Nas últimas décadas, vigorou forte consenso em favor da regra “uma ação, um voto” nos círculos de governança corporativa. Esse regime traz o benefício de conferir influência política de forma diretamente proporcional ao interesse financeiro do acionista na companhia, promovendo bons incentivos ao exercício do direito de voto. É justamente por isso que o regulamento do Novo Mercado, o mais alto nível de governança corporativa da BM&FBovespa, proíbe a emissão de ações sem poder político.
Mais recentemente, intensificou-se a preocupação de que os atuais mecanismos de governança estariam contribuindo para a busca de retorno financeiro rápido, em detrimento da prosperidade da empresa no longo prazo. Entre as propostas discutidas no âmbito da Comissão Europeia, surgiu a ideia de conferir maior voz ao acionista “fiel”. A inspiração veio do direito francês, que autoriza a concessão de voto em dobro ao investidor que mantém ações por um período mínimo de dois a quatro anos.
O direito brasileiro não contém nenhuma regra semelhante. Ao contrário, o parágrafo 2o do artigo 110 da Lei das S.As. proíbe expressamente o voto plural. Isto é: cada ação com direito político confere apenas um voto. Eventual reforma da legislação que favorecesse o investidor de longo prazo significaria manifesto retrocesso ao País.
Em primeiro lugar, a experiência internacional não oferece evidências em favor dos benefícios de se outorgar maior número de votos ao acionista mais antigo. Ao contrário, os poucos trabalhos a respeito do tema sugerem que a regra francesa facilita a expropriação de acionistas minoritários. Um dos seus principais efeitos na França é justamente o de dilatar a influência do Estado como acionista, pois o governo habitualmente assume participações acionárias de longo prazo.
No Brasil, as desvantagens da adoção dessa regra seriam ainda maiores, uma vez que o nosso mercado possui companhias importantes sob controle estatal. Além disso, os principais investidores institucionais são os fundos de pensão de empresas públicas e o BNDESPar. Dar maior peso a esses atores amplificaria as possibilidades de intervenção política na governança das companhias.
Outro aspecto importante: a grande maioria das empresas do País tem acionista controlador ou grupo de controle definido. Por isso, são menos suscetíveis às pressões de curto prazo que afligem as sociedades sob controle gerencial prevalecentes no mundo anglo-saxônico. O privilégio ao acionista estável desencoraja o ingresso de investidores que possam promover melhorias na governança e na gestão da companhia, já que a sua situação é automaticamente desvantajosa em comparação à dos mais antigos — normalmente, os controladores.
Por aqui, é fundamental que o minoritário tenha voz e vez para exercer os seus direitos e monitorar os
administradores e acionistas controladores, independentemente do tempo de posse das ações. Vale lembrar que o passado não oferece garantias para o futuro: tanto o acionista recente pode permanecer na sociedade por bastante tempo como pode o acionista antigo retirar-se a qualquer momento. É descabida, portanto, a proposta de diferenciação dos seus direitos políticos.
Para continuar lendo, cadastre-se!
E ganhe acesso gratuito
a 3 conteúdos mensalmente.
Ou assine a partir de R$ 34,40/mês!
Você terá acesso permanente
e ilimitado ao portal, além de descontos
especiais em cursos e webinars.
User Login!
Você atingiu o limite de {{limit_online}} matérias gratuitas por mês.
Faça agora uma assinatura e tenha acesso ao melhor conteúdo sobre mercado de capitais
Ja é assinante? Clique aqui