Com os juros básicos no menor patamar histórico, o terreno não poderia estar mais fértil para ativos de risco, aqueles que fogem da receita tradicional. Sem poder contar com os quase garantidos ganhos da época da Selic de dois dígitos, os investidores precisaram se mexer. Ao longo dos últimos 12 meses foi perceptível a migração da renda fixa rumo à renda variável. E, no caso dos gestores de fortunas, a opção tem sido por uma rota ainda mais diferente: os potenciais retornos dos investimentos no exterior e dos ativos ilíquidos.
“Quando visitávamos family offices tempos atrás, encontrávamos portfólios com quase 100% em renda fixa. Agora os clientes desse segmento, assim como boa parte dos investidores no Brasil, estão muito mais abertos à tomada de risco”, observa Tiago Reis, sócio-fundador da Set Investimentos e fundador da Suno Research. “Alguns até estão destinando uma parcela, ainda que pequena, para projetos antes inimagináveis, sem liquidez, como venture capital e private equity”, completa.
Maior tolerância a riscos
A escalada da participação das pessoas físicas na bolsa brasileira — segundo a B3, 2020 terminou com 3,2 milhões de pessoas físicas cadastradas, o dobro do ano anterior — evidenciou o aumento da tolerância a riscos em nome de retornos maiores, movimento que foi ainda mais intenso entre os clientes do wealth management. A própria natureza desses investidores, muitos com experiências corporativas e conhecimento sobre a dinâmica da renda variável, contribuiu para a tomada de mais riscos. Não por acaso, segundo Reis, esse grupo teve participação importante nas ofertas públicas iniciais de ações (IPOs) de 2020.
No wealth management, os clientes igualmente têm maior disposição para diversificar — seja em geografia ou em estratégias. Marco Harbich, gerente de wealth management da Órama Investimentos, observa que a maior parte dos recursos desses investidores está no mercado acionário (nacional e internacional), em operações no mercado à vista ou mais estruturadas. Em termos de setores, ele vê uma certa inclinação para as empresas de tecnologia e instituições financeiras.
Harbich identifica bom potencial de crescimento também para os fundos imobiliários, por terem “carteiras bem estruturadas” e com retornos maiores que a taxa de juros. Mario Kepler, sócio da Portofino Multi Family Office, também verificou crescimento desses fundos, especialmente dos que têm entre os ativos empreendimentos residenciais ou de galpões logísticos — nesse caso, bastante beneficiados pela expansão do comércio eletrônico decorrente da pandemia.
A vez dos ativos ilíquidos
Os juros baixos evidenciam, ainda, os chamados ativos ilíquidos, opções de investimento que, em linhas gerais, não oferecem “saída” fácil e rápida como a simples venda de uma ação ou de uma cota de fundo imobiliário na bolsa. Trata-se de um mercado global estimado em 4,1 trilhões de dólares, como mostra um levantamento de 2019 da PwC.
Na ponta mais visível desse nicho estão os fundos de private equity e de venture capital — os primeiros compram participações em empresas de capital fechado e os segundos concentram-se nas apostas em negócios incipientes. Nesses dois casos, os investidores conseguem diminuir a correlação de seus portfólios com as oscilações das bolsas e têm chances de lucrar alto, embora cientes de que há também grandes riscos de perdas. Menos comuns, mas também procurados pelos investidores de alta renda, estão os fundos de créditos “problemáticos” (distressed assets) e ativos vinculados a disputas judiciais.
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Entre os investidores que assessora, Harbich, da Órama, notou que ainda está em curso um processo de familiarização com esses tipos de investimento, simultâneo ao aumento do interesse dos clientes. Em média, afirma, ativos ilíquidos formam de 2% a 3% das carteiras, percentuais que podem subir, a depender do perfil. Na Portofino, relata Kepler, as fatias das carteiras alocadas em private equity e venture capital ficam entre 7% e 15%. A expectativa de expansão desses fundos, a propósito, parece favorecer a chegada de novos players. Neste mês, a Lexington Partners, uma das maiores gestoras independentes globais de fundos de private equity e de coinvestimento, abriu escritório em São Paulo.
Mercado externo
Entre eventuais arrependimentos de investidores de alta renda em 2020 certamente estaria ignorar a recomendação dos gestores para diversificação geográfica das carteiras. No ano passado, mesmo em meio a uma crise sem precedentes, o mercado externo resistiu bem, comprovando a pertinência da destinação de pelo menos uma parte dos investimentos a ativos fora do Brasil. Na avaliação de Harbich, essa dinâmica foi decisiva para que os clientes compreendessem a importância de ter ativos descorrelacionados do mercado brasileiro e produtos financeiros em mais de uma moeda — apesar da desvalorização do real. “A demanda por investimentos no exterior não só está mais forte na Órama: ela se tornou uma demanda quase prioritária”, ressalta.
Levantamento da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) mostrou que os fundos com 100% de alocação no exterior das gestoras dos maiores bancos do País (Banco do Brasil, Bradesco, Itaú, Santander e Safra) tinham patrimônio líquido de 7,3 bilhões de reais no início de dezembro passado, ante 2,5 bilhões de reais em igual período de 2019.
Mais próximos dos clientes
Diferentemente do que se poderia imaginar, com a pandemia a relação dos clientes ficou mais próxima dos gestores — lembrando que proximidade é fator fundamental no segmento de wealth management. As ferramentas digitais de comunicação acabaram facilitando a troca de informações e encontros mais frequentes. “Há clientes que preferiam reuniões presenciais e que, agora, chegam a pedir que o formato on-line seja permanente”, diz Harbich. Mais um legado da pandemia que, assim como a maior aceitação dos riscos, parece estar aí para ficar.
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