Oficialmente, Mark Mobius mora em Cingapura. Na prática, passa boa parte do tempo viajando pelo mundo. Como diretor-executivo do Templeton Emerging Markets Group, ele coordena equipes de análise de investimentos em 18 países. Atendeu à ligação da capital aberto direto de Tóquio, de onde partiria para a Coreia do Sul. Seu trabalho na tradicional gestora americana começou em 1987, quando geria um fundo de investimento em países emergentes. Hoje, é tido como uma autoridade para opinar sobre esses mercados. Em seu blog, traduzido para várias línguas, Mobius divide um pouco de seu trabalho de análise com o grande público. Diz o que pensa do potencial da Nigéria, das reformas do mercado de capitais chinês, da criatividade sul-coreana. Volta e meia, fala também sobre o Brasil. E adverte: o governo é burocrático e gastador demais, sem que empresários, cidadãos e investidores tenham a contrapartida.
Se o Brasil tivesse que escolher apenas um problema para resolver, qual deveria ser?
A burocracia. Em seu país, para que algo seja efetivamente feito, é preciso passar por muita papelada. Um problema e tanto, que acaba tendo como consequências a corrupção e a falta de transparência. Para investidores, isso é sinônimo de ineficiência e imprevisibilidade, além do alto custo de realização dos negócios. O Brasil tem pessoas muito inteligentes e bons investidores; conta com um mercado de ações ativo e inovador. Não há por que não ser um modelo entre os emergentes. Basta que a burocracia e a falta de transparência sejam resolvidas.
Existe uma reclamação generalizada sobre como a carga tributária brasileira, muito alta (cerca de 35% do PIB), encarece os negócios. Impostos elevados são um desincentivo para os investidores?
A carga tributária brasileira é alta sim. Seria bom se diminuísse. Mas os investidores não se importariam muito com ela se houvesse a contrapartida necessária ao País em infraestrutura, que é muito ruim. Hoje, mesmo com impostos tão altos, não há retorno em termos de serviços que facilitem a vida dos cidadãos ou os negócios dos empresários.
A alta da taxa Selic é sempre apontada como uma trava para o mercado de capitais brasileiro. Em sua opinião, ela é um problema tão grande assim?
Com os juros de títulos públicos em 11%, não faz nenhum sentido para os investidores domésticos se voltarem para ações. É um fator relevante, sem dúvida alguma. Do ponto de vista do investidor estrangeiro, contudo, não são os juros altos o principal desincentivo para o investimento no mercado de capitais. É a ineficiência estrutural. E aí voltamos para o problema da burocracia e da infraestrutura ruim.
O senhor acredita que a burocracia é um motivo para as empresas não se listarem em bolsa?
Sim. Quando uma empresa se lista, ela precisa ser transparente. A burocracia acaba criando um ambiente propício para que muitas coisas erradas sejam feitas, como evasão fiscal e corrupção. Companhias que realizam essas práticas tendem a evitar o mercado de capitais para se financiar.
De uma forma geral, como o senhor vê a governança corporativa das companhias brasileiras?
O Brasil tem companhias muito boas e transparentes. Mesmo as estatais chegaram a atingir um bom nível de governança. Porém, devido a intervenções do governo, vieram a não tomar as melhores decisões de negócio. Seria ótimo se o Brasil acabasse com o modelo de duas espécies de ações [ordinária e preferencial]. Um bom exemplo a seguir é o de Hong Kong. Naquele país, a bolsa de valores impediu a oferta pública inicial do Alibaba, porque a empresa pretendia lançar classes de ações diferentes [diante da negativa, a companhia chinesa de comercio eletrônico preferiu se listar nos Estados Unidos, com oferta pública inicial de ações a ocorrer no meio de setembro].
Na comparação com outros mercados emergentes, o governo brasileiro é muito interventor?
Os outros emergentes têm os mesmos problemas do Brasil, em diferentes níveis. Na China, temos visto um tipo de interferência governamental positiva nos últimos tempos. O governo vem se esforçando para retirar subsídios, tornar as empresas públicas mais lucrativas e diminuir a corrupção. É nesse tipo de intervenção que o governo brasileiro deveria se focar. Já criou uma lei anticorrupção; agora, deveria acabar com o subsídio para os combustíveis, que estão fazendo uma grande pressão sobre a Petrobras.
Existe algo que as companhias deveriam fazer para atrair investimentos, em vez de contar apenas com reformas do governo?
Sim. Os empresários brasileiros e a Bolsa de Valores deveriam fazer um forte trabalho de comunicação com os investidores internacionais. Em muitos locais da Europa e principalmente da Ásia, o Brasil é um desconhecido. No Japão, por exemplo, há muito dinheiro para ser investido. Se as companhias brasileiras fizessem roadshows mais amplos para se reunir com gestores de fora dos Estados Unidos e da Europa central, poderiam atrair mais investimento.
Poucas pessoas físicas negociam ações na bolsa brasileira. Estimulá-las seria importante, ou o País deveria se preocupar mais em desenvolver investimentos por meio de fundos?
As pessoas físicas são importantes, pois criam liquidez. Além disso, em grande número, forçam as empresas a ser mais transparentes. Da mesma forma, a participação de um número maior de investidores institucionais seria, sem dúvida, benéfica ao mercado. A indústria de fundos de pensão brasileira é ainda pouco desenvolvida; a criação de mais organizações desse tipo deveria ser estimulada.
Como atrair pessoas físicas para a bolsa de valores?
Muita gente sai do colégio sem ter a mínima ideia de como investir seu dinheiro e poupar para o futuro. Esses assuntos deveriam ser matéria da educação básica. Os jovens precisariam aprender já no ensino médio o que é o mercado de capitais e como funcionam os mercados de ações e de dívida.
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