O conceito de coworking no Brasil ainda é relativamente novo. Os primeiros empreendimentos começaram a aparecer por aqui em 1996, mas o mercado só decolou de fato nos últimos anos — hoje já são mais de 800 espaços, com cerca de 56 mil estações de trabalho distribuídas em aproximadamente 310 mil m².
Os números avançam em progressão geométrica com a chegada de grandes players internacionais, mas o mercado brasileiro ainda é pequeno se comparado aos de países com economias desenvolvidas. Para se ter uma ideia, a maior empresa de coworking do mundo deverá administrar, sozinha, 5 milhões de m² até o fim deste ano. Fundos de investimento imobiliário (FIIs) também já vêm avaliando a entrada nesse segmento.
Contudo, alguns entraves jurídicos — decorrentes da ausência de regulação precisa e das incertezas tributárias — ainda inibem grandes investimentos. O mais recente e emblemático exemplo é a responsabilização solidária das empresas de coworking sediadas no município de São Paulo pelo pagamento do ISSQN sobre os serviços prestados pelos usuários dos espaços, nos casos em que eles não têm cadastro tributário municipal (CCM).
A lei municipal paulistana extrapola os limites estabelecidos pelo Código Tributário Nacional ao possibilitar a responsabilização tributária solidária de um terceiro (coworking) que não guarda relação direta com o fato gerador do ISSQN (prestação de serviços pelos usuários dos espaços a seus respectivos clientes). O assunto assume relevância especial se considerarmos que a cidade de São Paulo concentra aproximadamente um terço dos espaços de coworking do País e que outros municípios com grande apetite arrecadatório poderão seguir o exemplo paulistano.
Alguns cuidados a serem tomados na definição da estrutura jurídica do coworking decorrem da própria complexidade do que se oferece aos usuários. No modelo de negócio atualmente adotado pelas empresas de coworking, elas disponibilizam espaço físico, mobiliário, equipamentos e serviços de naturezas diversas. Normalmente permite-se a cada usuário optar por planos customizados, que variam conforme a inclusão ou não de serviços adicionais e o tempo de utilização — que pode variar entre uma hora e muitos meses. Existem, ainda, eventuais custos e serviços de terceiros repassados ao usuário, como tarifas telefônicas e despesas com impressões.
Muitos investidores hoje vislumbram a obtenção da renda imobiliária decorrente do uso do imóvel pelos usuários finais, transferindo a gestão do espaço (prestação de serviços) a empresas especializadas. Nesses casos, há sempre a necessidade de avaliação e planejamento cuidadoso das estruturas contratual e tributária, para mitigação das tributações duplicadas que possam aniquilar a margem de lucro do negócio.
Os diferentes componentes do preço pago pelo usuário final são tributados, cada um de uma maneira específica, por tributos federais e municipais, e a formalização documental incorreta ou imprecisa pode gerar passivos tributários muito relevantes. Mesmo quando se cobra um “pacote fechado”, sem opcionais, o preço abrange, pelo menos, o uso de espaço físico (imóvel) e de mobiliário/equipamentos (bens móveis), a disponibilização de alguns serviços básicos e o reembolso de despesas específicas (telefonia e impressões). Em pacotes mais amplos cobra-se dos usuários, ainda, serviços diversos prestados pela gestora do coworking, a exemplo de recepção e copa, e serviços de terceiros (internet, consultorias, serviços administrativos e de escritório, entre outros).
A adequada formalização de contratos e de documentos fiscais é imprescindível para se mitigar o risco de que determinados entes tributantes — União, Estados e Municípios — venham a cobrar tributos e respectivas multas sobre parcelas do faturamento que não deveriam compor as respectivas bases de cálculo. A estrutura jurídica deve ser analisada à luz das normas e da jurisprudência relativas a IRPJ, CSLL, PIS, COFINS, ISSQN, ICMS, contribuição previdenciária e taxas municipais.
Não menos importantes são os aspectos regulatórios. Hoje o coworking é objeto de diversos projetos de lei municipais e federais. Também são raros os posicionamentos de órgãos regulatórios sobre o tema — caso da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que ainda não se posicionou sobre a possibilidade de FIIs investirem no setor por meio de locação de imóveis de terceiros (aquisição de direitos decorrentes da locação) para múltiplas sublocações aos usuários finais do coworking. Caso haja sinalização positiva do regulador do mercado de capitais a respeito, esses fundos, atualmente favorecidos pela desoneração tributária, poderão vir a ser importantes veículos de investimentos e, certamente, contribuirão para a expansão da oferta de coworking no Brasil.
Assim, a exemplo de toda nova estrutura ou produto, existe uma curva de aprendizado para sua aplicação. A definição da estrutura jurídico-tributária de cada empreendimento impacta diretamente no resultado financeiro do negócio e ela deve ser cuidadosamente avaliada pelos empreendedores e investidores, sob pena de ineficiência fiscal ou de acumulação de passivos tributários relevantes.
*Lucas Dollo ([email protected]) é sócio de NFA Advogados
Gostou do artigo?
Cadastre-se e não perca nenhum texto deste canal.
Receba por e-mail um aviso sempre que um novo texto for publicado.
Para continuar lendo, cadastre-se!
E ganhe acesso gratuito
a 3 conteúdos mensalmente.
Ou assine a partir de R$ 34,40/mês!
Você terá acesso permanente
e ilimitado ao portal, além de descontos
especiais em cursos e webinars.
User Login!
Você atingiu o limite de {{limit_online}} matérias gratuitas por mês.
Faça agora uma assinatura e tenha acesso ao melhor conteúdo sobre mercado de capitais
Ja é assinante? Clique aqui