Valuation enfrenta barreira imposta pela incerteza
Especialistas discutem avaliação de empresas em cenário de pandemia e alta da bolsa
Valuation enfrenta barreira imposta pela covid-19

Imagem: Freepik

Quanto vale uma empresa? Encontrar um preço justo para uma companhia ou ativo é uma tarefa complexa, para a qual existem ferramentas específicas e variadas metodologias de avaliação. Esse processo é o valuation, cujos objetivos são estimar o preço justo da companhia (consequentemente, de suas ações) e projetar recomendações de compra ou venda dos papéis. As técnicas de valuation recorrem a projeções, o que o deixa muito suscetível a situações atípicas, como é o caso da pandemia de covid-19.

A crise causada pelo novo coronavírus obrigou empresas a paralisar suas operações e a rever modelos de negócio; jogou o mercado de capitais em um cenário de dúvidas inéditas que embaralhou as avaliações de analistas e gestores. Afinal, como precificar uma companhia em meio a uma situação tão adversa? O contexto ficou tão confuso que gerou uma recuperação por poucos esperada depois do primeiro baque: o Ibovespa subiu 61% entre março e julho de 2020, diminuindo as perdas para o ano de 45% para 11%. Em cinco meses de pandemia, o índice reconquistou a marca dos 100 mil pontos e a bolsa voltou a receber ofertas públicas de ações, incluindo quatro novas ofertas iniciais (IPOs).

Para entender como investidores e analistas estão lidando com esse cenário, a CAPITAL ABERTO convidou Alan Gandelman, CEO da Planner Corretora, e Marcelo Mesquita, sócio e gerente de portfólio da gestora de recursos Leblon Equities, para um encontro na Conexão Capital. Na avaliação deles, a maior responsável pela alta na bolsa é a baixa na taxa de juros, que já vinha em trajetória de queda antes da crise e desde então tem renovado continuamente sua mínima histórica — hoje a Selic está em 2% ao ano.

“A bolsa parece descolada da economia, mas na verdade é a Selic em baixa que faz o mercado crescer. O Ibovespa, inclusive, só não está subindo ainda mais porque existe uma barreira de previsibilidade. A pandemia não nos permite avaliar o que vai acontecer com o faturamento das empresas em um ou dois anos”, afirmou Mesquita. Gandelmann concordou, destacando que o cenário deve continuar favorável, “a não ser que experimentemos outro movimento atípico, como foi o próprio coronavírus em março deste ano”. Confira a seguir os destaques do debate, que também pode ser assistido na íntegra neste link.

Desafios para o valuation

Quais são os principais desafios para o valuation nesse cenário de pandemia? O que mudou na forma como vocês avaliam as empresas e quais desafios devem permanecer?

Marcelo Mesquita: É difícil fazer projeções de valuation a curto prazo, para os próximos trimestres, porque os múltiplos de mercado [comparação entre o preço de um ativo e suas variáveis operacionais, como lucros, dividendos, entre outros] que estávamos avaliando antes da pandemia foram jogados no lixo. Esse não é o único fator que impacta o valuation, mas é uma base importante que está completamente contaminada pela pandemia. É difícil estabelecer o valor real dos negócios quando algumas companhias viveram situações extremas, deixando de faturar por meses. Ainda existem muitas incertezas em relação à abertura da economia, a uma possível vacina, às alterações culturais que virão etc. Já a médio e longo prazos, é possível dizer que as empresas vão retomar as estratégias e projetos que eram tocados antes da pandemia. As mais capitalizadas, inclusive, vão sair fortalecidas porque as concorrentes estarão frágeis ou quebradas após a crise.

Alan Gandelmann: Os resultados das companhias obviamente são afetados pela pandemia, mas os parâmetros para valuation continuam os mesmos. Mas a forma de interpretar os dados mudou, principalmente considerando que agora existe um novo público olhando para esses resultados, que são os investidores individuais. O investidor pessoa física não está totalmente apegado à questão de resultados; o que o leva até a bolsa é principalmente uma nova oportunidade de investimentos, e não um objetivo específico de investir em determinados negócios.

Impacto dos investidores pessoa física

A maior parte da alta da bolsa está ancorada no mercado local, que conta cada vez mais com a participação de investidores individuais. Como isso impacta a precificação de ativos? Vocês estão considerando esse fator ao avaliar as empresas?

Gandelmann: Tenho quase 30 anos de mercado e é a primeira que eu vejo no mercado uma presença forte do investidor pessoa física, chegando a influenciar precificações. Como as pessoas físicas entram por diversos canais — fundos, corretoras, individualmente — é mais difícil de fato mensurar esse impacto. Mas é possível perceber essa mudança no cotidiano. Conhecidos que antes não se interessavam pelo mercado agora pedem conselhos para investir em bolsa. É um movimento bastante visível.

Mesquita: É muito positivo observar o estímulo à cultura de empresários no País, de indivíduos que investem em negócios e não optam apenas por financiar o governo. É uma situação positiva a longo prazo para o Brasil. Ainda assim, não percebo nenhuma diferença no dia a dia do meu trabalho. Como gestor, fico atento aos fundamentos das empresas, mas não me preocupo com quem são os demais sócios nos negócios em que eu invisto.

Possibilidade de bolha na bolsa

Considerando que estamos ainda em um cenário de muita instabilidade, vocês acreditam que os preços das ações em bolsa possam estar inflados ou distorcidos? O que explica o descompasso do mercado de capitais com o resto da economia?

Gandelmann: Uma eventual precificação inflada é algo a ser estudado pontualmente. É errado dizer que existe uma bolha hoje na bolsa, e principalmente alegar que isso é causado pela entrada da pessoa física. Eu entendo que, ao contrário, vemos hoje uma situação extremamente interessante no nosso mercado que é a criação de uma pequena Nasdaq, reunindo companhias que funcionam muito bem no online, como Lojas Americanas, Via Varejo, Magazine Luiza. O preço dessas companhias está alto porque avalia-se que, neste momento, elas entregam vantagens de digitalização e logística — é o que explica as ações em suas máximas históricas.

Mesquita: Com a baixa na taxa de juros e as reformas previstas, é natural que cada vez mais capital seja direcionado para a bolsa. Só então teremos um verdadeiro mercado de capitais; hoje temos poucas empresas listadas e isso por si só justifica os altos preços. É provável que nos próximos anos o mercado observe uma série de novas listagens na bolsa, e a entrada de mais empresas será o principal freio para que a bolsa não se valorize além do limite, formando uma bolha.


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