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Agora falta educação
Pessoas físicas são estimuladas a entrar no mercado financeiro, mas ainda falta um programa do governo federal voltado a cuidar da formação financeira

, Agora falta educação, Capital Aberto

A poupança dos brasileiros, embora ainda modesta, está na mira de projetos do governo e da iniciativa privada. Nas pranchetas de empreendimentos populares ou de infra-estrutura, é cada vez mais freqüente um modelo de financiamento baseado em fundos constituídos para captação em larga escala junto a investidores pessoas físicas. Lançado em junho, o Programa de Incentivo à Implementação de Projetos Sociais (Pips) prevê o lançamento de cotas de fundos imobiliários e de direitos creditórios para viabilização de empreendimentos populares, idéia que une a necessidade de financiamento do setor público com o interesse dos cidadãos em aplicar suas economias em novas modalidades de investimentos.

Fundos imobiliários têm sido bem sucedidos na tarefa de captar investidores médios. O melhor exemplo é o fundo que financiou o edifício comercial Almirante Barroso, no Rio de Janeiro. Atraiu um total de 5,2 mil poupadores lançando cotas a R$ 1 mil cada. Fundos de direitos creditórios estão sendo criados com o intuito de seguir a mesma trilha, embora ainda encontrem um obstáculo legal que limita a distribuição das cotas a investidores qualificados.

A campanha de popularização da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) também vem atraindo investidores. Clubes de investimentos , Agora falta educação, Capital Abertocrescem a uma velocidade surpreendente e centrais sindicais analisam projetos como o que prevê a aplicação das Participações nos Lucros e Resultados (PLRs) em ações ou fundos de investimentos (ver matéria à página16). Investidores pessoas físicas representavam em setembro 26,5% do volume negociado na bolsa, contra 20,5% no mesmo mês de 2002 e 10% em média em 1997, último ano de euforia no mercado. Em 12 meses de campanha, pelo menos 160 novos clubes de investimentos foram formados.

A leva de investidores de primeira viagem trazida a convite de agentes públicos e privados contou também com o estímulo de novidades tecnológicas como o Home Broker – sistema de negociação de ações via internet que, desde o final de 2000, ampliou de 0,91% para 2,9% sua participação no volume de negócios da bolsa – e o Tesouro Direto, sistema de negociações de títulos públicos via internet implementado pelo governo federal em janeiro do ano passado. Este último já atende um total de 18 mil clientes (5 mil deles conseguidos em setembro e outubro), sete vezes mais que em seu primeiro mês de operação.

Convite a investidores leigos, aliás, não têm faltado. Entre os dias 16 e 18 de outubro foi realizada em São Paulo a primeira feira de exposições voltada a ensinar ao público em geral como investir. Num contexto ainda inusitado para os padrões brasileiros, o objetivo da feira não era atrair o público com dinheiro para gastar no ato, mas vender conceitos de produtos financeiros a quem estivesse disposto a poupar.

INVESTIDOR CARECE DE FORMAÇÃO – Em meio aos sinais de que o esforço de formação de poupança no Brasil começa a mostrar algum resultado, uma deficiência histórica, até então encoberta por uma cultura insipiente de investimento, começa a chamar atenção. No que diz respeito às precariedades amplamente conhecidas do sistema educacional no país, pouco muda em relação à educação em finanças, mesmo nas escolas privadas de primeira linha. Ao contrário do que ocorre em países mais desenvolvidos, no Brasil os cidadãos não são educados a poupar. Faltam-lhes conhecimentos mínimos de como administrar o seu dinheiro e de como investir para realizar projetos de vida.

“A educação no Brasil é, no geral, um verdadeiro desastre, e muito pouco se faz pela formação financeira em particular”, afirma Cássia D´Aquino, professora e consultora especializada em educação financeira. Ela afirma que as crianças devem aprender a lidar com o dinheiro desde a infância, em casa e na escola, para que possam fazer escolhas de como aplicar seus recursos com consciência, conhecer os benefícios de poupar e se preparar para as frustrações de investimentos mal sucedidos.

Na comparação com países desenvolvidos, notase que são grandes as diferenças de atuação dos governos no processo de educação em finanças. Nos Estados Unidos e na Inglaterra, as comissões de valores mobiliários assumem um papel de destaque na educação dos investidores e futuros investidores e são acompanhadas de uma série de outras entidades governamentais nesta tarefa. São inúmeros os materiais didáticos disponíveis na internet para orientação de pais e professores na educação financeira.

No site da Securities and Exchange Commission (SEC), a CVM norte-americana, há um extenso currículo escolar de cinco capítulos sugerido para inclusão no ensino regulamentar, além de uma série de publicações disponíveis gratuitamente. Além da SEC, pelo menos outras sete instâncias federais estão envolvidas com a educação em finanças, entre elas o Federal Reserve (Banco Central), o Departamento do Tesouro, o Centro de Informações ao Consumidor e a Comissão Federal de Comércio. Dezenas de entidades de classe e organismos sem fins lucrativos também dedicam-se a aperfeiçoar metodologias para educação em finanças, além de promover cursos e palestras.

A Inglaterra está um passo à frente e já incluiu a literatura financeira no currículo básico do ensino fundamental. O FSA – Financial Services Authority – órgão regulador equivalente à SEC e à CVM – também possui um site preparado para atender educadores e investidores. Dispõe de material para auxiliar os professores e de um vasto banco de dados atualizado com informações sobre os mais variados produtos financeiros em oferta no mercado, oferecido para que o “consumidor” tenha a chance de compará-los.

No Brasil, os trabalhos educativos da CVM estão mais voltados à proteção do investidor do que à sua formação. No âmbito do Programa de Orientação e Defesa do Investidor (Prodin), lançado em 1998, há uma única cartilha, dirigida principalmente a adultos, com informações didáticas sobre como gastar e poupar.

Não há conteúdo diretamente voltado à formação em finanças, seja uma cartilha de orientações metodológicas para educadores ou mesmo materiais dirigidos ao aprendizado de crianças e adolescentes. Os trabalhos educativos da CVM estão centrados em palestras a universitários, cujo tema é a comissão e o mercado de valores mobiliários. Desde o início do Prodin, a autarquia realizou um total de 86 visitas a universidades em todo o Brasil.

Segundo Marcelo Sampaio, a CVM ainda estuda a possibilidade de expandir o programa para as escolas. “Sabemos que seria ótimo se pudéssemos pensar nesses programas a partir do ensino médio”, afirma. Da mesma forma, a atuação do Banco Central do Brasil limita-se a palestras em universidades sobre política monetária e macroeconomia.

INICIATIVAS DO SETOR PRIVADO – Embora, ao que indica a tendência internacional, o Estado seja o veículo mais isento e adequado para ações voltadas à educação em finanças, no Brasil as iniciativas mais concretas em favor da formação em finanças têm partido do setor privado. À luz da campanha de popularização em andamento, a Bovespa modernizou o seu programa educacional existente desde 1989 e passou a conduzi-lo em linguagem mais moderna e com ênfase nos ensinos fundamental, médio e universitário.

Em um CD distribuído a todas as escolas da rede pública estadual, a bolsa apresentou dois filmes de animação desenvolvidos pela ONG Cidade Escola Aprendiz. Um deles conta a história de um garoto que, entusiasmado com a idéia de fabricar seu skate, decide criar sua própria empresa e sai à procura de investidores dispostos a ajudá-lo a financiar o projeto. “Mostramos em linguagem simples e adaptada a crianças a lógica do investimento e da captação de recursos”, conta Luis Antonio Abdal, assessor de marketing e comunicação da bolsa. Para estimular os professores a usar o CD, a bolsa criou um concurso para premiação dos melhores trabalhos sobre a história do garoto empreendedor. Mais de 1,7 mil alunos se inscreveram e os premiados receberão a recompensa em dinheiro no início de dezembro.

Outra iniciativa de agentes privados foi a criação do Instituto Nacional de Investidores (INI), uma entidade patrocinada por cerca de 20 empresas e associações e constituída com o intuito de semear a cultura de investimento em ações no país. O projeto é desenvolver um programa educacional para esclarecer o público sobre o funcionamento do mercado de capitais, além de orientar sobre a importância das aplicações de longo prazo. A previsão, segundo os organizadores do instituto, é começar os trabalhos no primeiro trimestre de 2004.

MOVIMENTO INTERNACIONAL – Embora muito mais avançada em países mais desenvolvidos, a educação em finanças tem sido objeto de reflexões e novos projetos em todo o mundo. Relatório da Iosco – organismo que congrega as principais comissões de valores mobiliários do mundo –, divulgado em outubro de 2002, aponta que os programas de educação financeira têm se fortalecido nos últimos anos. Em pesquisa com 33 comissões, 27 delas informaram que possuem programas específicos nessa linha e dez responderam que haviam iniciado o seu há menos de três anos. O trabalho mostrou também que o total de programas educacionais promovidos por reguladores mais que dobrou em três anos.

Em outubro deste ano, a autoridade inglesa, o FSA, constituiu um grupo de trabalho formado por integrantes do governo, empresas, associações de classe, consumidores e profissionais de mídia para desenvolver e implementar uma nova estratégia nacional de capacitação em finanças. A idéia é inaugurar uma segunda fase para os trabalhos de educação iniciados em 1998 e que resultaram, entre outras medidas, na inclusão da educação em finanças no currículo escolar do Reino Unido.

Segundo o FSA, a formação do grupo de trabalho deve-se à percepção de que falta uma estratégia na região para melhorar a capacitação em finanças e de que o FSA deve ter um papel de liderança na condução desta questão. A estratégia a ser elaborada pelo grupo será apresentada em março de 2004.

Nos Estados Unidos, também houve esforços para aprimorar a educação em finanças. Em maio de 2002, foi criado o Office of Financial Education (OFE), uma secretaria subordinada ao Departamento do Tesouro e dedicada a assegurar aos americanos o acesso a programas de educação em finanças que lhes proporcione conhecimento suficiente para fazer escolhas financeiras com segurança. Em outubro do mesmo ano, a secretaria apresentou um relatório encorajando as autoridades envolvidas com educação a incluir o aprendizado em finanças no currículo escolar como parte da cadeira de matemática. Seus autores concluíram que o primeiro passo para dar às pessoas a capacidade de entender suas próprias finanças é educa-las desde cedo, nas escolas. Em junho último, a secretaria finalizou um estudo para identificação dos critérios que fazem um programa de educação em finanças bem sucedido e criou um certificado de reconhecimento para os trabalhos que se adequarem a esses padrões.


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