A corrida para a adaptação à Resolução 175 da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) está a todo vapor e a nova era dos Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDCs) está prestes a começar. Com o prazo final para implementação total da CVM 175 para os FIDCs se aproximando, previsto para 29 de novembro, as gestoras precisam adequar processos e procedimentos a um novo marco regulatório que impacta diretamente suas operações. Segundo players do mercado consultados pela Capital Aberto, boa parte de seus FIDCs já está nos padrões da resolução.
Para Marco Túlio Lima, head comercial da Vórtx, que possui dois terços dos FIDCs que administra já tombados para o padrão da CVM 175, alguns players do mercado podem acabar patinando. “Acho que alguns vão escorregar, principalmente os grandes. Nós temos um montante administrável, esse número de 85 FIDCs, sendo que cerca de 10% a 15% nasceram já no âmbito da CVM 175. Mas se você pegar quem tinha estoques maiores, como alguém com 650 fundos, pode ser mais crítico”, comenta.
Segundo o executivo, cerca de 20 fundos ainda não estão adaptados, faltando ajustar um regulamento dentro das novas diretrizes da 175. A administradora está na fase de enviar um comunicado aos clientes com a minuta padrão e o modelo de acordo operacional. “O que muda agora é que antes tinha só uma pessoa que contratava todo mundo e respondia por toda a interface com regulador, autorregulador, receita. Agora tem dois participantes especiais”, comenta Lima. “Como não existe mais a relação de contratação, é um acordo operacional. Mandamos um comunicado que agora começa a contagem regressiva. Hoje, temos em torno de 20 fundos para fazer, e o foco é esse”.
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Nas gestoras consultadas, o processo está ainda mais adiantado. A Ouro Preto Investimentos, por exemplo, já adaptou a maioria de seus FIDCs, que totalizam 90 fundos, para o padrão da CVM 175. “Já fizemos 90% dos nossos fundos. A primeira coisa é ajustar o regulamento do fundo para colocar em conformidade com a nova legislação. Isso dispensa convocar assembleia porque quando você tem que mudar um regulamento para adequá-lo a uma mudança na legislação, o administrador, o gestor, podem fazer independentemente de ter que ir à aprovação dos cotistas”, esclarece João Baptista Peixoto Neto, CEO da Ouro Preto Investimentos.
Mais um ponto importante é a operação de novos sistemas com a mudança da dinâmica. “Há muito mais responsabilidade para os gestores e isso envolveu um investimento em sistemas, tanto interno como de terceiros dos quais somos próximos e utilizamos”, continua Neto. Para o caso do FIDC, afirma o gestor, o passo mais importante foi credenciar-se numa central registradora de recebíveis. A casa já está integrada via API.
Peixoto Neto comenta que “falta uma coisinha ou outra” em alguns contratos de parceria com os administradores e custodiantes. “Mas onde tem uma parte ainda meio obscura, já fizemos esse acordo operacional. Somos cobertos pela administradora custodiante, mas achamos que temos de fazer como gestor, então já nos adiantamos. Porque no nosso caso, especialmente de FIDCs, houve muita transferência de responsabilidades do custodiante para o gestor, principalmente, e um pouco para o administrador.” Sobre os dez fundos que ainda não tombaram para a CVM 175, Peixoto Neto diz que a questão não é nem tanto os acordos operacionais, mas sim “porque são muitos fundos, então, não dava para fazer tudo ao mesmo tempo”.
Do lado da Solis, 16 dos 64 FIDCs sob gestão nasceram no âmbito da 175. Dos 48 restantes, 24 já estão 100% aderentes. “Dos outros 24, a gente tem 40%, ou seja, uns 18, já na fase final de assembleia. Estamos seguindo um cronograma de convocações de assembleia para essa conversão”, afirma Ricardo Binelli, sócio-diretor da Solis. “Tem 10%, ou seja, cerca de seis a oito fundos, em que estamos num passinho um pouco atrás. Mas, olhando o nosso prazo de 29 de novembro, acreditamos que até o final de outubro teremos convocado todas as assembleias. Entramos em novembro já com tudo endereçado, só com o prazo para contar”, detalha.
Embora essas convocações não sejam obrigatórias para todas as decisões, a gestora optou por fazê-las em todos os fundos, ainda que isso tenha tornado o processo de adaptação um pouco mais lento. “Aproveitamos essa ocasião para refinar e repassar detalhes. Porque nesse período todo, os FIDCs, coincidentemente, vieram ganhando relevância no mercado, com cada vez mais investidores interessados”, comenta Binelli. Para ele, houve melhoria na regulamentação. “Esse foi, inclusive, um aspecto que também fez, nos últimos dois, três meses, até gastarmos um pouco mais de tempo do que o orçado originalmente, justamente para fazer esse refinamento em todas as áreas internas”.
Já na REAG Asset, gestora que adquiriu a Empírica há pouco meses, o ambiente é similar. A gestora, que iniciou um forte trabalho de adaptação de seus FIDCs desde dezembro de 2023, dos mais de 30 FIDCs, apenas três ainda não tombaram para a CVM 175. “Todos os outros já estão rodando na 175 e não só no aspecto jurídico. A gente não ia seguir com a assembleia, com o administrador ou com o aditamento do contrato se eu não soubesse que o operacional está rodando”, comentou Maria Eduarda Suppi, gestora da área Jurídica da REAG Asset Management. “O operacional é a garantia de trabalhar dentro do critério de elegibilidade, não simplesmente colocar num papel que eu estou olhando. Garantir que estamos fazendo a verificação de lastro, terceirizando para alguém em quem confiamos para fazer essa verificação”, continua.
Desses três FIDCs que ainda não foram adaptados, dois já saíram da assembleia, “então já estão praticamente tombados”. Ademais, a equipe está realizando o trabalho de “passar pente fino” nos fundos da REAG. “Não todos, são cerca de dez neste caso. Obviamente, estamos com o prazo um pouquinho apertado, mas são fundos que percebemos que estão rolando bem ou que não têm um operacional muito trabalhoso”, comenta Maria Eduarda.
Assim como a Solis, a REAG Asset também optou pela realização das assembleias. Para a executiva da REAG Asset, a norma, no geral, é muito clara sobre quais são os assuntos que não demandam assembleia, que são muito restritivos, como alteração de taxa, se o fundo é limitado ou ilimitado. “São três ou quatro itens e são taxativos. Ou seja, eu tenho que fazer assembleia. E nós tivemos essa preocupação de ligar o jurídico com o operacional. Por exemplo, verificamos que tinha critério de elegibilidade que adoraríamos ter no fundo, e antes não tínhamos, porque o custodiante não tinha sistema para isso. Desenvolvemos o nosso próprio sistema”, disse, reforçando a criação de governança e transparência para o investidor.
Prazo e dificuldades
Para os players consultados, o prazo não foi um problema e, inclusive, generoso devido às prorrogações. Isso, no entanto, não evitou que houvesse dificuldades na adaptação.
Desafios não faltaram. “Todo dia a gente se deparava com alguma questão relacionada ao sistema, que não está parametrizado correto, ou o lastro, que tem que receber de determinada forma, num tipo de arquivo’”, comenta Maria Eduarda, da REAG. “No mais, já éramos uma casa que se preocupava muito com as questões da gestão ativa ou acompanhar o operacional, mesmo não sendo a nossa obrigação, fazíamos testes internamente para ver se o custodiante no dia a dia estava verificando o lastro.”
Binelli, da Solis, percebeu um “preconceito” no mercado em relação ao registro do crédito. “Nós, especialmente, gostamos bastante da ideia do registro. Mas muitas vezes, o originador do crédito entende que ele tem um processo de crédito que eliminaria os riscos que o registro busca evitar”, pontua.
Na percepção da gestora, há uma ideia de custo e de não entender exatamente o que o registro agrega de insumos para uma decisão de crédito mais acertada, principalmente relacionada à mitigação de risco de fraude e risco de venda de crédito em duplicidade.
Peixoto Neto, da Ouro Preto, também reforça essa percepção quando fala do prazo de adaptação à norma, que é menor do que para o mercado em geral. “A preocupação com o FIDC era menos operacional e mais com a possibilidade de aumentar os custos do registro. Mas do ponto de vista operacional, isso não é difícil de fazer. Hoje, você tem os sistemas, o registro centralizado. Alguns fundos já faziam esse registro centralizado.”
Já na Vórtx, por sua vez, uma dificuldade percebida na adaptação é a verificação e registro do lastro, que antes era responsabilidade do custodiante e agora passa a ser do gestor. “A indústria ainda está aprendendo a ser diligente sobre essa nova responsabilidade do gestor, como é que você acompanha e verifica se ele está fazendo isso ou não”, diz o head de produtos da infratech. “É um campo meio cinza, porque, como é uma atividade nova, tem pouca gente que tem processo para isso, ou eles subcontratam quem estava fazendo isso no passado ou estão fazendo direto. Só que até onde vai essa sua diligência porque, às vezes, se você entra muito, acaba virando solidário, e é tudo que a 175 veio para mudar.”
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