Não bastassem as enormes dificuldades que os pequenos, médios e grandes empresários têm enfrentado para manter suas operações e seguir com o “business as usual” em tempos de pandemia, novos entraves — e outros já não tão novos assim — atrapalham a reinvenção de negócios, a busca por investidores e a captação de recursos. Passado mais de um ano da emergência sanitária, houve pouco avanço efetivo na desburocratização do dia a dia das empresas brasileiras.
Em que pese o fato de em 2020 o governo ter publicado uma medida provisória, posteriormente convertida em lei, para acomodar as preocupações de parte dos empresários quanto às obrigações societárias recorrentes (como aprovação de balanços e realização de reuniões e assembleias), o foco da iniciativa era essencialmente pontual: evitar aglomerações nas assembleias gerais ordinárias (AGOs) e postergar o cumprimento de certas formalidades de registro, tendo em vista o atendimento restrito de juntas comerciais e cartórios.
Não há dúvida de que as medidas adotadas representaram melhora quanto às formalidades aplicáveis às empresas. Os administradores, por exemplo, ganharam fôlego para elaborar balanços e convocar e realizar AGOs, além de contarem com alguma flexibilização formal (permissão de assinaturas por plataformas eletrônicas, protocolos online e/ou via delivery, extensão do prazo para retroatividade dos atos à data de sua assinatura, dentre outros).
Medidas como essas facilitaram o manejo societário cotidiano das empresas e a forma de se relacionarem com terceiros, inclusive instituições financeiras e órgãos do governo, que ficaram autorizados a não exigir documentos registrados nas juntas comerciais competentes para poder dar prosseguimento a eventos que dependiam de aprovações prévias.
Ações pós-crise
As ações emergenciais foram adotadas, mas fica a pergunta: e depois disso, como ficam essas formalidades, considerando pontos caros a empresas, investidores, investidas e fundos de investimento, que podem estar interessados em operações como as de M&A e joint venture? A questão é de que maneira pode atuar quem precisa de formalidade passível de registro em junta comercial para conclusão de negócios.
Exemplos desse tipo de formalidade são um registro prévio de emissão de novas ações em uma S.A. que vai receber nova rodada de investimento e precisa estar com seu cap table (tabela de capitalização) atualizado e uma sociedade limitada que precisa incluir em seu quadro de sócios e administradores os novos responsáveis pela empresa após uma aquisição, especialmente quando ela tem como objetivo captar recursos no mercado.
Não se sabe até quando as juntas comerciais continuarão com atividades intermitentes por causa das restrições da pandemia. Mesmo quando as atividades são parcialmente retomadas não se sabe quanto tempo pode demorar para que os documentos sujeitos a registro sejam analisados, considerando o evidente acúmulo de processos em andamento. E, mais importante, ainda não está no horizonte a possibilidade de os órgãos públicos realmente se alinharem à desburocratização prevista pela Lei de Liberdade Econômica.
Fato é que os negócios não podem — e não vão — parar. O mercado de M&A está a cada dia mais aquecido, com grande potencial para movimentar a economia brasileira. O que os agentes de mercado podem fazer nesse cenário ainda burocratizado é buscar amparo jurídico na escassa legislação societária e implementar estruturas criativas, contratuais e societárias que permitam a continuidade da concretização das operações. O custo Brasil, afinal, não pode impedir que elas prosperem.
Débora Trovões Cabral ([email protected]) é advogada do Dias Carneiro Advogados
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