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A (in)definição legal sobre o controle das empresas
Raphael Matos Valentim*

Raphael Matos Valentim*

Uma das principais características das sociedades empresariais é sua organização: elas têm órgãos com diferentes competências e atribuições, mas todos direcionados a um mesmo objetivo. Historicamente, a propriedade acionária sempre foi relacionada às decisões sociais.

No entanto, a sofisticação das estruturas contratuais resultou em uma nítida distinção entre a concentração acionária e o controle da sociedade. O controle, definido como a participação ativa na tomada de decisões políticas, financeiras ou operacionais da sociedade, independe, de fato, da concentração do capital social.

O clássico estudo sobre o controle acionário em sociedades americanas de Berle e Means, ainda no início do século 19, descrevia a existência de influências no controle de uma sociedade não diretamente relacionadas à concentração acionária. Posteriormente, a lei do país aceitou essa premissa com naturalidade.

Nota-se, todavia, uma inconveniente oscilação quanto à definição desse fenômeno jurídico entre as normas infraconstitucionais. Um exemplo recente de incongruências na legislação brasileira é o conceito de influência significativa sobre uma sociedade.

A Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (antiga Lei de Introdução ao Código Civil) é taxativa quando dita, em seu artigo 2o, as regras para o funcionamento da validade das leis quando mais de uma tratar do mesmo assunto. Entre estudantes de Direito, o lema é conhecido: lei mais recente se sobrepõe a uma mais antiga; lei especial vigora sobre lei geral. Apesar de fácil compreensão, é de difícil análise em algumas situações práticas.

Acompanhando uma tendência mundial de transparência nas relações comerciais, a Receita Federal publicou a Instrução Normativa no 1.634, com novas regras para o Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ).

Muito bem. A instrução esclarece (artigo 8o, § 20, incisos I e II) que se presume existir influência significativa quando pessoa natural possuir “mais de 25% do capital da entidade, direta ou indiretamente; ou (…) direta ou indiretamente, detém ou exerce a preponderância nas deliberações sociais e o poder de eleger a maioria dos administradores da entidade, ainda que sem controlá-la”.

Em outras palavras, o critério objetivo da Receita para considerar a existência de influência significativa em uma pessoa jurídica é a posse de mais de 25% do capital social, respeitada a possibilidade de se verificar casos práticos em que a influência é constatada mesmo com percentuais menores. Apenas em casos específicos se considera 20% para se caracterizar essa influência significativa (artigo 19, §10, I).

Tudo está correto. Mas esse percentual de 25% estabelecido pela Receita Federal, em nossa opinião, vai de encontro à definição de influência apresentada em outros instrumentos normativos.

Ao analisarmos o que dispõe a Lei 6.404/1976 (Lei das S.As.), encontramos o conceito de influência significativa no artigo 243, § 5o, que diz: “É presumida influência significativa quando a investidora for titular de 20% ou mais do capital votante da investida, sem controlá-la”.

A Comissão de Valores Mobiliários também tratou do assunto. Na Deliberação 688/2012, presume-se que há influência significativa quando o investidor tem, direta ou indiretamente, 20% ou mais do poder de voto da investida, a menos que possa ser claramente demonstrado o contrário.

Não pensemos se tratar de uma discussão em vão. Desse conceito decorrem diversas implicações legais, principalmente quanto à responsabilidade dos controladores da sociedade.

Como descreve a própria Lei das S.As., caso se constate a influência significativa de uma sociedade sobre outra, elas serão consideradas coligadas. As consequências dessa relação entre as empresas, especialmente no âmbito da Justiça do Trabalho, podem ser bastante prejudiciais para elas.

Ademais, a presunção do controle decorrente da influência pode, em casos mais críticos, afetar os direitos de proteção aos minoritários.

Enfim, verificando as consequências que o conceito de influência significativa pode acarretar, chegamos à conclusão de que, no mínimo, o conceito objetivo emanado pela administração pública deve ser congruente. A coesão do texto legal é necessária para se garantir segurança jurídica.

Voltando às nossas inquirições iniciais, em um caso prático, qual definição preponderaria? Ou para cada caso, para cada órgão, teremos uma definição de influência significativa — criando, assim, uma subjetividade na regra objetiva?

Relembramos que a regra geral dispõe que ninguém pode alegar desconhecer a lei se, eventualmente, deixar de cumpri-la. Em um ordenamento jurídico um tanto quanto confuso como o nosso, essa medida se mostra bastante difícil, uma vez que, como vimos, cada órgão da administração pública cria suas as próprias definições — e, pior, elas não conversam entre si.

*Raphael Matos Valentim ([email protected]) é coordenador da área Societária do Zilveti Advogados. Colaborou Fabio Mesquita Pereira Srougé ([email protected]), advogado da área Societária do Zilveti Advogados.


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