Mudanças na Lei de Arbitragem: vale a pena mexer em time que está ganhando?
11/09/2013

A Lei de Arbitragem atualmente em vigor (Lei 9.307/96) teve o grande mérito de conferir ao instituto a necessária segurança jurídica, em especial por força do reconhecimento da vinculação obrigatória da cláusula arbitral e da desnecessidade de homologação judicial da decisão arbitral.

Graças ao empenho da comunidade jurídica e ao fundamental apoio do poder judiciário, a arbitragem se desenvolveu. Hoje, é considerada um mecanismo de solução de conflitos apropriado para um país que possui cerca de 90 milhões de ações judiciais em curso, as quais perduram por vários anos, muitas vezes terminando sem decisão técnica satisfatória.

Os méritos da Lei 9.307, somados à declaração de sua constitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal (2001) e à ratificação, pelo Brasil, da Convenção de Nova Iorque (2002), proporcionaram crescimento e maturação substancial da arbitragem no País. A título de ilustração, seis das principais câmaras de arbitragem do país (CCBC, Camarb, FGV, CAM, Fiesp/Ciesp e AmCham) receberam juntas, em 2008, 92 novos procedimentos arbitrais. Quatro anos depois, esse número aumentou para 163.

De qualquer forma, como em toda norma legislativa, seu constante uso pelos operadores do direito permite verificar a possibilidade de aperfeiçoamentos, a meu ver pontuais e restritos.

Um dos pontos controversos seria obrigar as instituições de arbitragem a eliminar as listas de árbitros. Outro seria vedar a inclusão, em regulamentos de arbitragem, de dispositivo que preveja que ao menos o presidente do tribunal arbitral seja integrante do corpo de árbitros da câmara.

Esse ponto requer algumas ponderações. A primeira delas diz respeito à possível inconstitucionalidade da alteração pretendida, em especial frente ao artigo 5º, inciso XVII, da Constituição Federal, que admite a liberdade associativa para fins lícitos:

“Artigo 5º, XVII – É plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar […]”.

Não havendo dúvidas da licitude de constituir instituição para prestar serviços de administração de procedimentos arbitrais, a pretendida limitação da liberdade não poderia ser vista como afronta à garantia constitucional.

Vale lembrar ainda que a arbitragem decorre, precipuamente, da livre vontade das partes. A nova lei deve preservar tanto quanto possível a liberdade delas, devendo evitar restrições que não se façam fundamentais.

No caso específico da Câmara de Arbitragem do Mercado (CAM), instituída originalmente pela BM&FBovespa como instrumento de governança corporativa para as companhias dispostas a oferecer a seus acionistas foro adequado e especializado para a solução de litígios, a liberdade das partes de escolher as regras aplicáveis no procedimento arbitral não foi contestada em decorrência da adesão obrigatória.

No processo de revisão do seu regulamento adotado em 2011, depois de quase dois anos de audiências prévias, a BM&FBovespa não recebeu nenhuma crítica quanto à existência de lista de árbitros, ou à necessidade de o presidente do tribunal arbitral ser necessariamente integrante de seu corpo de árbitros, norma unânime e livremente aprovada.

Não há evidência de que, pela previsão de uma lista de árbitros, o resultado de uma arbitragem tenha sido pior do que seria.

A CAM, assim como outras câmaras, tem competência primariamente especializada. Nesse sentido, é absolutamente pertinente a preocupação institucional de que o presidente do tribunal arbitral — a quem cabe primariamente aplicar as regras do regulamento e conduzir o processo — seja integrante de seu corpo de árbitros, composto de membros também vinculados a essa especialidade.

A confiabilidade das decisões depende, acima de tudo, de que os árbitros sejam versados na matéria. Impedir as câmaras de indicar quem, na visão dos órgãos institucionais, melhor poderia solucionar as disputas, não faz sentido. Impedir que a qualidade da arbitragem, pela qual todas as câmaras de arbitragem têm o dever institucional de zelar, seja preservada (com a escolha do presidente do tribunal a partir de uma lista qualificada previamente) é injustificável.

A nova lei não deve se imiscuir nas regras e procedimentos das câmaras de arbitragem, retirando das partes a autonomia de vontade, que é a pedra angular da própria escolha da arbitragem como mecanismo de solução de conflitos.

Devemos resistir à tentação de fazer modificações que possam desnaturar a Lei 9.307, que vem funcionando a contento. Como nos lembram os ensinamentos futebolísticos, em time que está ganhando não se mexe.


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