A governança em tempos de hiperinteligência
Descentralização e adoção de inteligências não humanas serão essenciais para as companhias no terceiro milênio
A governança na era da hiperinteligência
Para Massimo di Felice, docente da USP, a pandemia mostrou que processos hipercomplexos exigem hiperinteligência — ou seja, a junção da inteligência do homem, do clima, da biosfera, dos vírus, dos dados e de todas as entidades que possam interagir e atuar junto com a sociedade | Imagem: freepik

A água-viva é um animal marinho que, ao mesmo tempo em que habita a água, tem seu organismo composto majoritariamente por esse elemento. A membrana sutil que delimita seu corpo é uma camada transparente, que confere pouca distinção entre a parte interna e externa. Para Massimo di Felice, docente da Universidade de São Paulo (USP), a anatomia da água-viva poderia ser comparada às das empresas nas quais a governança é parte indissociável de sua estrutura. No lugar do mar, um enramalhado de trilhões de dados cerca essas companhias. É nesse contexto de hiperconectividade que as organizações do século 21 precisam atuar, tendo que lidar ainda com dificuldades impostas pelas mudanças climáticas e pelo coronavírus.   

A analogia da água-viva foi feita por Di Felice no painel “A governança do terceiro milênio: A era da hiperinteligência”, realizado na 22ª edição do Congresso Anual do IBGC (Instituto Brasileiro de Governança Corporativa). A hiperinteligência, explica o professor, é a inteligência conectada a conhecimentos que vão além da limitada capacidade do ser humano e que permite que entidades diversas interajam e produzam algo único. “Essa característica irá definir a governança do terceiro milênio”, ressalta Di Felice. 

Descentralização 

Para entender a nova fase, toma-se a pandemia como ponto de partida. Di Felice considera que a covid-19 impulsionou a construção de um modelo de governança descentralizada, composta de três atores: a classe científica, o coronavírus e os dados. Em outras palavras, a inédita e catastrófica conjuntura mundial a partir de 2020 colocou a esfera política em segundo plano, transferindo poder às equipes de cientistas aptas a monitorar o vírus por meio de imensos bancos de dados. O resultado disso foi um aumento do diálogo entre os cientistas e os governos e uma mudança na forma como as decisões relacionadas a políticas públicas são tomadas: em vez de se basearem na ideologia de um pequeno grupo, passaram a ser resultado de interações com diferentes atores.  

E a perspectiva, avalia Di Felice, é que os aprendizados obtidos durante a crise sanitária se perpetuem, à medida que o mundo se depara com situações capazes de impactar e paralisar pessoas, indústrias e países inteiros. O professor destaca duas delas: as mudanças climáticas, que mobilizam os setores público e privado a buscarem formas de reduzir a emissão de gases de efeito estufa, e os ciberataques, que afetam as operações e a segurança das companhias. “A pandemia mostrou que processos hipercomplexos exigem hiperinteligência — ou seja, a junção da inteligência do homem, do clima, da biosfera, dos vírus, dos dados e de todas as entidades que possam interagir e atuar junto conosco”, explica o professor. 

A inteligência das plantas 

Segundo ele, a descentralização da inteligência deveria imitar a forma como as plantas interagem. Cientistas de neurobiologia vegetal observam que, diferentemente dos animais, cuja inteligência é ligada ao cérebro, a inteligência das plantas não é centralizada — cada parte de sua estrutura é capaz de receber e processar informações, e cada planta se insere em um ecossistema intercomunicante, composto de redes que trocam informações e atuam em conjunto. No mercado financeiro, o sistema que mais se compara à inteligência das plantas, afirma Di Felice, é a tecnologia blockchain, que facilita o processo de registro de transações e o rastreamento de ativos em uma rede compartilhada e descentralizada.  

“Em poucos meses, passamos do segundo para o terceiro milênio por conta da pandemia. Foi uma emergência, e outras estão por vir”, alerta o professor. Esse cenário reforça a importância de conselheiros e CEOs aprenderem o conceito de redes e se atualizarem. “Num mundo hipercomplexo, pensar num tipo de governança que seja resultado apenas do ativismo e da visão de um grupo limitado é suicídio. Quanto mais integrado for o processo de decisão e a interação com não humanos, mais inteligente será a governança de uma organização”, conclui.

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