A chance é agora
Bancos de investimentos, BNDES e empresas trabalham para transformar o mercado de capitais em financiador das obras de infraestrutura do País

, A chance é agora, Capital AbertoOs investidores andam ávidos por boas oportunidades de investimentos. Buscam alternativas ao cenário marcado pelo andar de caranguejo de algumas das principais companhias brasileiras na bolsa e pela atratividade cada vez menor dos títulos públicos. Também sedentos estão os bancos de investimentos, dispostos a compensar a escassez de ofertas de ações com emissões de dívida privada. A menina dos olhos é o setor de infraestrutura — que, pelos cálculos da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústria de Base (Abdib), demandará, no período entre 2011 e 2015, um total de R$ 922 bilhões em investimentos. O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) é o financiador habitual do segmento, mas sabe que não dará conta de prover todos os recursos necessários. O mercado de capitais, por sua vez, tem nessa combinação altamente favorável de fatores uma chance ímpar de se provar capaz de financiar o crescimento do Brasil.

Bancos de investimentos e empreendedores trabalham a todo vapor para estruturar as operações que financiarão as obras de infraestrutura necessárias para a realização da Copa do Mundo de 2014 e da Olimpíada de 2016, além do aparato que sustentará o crescimento da economia local. Em geral, são rodovias, geradoras e distribuidoras de energia, portos e aeroportos — todos candidatos a ser erguidos com o impulso de uma aguardada enxurrada de emissões, em especial de debêntures.

O governo tem se mostrado um aliado. Com a edição da Lei 12.431, em 2011, investidores pessoas físicas e estrangeiros ganharam isenção de Imposto de Renda sobre os lucros auferidos nas chamadas debêntures de projetos — aquelas emitidas por sociedades de propósito específico (SPEs), com prazo de pelo menos quatro anos, para financiar projetos prioritários. Como nem assim as ofertas vingaram, outras medidas foram lançadas. Em 17 de setembro, foi editada a Lei 12.715, que complementa o normativo anterior e traz esclarecimentos importantes para os emissores que já pretendiam captar, mas não o fizeram em razão das dúvidas existentes até então.

Pela nova lei, o universo de potenciais emissores foi ampliado. Além das SPEs, seus controladores e empresas concessionárias podem captar utilizando debêntures. E a destinação dos recursos foi esclarecida. Agora está expresso que é possível quitar dívidas contraídas anteriormente — ou seja, um projeto pode ser financiado pelo sistema bancário inicialmente e, somente depois, serem usadas as debêntures para rolagem da dívida.

Para os investidores dispostos a comprar os títulos, as novidades também são boas. Uma garantia adicional virá da penalização dos emissores que não utilizarem os recursos captados no projeto prometido. A multa prevista é de 20% sobre o valor não aplicado corretamente. “E, caso isso ocorra, não haverá interferência no benefício fiscal do investidor. É uma tranquilidade para quem compra a debênture e para o banco encarregado de fazer a retenção do imposto na fonte”, explica Erik Oioli, sócio do escritório Vaz, Barreto, Shingaki e Oioli Advogados.

Os investidores dispostos a negociar os papéis no mercado secundário foram, da mesma forma, incentivados. A nova lei equiparou, para fins do benefício fiscal, o fluxo de rendimentos das debêntures ao ganho de capital. Isso significa que, em caso de negociação do papel no mercado secundário, o investidor que realizar lucro terá os mesmos benefícios daquele que manteve o título até o vencimento.

Para completar o pacote, o BNDES alterou, no mês passado, as regras que balizam sua participação em emissões de debêntures. O banco de fomento, que até então não compartilhava garantias com outros investidores, poderá dividi-las daqui para frente, desde que o projeto seja na área de infraestrutura e que as debêntures emitidas sigam as mesmas regras do “BNDES debêntures simples”, um produto alinhado às práticas do Novo Mercado de Renda Fixa. No caso de uma rodovia, por exemplo, o BNDES pode reter a arrecadação de uma das praças de pedágio como garantia de recebimento do capital investido. Com o compartilhamento, o banco espera atrair mais investidores para os projetos que financia.

Outra mudança foi a incorporação de uma cláusula de vencimento antecipado cruzado (ou cross-default). Com ela, o BNDES pode declarar o vencimento antecipado de um financiamento caso haja inadimplência nas debêntures, beneficiando todos os investidores daquele papel. A medida promete ser um seletor natural de bons projetos, ampliando o grupo de investidores dispostos a correr os riscos inerentes aos títulos privados de longo prazo.

RESERVA LIMITADA — As concessões têm uma única explicação: o fato de, sozinho, o banco não dar conta da necessidade de investimento. Somente no ano passado, o total de desembolsos do BNDES foi de R$ 55,9 bilhões. A cifra inclui todos os setores beneficiados. Se a previsão da Abdib estiver correta, serão necessários, em média, R$ 184,4 bilhões ao ano, somente para infraestrutura. Ou seja, mesmo que o banco abandonasse todos os outros segmentos, conseguiria prover apenas 30% do capital necessário. “É preciso que a iniciativa privada participe e, em especial, o mercado de capitais”, afirma Otavio Vianna, chefe do departamento de mercado de capitais do BNDES. A boa notícia é que a demanda está em sintonia com o movimento dos investidores. “O aplicador privado, que ficava no DI, tende a buscar mais risco e novas alternativas de investimento”, completa Marcio Guedes, diretor da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima).

As debêntures incentivadas fogem ao padrão a que o investidor está habituado

Bruno Moraes, analista sênior da Rio Bravo, estima que, para fechar a conta, o mercado de capitais poderá financiar outros 30% das obras de infraestrutura, e o restante seria aportado pelos proprietários dos projetos. O fundo de participações RioBravo Energia é um dos que se prepara para a nova onda de investimentos. Os contatos com bancos estão em estágio avançado, principalmente nos projetos de energia eólica, cujo marco regulatório está consolidado. Ainda assim, as ofertas de debêntures incentivadas pela nova lei demorarão alguns meses para serem lançadas. O formato das operações foge ao padrão a que o investidor está habituado. E essa é uma das principais barreiras a serem superadas pelos participantes do mercado de capitais.

APARANDO AS ARESTAS — Os estruturadores sabem que os investidores estão atraídos pela isenção fiscal e, sobretudo, pela possibilidade de superar a rentabilidade de papéis como os títulos do Tesouro Nacional. No entanto, não está claro qual é o preço máximo que estão dispostos a pagar. Na equação, entram ingredientes tradicionais do mercado de dívida privada, como a baixa liquidez do mercado secundário, e quesitos adicionais, como o prazo mais longo das emissões e riscos como o da construção dos empreendimentos.

A prova de que o equilíbrio da balança é mais complicado do que se imaginava ficou evidente quando a Rodovias do Tietê, primeira a anunciar uma emissão nos moldes da Lei 12.431, cancelou, em maio, a operação. O motivo foi a falta de demanda dos investidores. O mercado sentiu a ausência do BNDES como um dos financiadores. Por se tratar da operação de estreia, a falta da diligência de um grande player seria um fator adicional de risco. Na época, a empresa pretendia captar R$ 650 milhões em debêntures, sob a coordenação do Barclays. O projeto não foi engavetado, mas trocou de mãos. Agora, está sob os cuidados do BTG Pactual.

Outras emissões como a da Rodovias do Tietê, sem a participação do BNDES, tendem a aparecer, mas não se espera que sejam a maioria. Acredita-se que o mais comum será combinar recursos do banco de fomento com investimentos privados. Para atrair os aplicadores, os bancos estudam formas de mitigar os riscos. Uma delas é começar as emissões pelos setores com marcos regulatórios consolidados e habituados aos processos de licitação para exploração por agentes privados. Nesse aspecto, largam na frente as concessionárias de rodovia e as geradoras e distribuidoras de energia, tanto elétrica quanto eólica. Na ponta oposta, estão setores como o de concessões de aeroportos, que ainda dá seus primeiros passos rumo à gestão privada; e o de portos, cujo risco adicional vem da dependência de aval de órgãos ambientais.

Para atrair investidores, os bancos planejam ainda reduzir os riscos de construção. O problema é visto como um empecilho para muitos aplicadores, receosos com a possibilidade de os empreendimentos demorarem mais tempo que o previsto para ficarem prontos, afetando a geração futura de caixa, ou de simplesmente não terem verba para a conclusão da obra. “A iniciativa privada está apta a prover essa parte. Os bancos podem prestar uma fiança em favor dos debenturistas ou exigir que o próprio controlador assuma o risco”, esclarece Daniel Vaz, chefe de mercados de capitais e renda fixa do BTG Pactual. Mas existem outras alternativas. “Os bancos também podem assumir o risco da construção financiando o projeto até que a obra acabe e, somente num segundo momento, captar recursos com outros investidores, via mercado”, avalia Rui Gomes Júnior, chefe de project finance do Bradesco BBI.

Há quem enxergue outros percalços. Para a advogada Silvia Bugelli, sócia do escritório Almeida Bugelli e Valença, o fato de os emissores das debêntures serem SPEs focadas no projeto a ser financiado não isola o futuro investidor de alguns problemas. “Uma SPE não está blindada do risco de falência do controlador, assim como também não está isenta de eventuais responsabilidades trabalhistas de outras empresas do grupo”, alerta. Por isso, a advogada aconselha aos interessados em ingressar no mercado de dívida privada uma análise bastante criteriosa não apenas dos riscos do projeto, mas de toda a cadeia envolvida. “É importante verificar, por exemplo, quem são os acionistas relevantes da SPE”, diz. Assim como essa, inúmeras outras dificuldades surgirão. Parece inegável que as debêntures de infraestrutura têm tudo para ser uma experiência altamente profícua para o mercado de capitais brasileiro.


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