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As consequências inflacionárias das rupturas provocadas pela pandemia
Países estavam presos a um ambiente de baixa inflação desde 2008 e demoraram a se adaptar à nova realidade
Evandro Buccini
Evandro Buccini, é sócio e diretor de Renda Fixa e Multimercado da Rio Bravo Investimentos | Ilustração: Julia Padula

A inflação é a principal preocupação de governos, mercados e empresários em todo o mundo. A pandemia criou uma drástica mudança no consumo de serviços para bens e os inéditos estímulos monetários e fiscais compensaram parte, toda ou até mais do que a perda de renda das famílias. Os problemas de oferta, que paralisaram a produção de insumos, pareciam o efeito dominante em um primeiro momento, mas o superaquecimento da demanda de bens foi mais duradouro do que o esperado. Os países desenvolvidos estavam presos a um ambiente de baixa inflação desde a crise de 2008 e demoraram para se adaptar à nova realidade, o que pode ter sérias consequências para o crescimento nos próximos trimestres.


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A pandemia do Covid-19 causou três políticas públicas principais: restrições de circulação, estímulos fiscais e estímulos monetários. O isolamento prejudicou a produção de muitos produtos e reduziu o consumo de serviços, que dependem da circulação. Os governos se preocuparam com as consequências econômicas para as empresas e famílias e fizeram estímulos fiscais sem precedentes. As taxas de juros já estavam muito baixas, mas onde havia espaço foram ainda mais reduzidas. O principal instrumento foi jogar dinheiro diretamente na economia via compra de títulos públicos, privados e fundos de investimentos.

Em média, de acordo com o FMI, os principais países desenvolvidos gastaram 13,7% do PIB em despesas com saúde e políticas de apoio a famílias e empresas. Os EUA gastaram 25,5% do PIB; o Brasil, 9,2% — um dos mais altos entre os emergentes. Em medidas de apoio a liquidez, os governos dos países avançados usaram 14,8% do PIB, enquanto o Brasil usou 6,2% do PIB, novamente um dos mais altos entre os pares. Todas essas medidas apenas na esfera dos Tesouros. Os Bancos Centrais foram também rápidos. O Fed cortou a taxa de juros em 150bps em março de 2020 e aumentou o balanço em 15% do PIB. No Brasil, o Banco Central cortou a taxa de juros em 225bps entre março e agosto, para 2%.

Houve debates entre economistas sobre as consequências de tantas ações. Em um primeiro momento, predominou a visão de que não haveria um aumento importante e duradouro da inflação, ou seja, de que ela seria temporária. Esse diagnostico já tinha se provado equivocado quando começou a guerra na Ucrânia, que levou a aumento dos preços de energia e das principais commodities.

Uma das causas estruturais da inflação baixa das últimas décadas — a globalização — parece ter entrado em fase de retrocesso. A pandemia mostrou que os países não podem depender de outros para ter acesso a vacinas e equipamentos médicos. Os problemas de oferta escancararam os limites do “just in time”. A guerra apenas confirmou os novos tempos com os problemas de fornecimento de energia e de grãos. Com a alta dos preços, mais países devem tomar medidas protecionistas para evitar exportações de alimentos e prevenir o desabastecimento.

Após mais de dois anos do início da pandemia, a inflação atinge o maior patamar nos EUA, com os preços em alta de 8,6%. Na Europa, chega a 8,1% e, no Brasil, a 11,7% em 12 meses. A inflação alta e disseminada não é culpa de um ou outro produto ou de uma commodity. É uma doença da moeda. Com algum atraso, os bancos centrais estão reagindo, mas ainda não houve menções a ajustes fiscais. Nos EUA, os juros partiram de zero há alguns meses e devem ir para mais de 3%. O Fed também deve reduzir seu balanço mais rápido do que parecia. O Banco Central Europeu nem começou a subir os juros ainda. No Brasil, o BC começou antes, mas tinha um longo caminho até normalizar a taxa de juros, que deve subir para perto de 14%. A expectativa é de que os juros se mantenham altos por algum tempo. A política monetária tem efeitos defasados e vai esfriar o aumento de preços, mas com o custo usual. A atividade econômica no mundo irá desacelerar.

Os mercados financeiros não estão acostumados com juros altos. Nos últimos 15 anos, as taxas ficaram próximas a zero, e os bancos centrais se preocupavam todas as vezes em que havia uma correção dos preços de ativos de risco. Essa realidade ficou para trás. O principal objetivo é controlar a inflação. As ações de empresas de tecnologia, muitas sem lucro nem geração de caixa, foram as primeiras a sofrerem. O índice Nasdaq cai perto de 30% desde novembro de 2021. Os ativos de crédito sofreram reprecificação com o aumento dos juros dos títulos públicos. Nos últimos vinte anos, quando a bolsa caía, os títulos públicos nos EUA costumavam subir de preço, amortecendo os efeitos em carteiras diversificadas. Este ano, isso não aconteceu. Há quem acredite que as duas classes de ativos voltarão a ter correlação positiva.

Para as empresas, as repercussões são velhas conhecidas dos brasileiros. Volatilidade nos preços e no crescimento da economia está longe de ser uma novidade por aqui, mas a inflação próxima a dois dígitos não é vista há décadas no mundo desenvolvido. Um artigo recente na Harvard Business Review[1] diz que “a sobrevivência de curto prazo passa a preceder o crescimento de longo prazo”. Em alguns setores, a sobrevivência exige repensar cadeia de produção, fornecedores. De forma geral, as empresas no Brasil estão com endividamento controlado, mas a alta de juros exige atenção.

Evandro Buccini, sócio e diretor de Renda Fixa e Multimercado da Rio Bravo Investimentos


[1] How Companies Can Prepare for a Long Run of High Inflation (hbr.org)

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