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Novos PLs pressionam auditores e Relações com Investidores
Projetos devem aumentar o nível de responsabilidade para os profissionais e exigir estruturas definidas de controles internos das companhias
Sebastian Soares, presidente do Ibracon
Sebastian Soares, presidente do Ibracon

Após o caso Americanas, uma série de novos Projetos de Lei (PLs) foram lançados com o intuito de trazer mais transparência ao mercado de capitais e evitar novos casos de fraude, como é o caso dos PLs 2.581/2023 e 4.704/2023. Ou seja, a regulação passou a apertar o cerco para empresas de capital aberto e trazer mais responsabilidades a auditores e profissionais de relações com investidores (RIs), estabelecendo mecanismos como o de recompensa ao informante e de indenizações e reparos por erros ou fraudes.

O PL 2581/23, que nasceu no Senado e agora está na Câmara, criou uma espécie de figura do informante no mercado de capitais, dando incentivos e garantias para ele. “Esse PL vem para tentar aumentar a possibilidade de fiscalização da CVM, principalmente porque essa figura da denúncia teria que ser feita por ela, pelo PL, e posteriormente possibilitar algumas garantias como a impossibilidade de demissão, como até um incentivo financeiro sobre eventuais ressarcimentos que forem obtidos da companhia, multas que foram impostas”, comenta Renato Tescari, sócio do CTM Advogados.


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Além do mecanismo inspirado no “whistle and blow” dos Estados Unidos, um programa de incentivo e recompensa para informantes, desde que não estejam envolvidos na fraude, há um artigo específico no PL sobre a declaração da administração em relação à estrutura e à efetividade operacional dos controles internos. A responsabilidade pela elaboração das demonstrações financeiras é da administração da companhia e o que se propõe no PL é que, além da responsabilidade por elas, a administração faça uma declaração, que deve vir a público, dizendo que ela certifica que os controles internos estão apropriadamente desenhados e funcionando como foram projetados para que funcionem.

“Conjuntamente, há a exigência de que os auditores externos eventualmente chancelem essa declaração e, inclusive, emitam uma opinião para falar se ela procede, se corresponde e tem lastro nos fatos mesmo”, esclarece Sebastian Soares, presidente do Instituto de Auditoria Independente do Brasil (Ibracon). “Qual a consequência disso? Tanto a administração como os auditores externos terão que fazer a avaliação dos controles internos. No caso dos auditores externos, serão dois suportes: um que continua sendo a sua avaliação para determinar a extensão dos seus procedimentos de auditoria como parte das demonstrações financeiras e uma segunda, opinar especificamente sobre a declaração dos administradores da companhia sobre o desenho e a efetividade operacional desses controles internos.”

Na prática, o que muda é que, aquelas companhias que ainda não seguiam as melhores práticas de governança, terão que montar essa estrutura, e o auditor externo passa a ter a responsabilidade de assegurar que essa declaração da administração está adequada e correta.

No RI também há impactos, como a revisão e implementação de controles internos. Para evitar as penalidades previstas, as áreas de RI precisarão integrar-se mais estreitamente com outras áreas da empresa, como contabilidade e compliance, para garantir a integridade das informações divulgadas. “Com a previsão de penalidades de até seis anos de reclusão para fraudes contábeis, como a inserção de operações inexistentes ou a omissão de transações efetivas, os profissionais de RI precisarão redobrar a atenção ao verificar as informações divulgadas ao mercado”, afirma André Vasconcellos, professor da Trevisan Escola de Negócios e vice-presidente do Conselho de Administração do Instituto Brasileiro de Relações com Investidores (IBRI).

André Vasconcellos, Professor da Trevisan Escola de Negócios e Vice-Presidente do Conselho de Administração do IBRI
André Vasconcellos, Professor da Trevisan Escola de Negócios e Vice-Presidente do Conselho de Administração do IBRI

Além disso, o PL exige um maior rigor na comunicação com os investidores. “O projeto também introduz implicações legais e pessoais para os profissionais de RI. A possibilidade de responsabilização individual aumenta a pressão sobre esses profissionais, que já atuam em um ambiente regulatório complexo”, complementa Vasconcellos.

Mas o PL 2581 não é o único. Outros PLs, como o 4.704/2023 também prometem uma mudança na estrutura das empresas. Ainda em estágio prematuro nos debates, ele cria a possibilidade de indenizações e reparos por erros ou fraudes em relação à administração da empresa, aos gestores, aos eventuais proprietários e aos auditores independentes, possibilitando também ao minoritário que se sentir lesado. Ele possibilita, inclusive, que profissionais que tenham sido beneficiados por uma performance financeira passada, que não necessariamente refletia a realidade, sejam obrigados a fazer a devolução dos recursos.

Nesse contexto, a comunicação transparente e o detalhamento de informações tornam-se essenciais para evitar mal-entendidos que possam resultar em litígios. “Isso implica em uma maior diligência na coleta e divulgação de dados, garantindo que os acionistas tenham um entendimento completo das práticas e dos riscos envolvidos nas operações da empresa. O fortalecimento da comunicação com acionistas minoritários é outro aspecto crucial”, ressalta o vice-presidente do IBRI.

Existe ainda a possibilidade de ações de reparação contra auditores independentes e a exigência de devolução de bônus por administradores envolvidos em fraudes ou erros que alterem o desempenho da empresa, aumentam a necessidade de uma gestão de crise eficaz, exigindo preparação das áreas de RI, com a elaboração de planos de comunicação que abranjam cenários, garantindo que a resposta da empresa seja coordenada e eficiente.

O que ficou de fora

Embora sejam positivos e estejam em linha com uma série de outros PLs e iniciativas para tornar o mercado de capitais mais transparente e mitigar as chances de fraude, nem tudo foi contemplado.

O Ibracon vê ambos os PLs de maneira positiva, mas acrescenta que há ressalvas a serem feitas e revistas, em especial no 4.704. “Nós somos favoráveis ao projeto como um todo, mas na questão da responsabilização do auditor independente, ele precisa ser concluído e analisado na eventualidade dele não ter executado seus trabalhos de acordo com a norma da profissão existente para a realização dos trabalhos”, lembra Soares. “Ou seja, quando o auditor executa um trabalho, ele já tem uma série de normas que precisa seguir, que são emitidas ou pelo Conselho Federal de Contabilidade, ou pela CVM, no caso de companhias abertas, ou pela Previdência Complementar, no caso da Previc, ou no caso de instituições financeiras, no caso do Banco Central.”

Na visão do instituto, o texto deve conter algumas modificações e colocar “cada um dentro do seu balaio de responsabilidade”. “O auditor não está lá para efetuar a transação, uma auditoria de demonstração financeira é diferente de uma auditoria investigativa. Quando eu recebo um documento, eu parto da premissa de que aquele documento é verdadeiro, ele foi assinado por quem eventualmente deveria assiná-lo”, diz o presidente do Ibracon. “O nosso pleito é de que a eventual responsabilização em relação a ele seja, na eventualidade, de ele ter sido negligente ou de ele não ter cumprido, na execução de seus trabalhos, com todas as normas da profissão que dão o direcionamento dos trabalhos.”

Outra questão que tem sido trabalhada pelo instituto junto ao governo é a sugestão dos comitês de auditoria para todas as companhias abertas, não apenas para as companhias do Novo Mercado da B3. “Uma solicitação nossa para criar atratividade para o mercado de capitais, transparência, nesse projeto de dar mais governança para os processos das companhias como um todo, é que o comitê de auditoria deveria, sim, ser mandatório para todas as companhias abertas”, conta Soares.

Tescari ressalta que o grande problema é o fato de os PLs estarem um pouco “parados”, sem relatores, e não estarem caminhando efetivamente, seja na Câmara ou no Senado. Embora veja os PLs com teor positivo, o advogado comenta que algo crucial ficou de fora: a possibilidade de responsabilização da companhia. “Todos que trabalham com o mercado de capitais, principalmente na parte da responsabilização, sofrem muito com uma questão que continua não resolvida por nenhum desses PLs, que é a possibilidade de o acionista diretamente buscar reparação contra a companhia, não só contra administradores, contra auditores, contra controladores”.

Hoje, as discussões judiciais ou em sede de arbitragem colocadas esbarram nessa questão que não está efetivamente resolvida, que é se o investidor pode buscar reparação contra a empresa e não contra os administradores, diretores e controladores. Isso muda porque a figura de responsabilidade civil desses entes é diferente da companhia perante os investidores. 

“Essas declarações que são dadas ao mercado como forma de atrair investidores, valor às suas ações etc., são avaliadas de forma objetiva, ou seja, um investidor teria muito mais benefício de poder ir atrás da companhia, em primeiro lugar, porque ele não tem que demonstrar que houve culpa da diretoria ou negligência, mas simplesmente tem que demonstrar que aquela informação que está sendo divulgada e na qual o mercado se baseou para investir, não é verdadeira”, comenta Tescari.

Outro ponto importante para o investidor é que a capacidade de pagamento de uma companhia aberta é muito maior do que a maioria dos controladores, administradores e diretores. Segundo o advogado, o custo para a busca de reparação é muito alto e, muitas vezes, se esbarra numa série de lacunas na lei e da falta de experiência do Brasil nessas demandas que impedem ou retardam o ressarcimento desses investidores, algo que poderia ser revisto por esses PLs. “Parte deles já caminha um pouco nesse sentido, mas ainda falta bastante, é justamente como melhorar esse cenário, esse status quo.”


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