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Mercados de carbono ressurgem no Brasil 
Na esteira de um movimento global, no País o impulso vem de biocombustíveis e florestas
Mercados de carbono ressurgem no Brasil 

Sucesso do RenovaBio em seu primeiro ano de implementação, mesmo diante de obstáculos socioeconômicos de 2020, marca um novo capítulo na história de mercados de carbono no Brasil | Imagem: vectorjuice/freepik

O final de 2020 marcou o primeiro ano da efetiva implementação do mercado de carbono estabelecido pela Política Nacional de Biocombustíveis (RenovaBio), instituída pela Lei 13.576/17. Segundo dados da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP, 14.535.334 créditos de descarbonização (CBIOs) foram aposentados² por distribuidores de combustíveis até 31 de dezembro de 2020, o que corresponde a 97,6% da meta compulsória anual de redução de emissões de gases causadores do efeito estufa (GEEs) fixada pelo Conselho Nacional de Política Energética para biênio 2019-2020. 

O sucesso do RenovaBio em seu primeiro ano de implementação, mesmo diante da pandemia de covid-19, da queda da demanda por combustíveis e da judicialização por parcela dos obrigados, marca um novo capítulo na história de mercados de carbono no Brasil.  

Como indica o artigo 1º, I, da Lei 13.576/17, o RenovaBio foi instituído para, entre outros objetivos, “contribuir para o atendimento aos compromissos do País no âmbito do Acordo de Paris sob a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima” (UNFCCC). Nessa linha, ncontribuição nacionalmente determinada (NDC) apresentada à UNFCCC em 2015, o Brasil se comprometeu a “aumentar a participação de bioenergia sustentável na matriz energética brasileira para aproximadamente 18% até 2030, expandindo o consumo de biocombustíveis”³.  

Metas de redução de emissões 

O CNPE estabeleceu, para o período de 2020-2030, metas anuais de redução de emissões para a comercialização de combustíveis, estabelecidas em unidades de CBIOs (Resolução CNPE nº 08/20). A cada ano, essas metas são aumentadas e desdobradas em metas individuais para os distribuidores de combustíveis, proporcionalmente à sua participação de mercado na comercialização de combustíveis fósseis no ano anterior. A comprovação de atendimento à meta individual por distribuidor é demonstrada com base na quantidade de CBIOs que cada um 

Os CBIOs são ativos de natureza ambiental e financeira que começaram a ser negociados na B3 em abril de 2020. Eles são emitidos por uma instituição financeira ou banco contratado pelo produtor ou importador de biocombustível (emissor primário) para tal fim, em quantidade proporcional ao volume de biocombustível produzido, importado e comercializado por aquele emissor primário. Apenas os distribuidores de combustíveis estão sujeitos às metas compulsórias de redução de emissões, mas qualquer investidor pode negociar CBIOs na bolsa. 

Mercado de carbono global 

Há justificada expectativa de crescimento da demanda por CBIOs, decorrente do aumento progressivo das metas de descarbonização para os referidos distribuidores. Outro fator que deve impulsionar não apenas o mercado de CBIOs, mas os demais mercados de carbono em escala nacional e global, é a iminente regulamentação do artigo 6º do Acordo de Paris  esperada para ocorrer na COP26 , que prevê mecanismos de cooperação para que os países signatários atinjam suas NDCs, inclusive a estruturação de um mercado de carbono global.


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Voltando um pouco no tempo, é necessário lembrar que, com a entrada em vigor do Protocolo de Quioto, em 2005, o Brasil se beneficiou da implementação de projetos de mecanismo de desenvolvimento limpo (MDL), que geravam créditos de carbono (chamados de reduções certificadas de emissões, as RCEs) que podiam ser utilizados por países desenvolvidos para o cumprimento de seus compromissos no âmbito do Protocolo.  

Além disso, a Política Nacional sobre Mudança do Clima, estabelecida pela Lei 12.187/09, previu o desenvolvimento do mercado brasileiro de redução de emissões (MBRE). Em 2011, foi criado o grupo de trabalho interministerial sobre mercado de carbonoque tinha como objetivo analisar a viabilidade de implantação, os requisitos, os possíveis instrumentos de mercado e alternativas de desenho do MBRE, de forma a subsidiar a tomada de decisões sobre a sua preparação e implementação. Contudo, o MBRE nunca foi adequadamente operacionalizado. 

Em 2014, foi aprovado o Projeto PMR Brasil, com o propósito de discutir a inclusão da precificação de emissões de GEE no pacote de instrumentos para implementação da PNMC no período pós-2020. O projeto integra a Partnership for Market Readiness (PMR), um programa do Banco Mundial que fornece apoio a países para a elaboração de políticas de mitigação das mudanças climáticas, com foco em instrumentos de precificação de emissões. No final de 2020, foi publicado um relatório-síntese do Projeto PMR Brasilcom conclusões favoráveis à adoção de instrumentos de precificação de carbono e, em particular, um sistema de comércio de emissões no país. Agora o Banco Mundial se prepara para lançar o sucessor do PMR, o Partnership for Market Implementation (PMI), que, como o nome informa, foca na implementação dos aludidos instrumentos. 

Incentivos aos mercados nacionais de carbono 

Outras novidades recentes que devem impulsionar os mercados de carbono nacionais são: o lançamento do Programa Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais (Floresta+), por meio da Portaria nº 288/20 do Ministério do Meio Ambiente (MMA), com especial destaque para a modalidade Floresta+ Carbono, instituída pela Portaria MMA nº 518/20; e a publicação da Lei 14.119/21, que institui a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais (PNPSA). Tanto o Floresta+ quanto a PNPSA objetivam incentivar o mercado voluntário de créditos de carbono, especialmente quanto a créditos oriundos de projetos de conservação e recuperação de floresta nativa, contexto no qual se destacam os Projetos REDD+. 

Essa movimentação nacional se alinha a uma tendência global de fortalecimento de mercados de carbono, que são vistos como uma importante ferramenta para o atendimento às NDCs dos países, bem como dos compromissos assumidos pelas empresas  cada vez mais pressionadas por investidores, consumidores e competidores  para reduzirem e compensarem as suas emissões 

Para ilustrar essa tendência, vale mencionar que a Taskforce on Scaling Voluntary Carbon Markets (TSVCM), grupo formado por entes privados de diversos setores e países, lançou, em 27 de janeiro de 2021, uma série de recomendações para a criação de um mercado voluntário de carbono de larga escala que seja robusto, transparente e verificável. 

Nesse passo, a TSVCM afirma que, com o objetivo de contribuir para limitar o aumento da temperatura global a 1,5°C, mercados voluntários de carbono precisariam aumentar 15 vezes de tamanho até 2030. Ademais, o preço do carbono na Europa, no contexto do sistema regional de comércio de emissões (EU emissions trading system), acompanhando o início da sua quarta fase de implementação, tem observado sucessivas altas, atingindo recordes históricos. 

Esse contexto global abre diversas oportunidades para o Brasil, que tem potencial para se tornar o grande protagonista da emissão e comercialização de créditos de carbono. Para tanto, é necessário que as empresas aproveitem as oportunidades criadas por mercados de carbono que a pauta ganhe espaço na agenda governamental, de modo a agilizar o desenvolvimento de instrumentos de precificação de carbono no Brasil. 


Luiz Gustavo Bezerra ([email protected]), é sócio da prática de ambiental do Tauil & Chequer Advogados. Coautoria de Meg Ferreira Cirilo ([email protected]), associada da prática de ambiental do mesmo escritório. 


Notas

¹ Disponível em: https://www.gov.br/mme/pt-br/assuntos/noticias/renovabio-anp-divulga-cumprimento-de-metas-2019-2020
² Nos termos do artigo 11 da Portaria MME nº 419/2019, “Aposentadoria do Crédito de Descarbonização é o processo realizado por solicitação do detentor do crédito ao escriturador que visa à sua retirada definitiva de circulação, o que impede qualquer negociação futura do crédito aposentado”.
³ Disponível em: http://www.itamaraty.gov.br/images/ed_desenvsust/BRASIL-iNDC-portugues.pdf
 Cada unidade de CBIO corresponde a uma tonelada de gás carbônico equivalente, calculada a partir da diferença entre as emissões de GEE no ciclo de vida de um biocombustível e as emissões de seu combustível fóssil substituto.
Disponível em: https://www.gov.br/produtividade-e-comercio-exterior/pt-br/assuntos/competitividade-industrial/pmr/relatorio-sintese-pmr.pdf
 Projetos de Redução de Emissões de gases de efeito estufa provenientes do Desmatamento e da Degradação florestal, considerando o papel da conservação de estoques de carbono florestal, manejo sustentável de florestas e aumento de estoques de carbono florestal (+).
Disponível em: https://www.iif.com/Portals/1/Files/TSVCM_Report.pdf

 

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