A festa continua ano que vem?
Comparações com dados históricos apontam que ainda há espaço para nova alta, mas investidores estão cautelosos e preferem moderar as apostas

ed04_p016-021_pag_3_img_001Depois de um ano repleto de boas surpresas no mercado de ações, é chegada a hora de arriscar previsões para o que virá em 2004. Com uma alta de 60% no ano e recorde histórico em número de pontos, a bolsa é candidata à variável mais nebulosa entre as dezenas de indicadores que preenchem as planilhas de projeções dos economistas para o próximo ano. A todos interessa apenas saber de antemão a resposta certa para a mesma pergunta: até onde vai a alta do Ibovespa?

Estudo realizado pela Economática a pedido da Capital Aberto, preparado a partir de uma série de indicadores de desempenho da bolsa e das empresas listadas, indica que existem motivos para acreditar que a bolsa poderá subir ainda mais. Encerrado em 4 de novembro, o trabalho considera a alta da bolsa até o patamar de 18,5 mil pontos, ainda abaixo do recorde de 19.248 pontos obtido no final do mês passado.

Em termos nominais, a bolsa está no mesmo patamar de março de 2000, quando chegou a 18,9 mil pontos. Também está bastante à frente dos melhores momentos de 1997, pouco antes de deflagrados a crise asiática e o efeito dominó que derrubou os mercados de ações globais quando ultrapassada a barreira dos 13,5 mil pontos.

Feitos os ajustes pela inflação ocorrida no período, contudo, a análise muda completamente de figura. A pontuação atual, superior a 18 mil pontos, é bastante inferior à de março de 2000 e à do auge de 1997. Corrigida pela inflação, a pontuação do Ibovespa em março de 2000 representa hoje o equivalente a mais de 30 mil pontos. O pico em 1997 corresponde a 28 mil pontos, 45% acima dos níveis atuais.ed04_p016-021_pag_4_img_001

A análise também muda quando o ponto de vista é o do investidor estrangeiro. Em dólares, a bolsa está atualmente na casa dos 6 mil pontos, o equivalente a 50% do máximo histórico obtido antes da crise asiática e da desvalorização cambial que viria um ano e meio depois. Ainda em dólar, o pico de março de 2000 não ultrapassa a casa dos 11 mil pontos, 70% acima do patamar atual.

Os múltiplos das principais companhias listadas também indicam que há espaço para a alta dos preços das ações se considerado que o cenário macroeconômico de hoje sustenta níveis de expectativas ao menos semelhantes às dos bons tempos de 1997 e 2000.

Ao avaliar o indicador que relaciona o Firm Value da empresa (valor de mercado dívida financeira – caixa) ao seu Ebit (lucro antes dos juros e impostos), a Economática conclui que, apesar do crescimento progressivo dos resultados nos últimos anos, o valor de mercado das empresas hoje está bem aquém do verificado em 1997. Os cálculos realizados com base em uma amostra das 20 maiores companhias (em valor de mercado) apontam que o Firm Value representa 7,8 vezes o Ebit dessas empresas, contra 10,3 vezes em 1997.

A Petrobras, por exemplo, valia 30 vezes o seu fluxo de caixa operacional em 1997. Hoje esse indicador não passa de três vezes, dado o forte incremento no resultado não ter sido acompanhed04_p016-021_pag_5_img_002ado, nem de perto, por um crescimento proporcional das cotações em bolsa. Embora inferior ao que se viu em outros anos de euforia, a relação Firm Value/Ebit atual das 20 maiores empresas brasileiras equivale à de mercados emergentes como o mexicano. Mas fica longe da observada para as empresas norte-americanas, de 14,2 vezes.

Para Fenando Exel, presidente da Economática, as comparações com o desempenho da bolsa em outros momentos de euforia leva a crer que é provável um crescimento das cotações além do recorde nominal de 19 mil pontos obtido em novembro. Exel ressalva, contudo, que são poucas as chances de a bolsa voltar aos níveis de 1997, dado que o apetite dos investidores estrangeiros por ações de companhias brasileiras hoje não pode ser comparado ao que se viu naquela época. “Foi uma fase completamente atípica. Basta lembrarmos que, por alguns dias, as ações da Telebrás chegaram a registrar os maiores volumes de negociação da Bolsa de Nova York”, recorda.

O CETICISMO PREDOMINA – Ainda que o histórico da bolsa indique a possibilidade de uma recuperação bem mais acentuada que a observada até agora, os investidores têm preferido desconfiar. Escaldados por experiências em que não faltaram crises externas e internas, eles preferem acreditar que a alta recente da bolsa já deu o que tinha que dar nos últimos meses. Para o diretor da Petros Ricardo Malavazi, a bolsa ainda tem espaço para crescer em 2004, mas nada comparado ao que se viu este ano “Pegar essa alta de 60% foi ótimo, mas acho difícil que se repita no ano que vem.”

O advogado Marcelo Freitas, que há dois anos decidiu investir no mercado acionário por meio do homebroker (sistema de negociação de ações via internet), afirma que o sentimento geral entre os investidores plugados na rede é de otimismo com a macroeconomia. Pouca gente acredita, porém, que o índice possa repetir o desempenho desse ano e a percepção predominante é de que o momento é de realização. “O desempenho do índice não deve ser tão bom, mas acredito que existe espaço para algumas ações”, avalia.

A analista Mônica Araújo, da BES Securities, projeta o Ibovespa a 21.400 pontos em abril de 2004, uma expectativa de valorização pouco superior a 10% na data do fechamento desta edição.

Análise gráfica indica início das ondas de baixa
(ver gráfico: Onda de baixa à vista)

O atual ciclo de alta do mercado de ações começou, quem diria, em outubro de 2001, logo após o atentado terrorista de 11 de setembro às duas torres gêmeas nos Estados Unidos. É o que afirma o analista gráfico José Faria, da consultoria Lopes Filho. Sua estimativa é de que a escalada do Ibovespa chegará a 20 mil pontos, antes de um movimento inevitável de queda.

Faria é adepto do chamado grafismo, um método de avaliação dos investimentos em bolsa que utiliza como parâmetros somente as curvas dos gráficos de desempenho. De acordo com uma das teorias mais famosas do grafismo, as Ondas de Elliott, um ciclo de alta é formado por cinco ondas de alta, três de baixa e outras cinco de alta. Quando o ciclo é de baixa, o movimento é inverso: cinco de baixa, três de alta e cinco de baixa. Nesse momento, segundo a avaliação de Faria, a bolsa brasileira está na última onda do primeiro estágio de alta. Pronta para o ajuste das três ondas de queda.

A tendência de baixa aparece também em outros indicadores gráficos. O analista explica que o movimento de alta do mercado obedece algumas regras. Primeiro, sobem os papéis de 2ª e 3ª linha. Segundo Faria, o motivo dessa alta são os insiders (investidores com informações privilegiadas), que começam comprando os papéis menos chamativos para não despertar a atenção dos outros investidores, que interromperiam a venda. No segundo momento, todos os papéis sobem e, no terceiro, apenas os de maior liquidez, para inflar o índice e atrair a atenção dos compradores. Novembro foi marcado pela valorização de elétricas, teles e siderúrgicas, enquanto Souza Cruz, Fosfértil e Gerdau começaram a cair.

Na opinião do analista gráfico, embora ainda exista alguma chance de valorização, entrar no mercado nesse momento é muito arriscado. “Dessa vez, as cinco ondas de alta duraram quase dois anos. As três ondas de queda podem durar três meses ou três anos. Não dá para prever a intensidade e a duração desses ajustes”, diz.

De acordo com a análise gráfica da Lopes Filho, a intensidade da queda depende do ponto em que a valorização será interrompida. Se o mercado parar em 19 mil pontos, o ajuste tende a levar o Ibovespa até 15 mil, 16 mil pontos. “Estimar a intensidade da queda ou da alta é a parte mais difícil. Quanto mais rápido o mercado sobe, pior a queda. Em agosto, o Ibovespa estava em 13 mil pontos. Subiu rápido demais”, observa.

Se o intuito é uma análise objetiva dos gráficos, contudo, outras interpretações são possíveis. Dados calculados pela Economática mostram que os anos de 2000, 2001 e 2002 fizeram a primeira tríade de quedas na Bovespa desde 1980 (1978,1979 e 1980). Naquela época, veio em seguida um ano de pequena alta (10%), seguido de um ano de baixa (17%) e três anos consecutivos de forte alta (120% em 1983, 67% em 1984 e 52% em 1985).

Os anos de 2000 a 2002 fizeram também a primeira série de três quedas sucessivas do índice Dow Jones na Bolsa de Nova York. Antes disso, a última baixa de igual duração ocorrera em 1939, 1940 e 1941. Na seqüência (1942-1945), o indicador norte-americano experimentou quatro anos de altas sucessivas.

Segundo ela, o fator mais importante para essa nova onda de valorização é a revisão esperada para os ratings de Brasil. “Mas o mercado dificilmente escapará de uma realização no curto prazo”, afirma.

AVANÇO DOS ESTRANGEIROS E DOS INSTITUCIONAIS – As projeções para o comportamento da bolsa têm como elemento fundamental o interesse de investidores estrangeiros nos papéis brasileiros. Para Marcelo Freitas, o aed04_p016-021_pag_5_img_001dvogado homebroker, boas notícias macroeconômicas ainda farão com que mais investidores cheguem ao mercado acionário brasileiro. Já o gerente da mesa de operações da BES Securities, Marco Melo, avalia que os ativos brasileiros deixaram de ser a pechincha e que agora terão de disputar espaço nas carteiras de igual para igual com outros emergentes.

Dados obtidos no fechamento desta edição apontam que o saldo de investimentos estrangeiros na Bovespa continuava forte em novembro. Até o dia 19, somava R$ 617,4 milhões, ainda acima do patamar de R$ 500 milhões obtido desde junho. Para se ter uma idéia, a marca de R$ 500 milhões não havia sido registrada em todo o ano 2002 e em nenhum dos primeiros cinco meses de 2003. Outubro passado foi, de longe, o melhor mês em termos de investimento estrangeiro na bolsa: saldo de R$ 1,270 bilhão.

Os estrangeiros mantiveram elevado o nível de negociações na bolsa mas, em relação à participação no total negociado, o destaque foram os investidores institucionais locais. Em meio às recentes baixas nas taxas de juros e à consolidação das perspectivas de retomada do crescimento econômico em 2004, eles ampliaram sua participação no volume total negociado de 28,6% para 32,4%.

“O interesse dos fundos de pensão aumentou, mas o dinheiro que está entrando dos estrangeiros é de curto prazo. Os investimentos de longo prazo ainda não vieram”, afirma Pedro Chermont, gestor da administradora de recursos independente Investidor Profissional. Chermont tirou suas conclusões em loco, após ter visitado mais de 50 fundações nos últimos 40 dias.ed04_p016-021_pag_6_img_001 (1)

Já para o gerente de mesa da BES Marco Melo, o grande potencial do mercado brasileiro está no investidor pessoa física, que vem ampliando progressivamente sua participação nos negócios em bolsa. Eram 20,76% em 2002, passaram a 24,45% entre janeiro e outubro deste ano e, em novembro, até dia 19, já representavam 25,73% do volume total.

A maior participação das pessoas físicas também está refletida no indicador de volume financeiro por transação realizada em bolsa este ano. A quantidade de negócios realizados bateu recorde em 2003, chegando a 568,2 mil negócios/mês, muito acima dos 368,7 mil em janeiro e da média de 150 mil negócios/ mês no ano de 1997. No médio prazo, o aumento na quantidade de negócios influenciou fortemente o volume por transação, que saiu de R$ 191,6 mil em janeiro de 1997 para R$ 38,2 mil em outubro deste ano, já com os valores ajustados por inflação.

APOSTA NO SETOR ELÉTRICO – Em praticamente todas as análises, o setor elétrico aparece como uma das grandes apostas para 2004. As ações sofreram com o racionamento de energia em 2001, que reduziu as receitas, e com o aumento do dólar em 2002, que fez o endividamento das empresas explodir. Agora, apesar da recuperação do mercado, a avaliação é de que o setor é um dos poucos que permanece avaliado bem abaixo de seu preço justo e, apesar do risco que a falta de um marco regulatório definido representa, pode garantir bons ganhos para os investidores.

“Quem procura oportunidade não compra quando está tudo azul. O setor elétrico é uma aposta para o médio e longo prazo”, afirma o diretor da Petros, Ricardo Malavazi. Questionado sobre os benefícios para os fundos de pensão de uma eventual valorização dos papéis das elétricas, respondeu que está preso aos problemas de liquidez desses papéis. “Não tenho como vender nada hoje. A maior participação da Petros é a CPFL, que tem liquidez baixíssima”.

A favor do setor contam a demanda garantida e a necessidade do governo de incentivar investimentos. “O governo já deu sinais de que está preocupado com o investidor. Todas as decisões hoje são próempresa”, afirma Malavazi.

O investidor Marcelo Freitas lembra que as ações da Light, Eletropaulo e Copel perderam mais de 50% do valor. Se o BNDES fizer o acordo com a Eletropaulo e o marco regulatório for favorável aos investimentos no setor, as empresas tendem a recuperar as cotações.

Nesse cenário, o gestor da Investidor Profissional Pedro Chermont acredita que as ações da Eletropaulo podem repetir em 2004 o desempenho que os papéis da Embratel tiveram esse ano. Mas ressalta que a aposta é altamente especulativa.

Chermont não conta o que pretende comprar, mas diz o que ainda não vendeu. Da carteira que montou no decorrer de 2002 e no início desse ano, mantém parte de ações da Itaúsa, Ambev e Marcopolo. Para Chermont, não adianta analisar os setores. “Tem que olhar empresa por empresa. Saímos de um mercado em que estava tudo barato e agora a palavra de ordem é seletividade”, diz.

CENÁRIO OTIMISTA – Quando o assunto é projeção macroeconômica, os cenários para 2004 impressionam de tão radiantes. É o que diz o gerente da área de planejamento do fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil (Previ), Gerardo Santiago, que ouviu mais de uma dezena de bancos para fechar os cenários que suportarão os investimentos do fundo em 2004.

Segundo ele, apesar das ponderações sobre marco regulatório, principalmente no setor elétrico, e alguns riscos externos, todas as instituições apostam em inflação sob controle, taxa de câmbio estável, juros em queda e crescimento econômico.

Para o diretor de investimentos da Petros, Ricardo Malavazi, um dos poucos riscos que assombram 2004 é a possibilidade de aumento dos juros norteamericanos. Mas ressalva que este será um ano de eleição presidencial nos Estados Unidos e que dificilmente o FED tomará tal decisão. “Tirando a ameaça americana, que já está aí há muito tempo, o cenário interno não é preocupante. Será o ano da consolidação”, completa.


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