhia ao mercado doméstico. Principalmente para aço e papel, o ambiente interno ficou longe de ser dos melhores.

A Gerdau registrou retração de 13% nos volumes de vendas para o mercado doméstico. Como seu faturamento é dividido entre Brasil e exterior, conseguiu escapar de um ano predatório para os resultados com volumes inéditos de vendas no mercado internacional, 70% superiores aos de 2002. Assim obteve um crescimento no Ebitda de 26%, para R$ 2,7 bilhões, mas não sustentou o mesmo nível de lucratividade e caiu de uma margem Ebitda de 23,3% para 20%.

Em papel e celulose, a Cia. Suzano enfrentou uma redução de 13% nas vendas domésticas, principalmente por conta do mercado de papel, diretamente atingido pela retração econômica. Redirecionou parte das vendas para o exterior e ampliou em 10% as exportações, que passaram de 54% do volume comercializado em 2002 para 59%. Com a ajuda de um aumento de 21% no preço médio dos produtos vendidos internamente, conseguiu ampliar as receitas em 20%, para R$ 2,480 bilhões, e compensar a pressão de custos decorrente do aumento no preço de insumos, mão de obra e energia elétrica. Ampliou a geração operacional de caixa em 19%, para R$ 1 bilhão, e manteve a margem Ebitda no patamar de 40%.

Na Klabin, as chances de contar com as exportações foram menores. Apesar de expandir em 14% o volume exportado, manteve ainda 72% da produção entregue localmente. Encarou uma retração de 12% nas vendas domésticas, mas, no total, contando com as exportações, conseguiu uma receita líquida de R$ 2,4 bilhões, 26% maior que a de 2002. Com um aprimoramento do mix de produção e reduções de custos, ampliou o Ebitda em 22%, para R$ 866 milhões.

DESAFIO DE NÃO SE RENDER À CRISE – As exportações também foram a válvula de escape para as empre sas de alimentos, mais especificamente os frigoríficos. Com a diferença de que, neste caso, o que eles encontraram lá fora foi um mercado altamente ofertado de carnes e ainda com medidas protecionistas que limitavam seu potencial exportador. A Europa ampliou as alíquotas de importação para carne de frango e a Rússia impôs novas cotas para a carne suína, o que exigiu das empresas algumas medidas para superar a crise. A Sadia ampliou o número de países para os quais exportava e chegou a um total de 92 destinos, reduzindo os impactos das barreiras comerciais. Reforçou o trabalho das equipes no exterior, ampliou as vendas de industrializados e cortes especiais (produtos de maior valor agregado) e contou com a ajuda da recuperação dos preços praticados no mercado internacional.

As vendas externas fecharam o ano com mais um recorde, de R$ 2,7 bilhões, 36% superiores às de 2002. Compensaram a queda de 6,4% nos volumes de vendas no mercado interno e a pressão de custos desencadeada pelo aumento no preço do milho, matériaprima que serve à alimentação dos frangos. A maior participação dos industrializados na linha de produtos e os reajustes de preços promovidos ao longo do ano também contribuíram para reduzir os impactos da desaceleração do consumo. O resultado foi um crescimento de 40,6% no Ebitda, para R$ R$ 648,7 milhões, e um aumento da margem Ebitda, de 10,9% para 12,3%.

Luiz Gonzaga Murat Junior, diretor de finanças e relações com investidores da Sadia, lembra que os números da companhia em 2004 só foram possíveis graças à implementação de uma revisão estrutural iniciada em 1997. À época, a administração da companhia direcionou o processo produtivo para os itens de maior valor agregado e para o incremento das exportações. Após 1998, quando assumiu elevada dívida para comprar a Granja Rezende, a prioridade passou a ser a geração de caixa para redução do endividamento. De lá para cá, foram lançados em média 62 produtos por ano, os industrializados atingiram 69% das vendas – amparados por uma nova logística de distribuição voltada para fora dos grandes centros – e as exportações pularam de 18% das vendas, em 1998, para 45% em 2003.

TARIFAS REGULADAS – Os reajustes também tiveram papel importante na redução dos efeitos da crise para as empresas de serviços públicos e tarifas reguladas. A telefonia fixa não mostrou espaço para expansão e sobraram poucas oportunidades de crescimento para as companhias que não tinham parte de suas receitas provenientes dos serviços de telefonia móvel, longa distância ou comunicação de dados.

A Telemar atribuiu o aumento nas receitas com pulsos aos reajustes de 9,7%, em junho de 2002, e de 17,2%, em junho de 2003. Nas ligações de telefones fixos para móveis, registrou queda de 16,3% no tráfego, compensada por um aumento médio de tarifas, de 24,8%. Na longa distância nacional, a competição teve efeitos diretos sobre os resultados das operadoras. A Telemar ampliou em 43,4% as receitas no segmento, enquanto a Embratel saiu de R$ 4,4 bilhões para R$ 4,1 bilhões no ano passado. Nos dois casos, os balanços de 2003 reverteram os prejuízos astronômicos do ano anterior. A Telemar saiu de um prejuízo líquido de R$ 416 milhões para lucro de R$ 213 milhões e a Embratel fechou no azul com R$ 224 milhões em 2003, contra um prejuízo de R$ 626 milhões em 2002.

A Embratel sofreu redução de 4,4% em sua receita líquida, mas compensou com uma expressiva queda nas provisões para inadimplentes, de 43,7%, nas despesas operacionais e nos custos de interconexão. A Telemar foi beneficiada pelo crescimento da Oi, que contabilizou o ingresso de 2,5 milhões de clientes, e pelo aumento das receitas em longa distância e comunicação de dados. A Telefônica aumentou em 7,1% sua geração de caixa, para R$ 5,3 bilhões, basicamente em função dos reajustes atrelados ao IPCA, da entrada no segmento de ligações longa distância a partir de meados de 2002 e do crescimento do serviço de internet rápida.

BENS DE CONSUMO – Para os que não tinham reajuste de preços garantido em contrato e estavam diretamente expostos à renda comprimida do consumidor no mercado interno, a alternativa foi mesmo inovar, especialmente na prateleira de produtos. A fabricante de calçados Alpargatas encarou o desaquecimento das vendas internas no seu segmento e tratou de adicionar valor ao mix de produtos lançando 175 novos modelos de calçados. Também aumentou os controles sobre os gastos e investiu em produtividade no segundo semestre, o que lhe permitiu fechar 2003 com receitas 12,7% maiores. Beneficiada por um efeito contábil positivo da valorização de 18,2% do real sobre os encargos da dívida em moeda estrangeira, saiu de um lucro de R$ 47,8 milhões para R$ 82 milhões.

O Pão de Açúcar também lançou novos produtos para enfrentar as adversidades da economia. Aumentou a oferta de marcas próprias e artigos de primeiro preço, mais adequados à expectativa de consumo de itens básicos e de menor valor agregado. A estratégia mostrou resultado e a empresa ampliou em 7,6% a venda de produtos alimentícios no conceito “mesmas lojas”. Com uma estrutura mais enxuta, ganhou produtividade também para enfrentar a estagnação das vendas dos itens não alimentícios, como os eletroeletrônicos. “Podemos dizer que existe uma obsessão da companhia por produtividade e ganhos de escala com redução de custos fixos. Há alguns anos estamos perseguindo esses objetivos”, afirma Fernando Tracanella, diretor de relações com investidores do Pão de Açúcar.

Segundo o executivo, os primeiros meses de 2004 são sazonalmente mais fracos e ainda não demonstraram os efeitos da recuperação esperada. “Mas acreditamos numa retomada gradual do consumo este ano com a recuperação do poder aquisitivo”, afirma. É com essa retomada que as companhias estão contando para respirar um pouco mais aliviadas em 2004.


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