Com o aumento da inadimplência no setor imobiliário, cada vez mais imóveis são colocados à venda em leilões judiciais. Neles, muitas transações são consideradas vantajosas para o comprador, principalmente pelos preços mais baixos que os de mercado. Tem-se que essas aquisições são seguras, porque consideradas pela doutrina e pela jurisprudência; estariam, assim, de certa forma livres de questionamentos. De fato, a aquisição por meio da arrematação implica rompimento de todos os vínculos do bem com o anterior proprietário. O bem adquirido chega ao patrimônio do adquirente livre de gravames e ônus de qualquer natureza.
Entretanto, algumas questões devem ser objeto de criteriosa análise de risco. Deve ser verificada, por exemplo, a existência de vícios de ordem processual e material da execução ou da expropriação, previstas no art. 903, parágrafo primeiro, do Código de Processo Civil (CPC) em vigor. Ele trata das situações em que a arrematação poderá ser invalidada, considerada ineficaz ou resolvida. Por sua vez, determina o art. 179 do Código Civil um prazo de dois anos para anulação do ato jurídico. Não há dúvida de que a ação anulatória de que se trata não tem o condão de desfazer a arrematação e não pode ser proposta em substituição aos embargos à arrematação.
Ao elencar as hipóteses de impugnação à arrematação, o art. 903 do CPC vai além: prevê que a alienação judicial será considerada perfeita e irretratável, ainda que sejam julgados procedentes os embargos do executado ou a ação autônoma prevista no parágrafo quarto do dispositivo legal.
Assim, em até dez dias depois da arrematação, cabe às partes no processo de execução alegar a invalidade do ato, em decorrência de arrematação por preço vil ou por outros vícios de procedimento. No mesmo prazo, terceiros podem se insurgir, alegando a ineficácia da arrematação. Decorridos os dez dias, qualquer que seja o resultado nos embargos do executado ou em ação autônoma, não poderá reverter a arrematação.
Essas disposições tiveram o objetivo de aumentar a segurança jurídica da aquisição nessa modalidade, mantendo irretratável o negócio jurídico e deixando a resolução da questão no âmbito de eventual ação anulatória, resumida à pretensão de indenização a ser suportada por aquele que deu causa ao prejuízo.
Certo é que a lei assegura ao arrematante a possibilidade de desistir da arrematação, sob certas circunstancias definidas em lei, e amplia a sanção que antes era imposta em razão da oposição de embargos à arrematação protelatórios, contemplando agora a hipótese de multa por ato atentatório à dignidade da Justiça se a alegação de vício for infundada e destinada a induzir a desistência do arrematante (sem prejuízo de responder o impugnante por perdas e danos). Porém, a desistência da arrematação sob o argumento de não ser possível pagar o preço por falta de condições financeiras pode sujeitar o comprador a sanções penais, além de multas.
Aquele que pretender adquirir o imóvel em hasta pública deverá analisar, além dos vícios processuais, o valor do lance a ser a ser oferecido, nunca inferior a 50% da avaliação. Isso porque o novo diploma processual prevê expressamente que será considerado vil o preço menor que a metade do valor de avaliação.
É preciso, ainda, verificar a existência de coproprietários; de credor hipotecário, pignoratício ou anticrético; de detentor de direito real de uso; de compromissário comprador que tenha registrado a promessa de venda e compra na matrícula do imóvel. Igualmente necessária a certeza de que esses interessados foram intimados, para se evitar o desfazimento por ineficácia. De todo modo, a invalidação, ineficácia ou resolução da arrematação, por meio de ação autônoma, podem colocar o arrematante na posição de réu.
Há também riscos relacionados a restrições ambientais ou urbanísticas em imóveis sem construção ou com obras em andamento. Elas podem ensejar numerosos contratempos para quem pretende empreender no imóvel adquirido.
Não é demais relembrar que a análise deve incluir a verificação da existência de dívidas sobre o imóvel pretendido, notadamente — mas não exclusivamente — de IPTU e condomínio e da menção a esses débitos no edital. Afinal, essas dívidas podem ser repassadas ao comprador, com ou sem o direito de serem cobradas do anterior proprietário. Imóveis ocupados, por sua vez, demandam ações judiciais de iniciativa do comprador, posteriormente à arrematação. Ônus e gravames anteriores à arrematação poderão ter que ser cancelados um a um, perante cada juízo diante do qual foi constituído, de acordo com as normas locais da Corregedoria da Justiça.
Imprescindível, ainda, o imediato registro da carta de arrematação (principalmente em razão da Lei 13.097/15), evitando-se riscos de outra arrematação, ainda que posterior, prevalecer sobre a anterior, se não levada a registro no Oficial de Registros de Imóveis.
Portanto, ao mesmo tempo em que a arrematação isenta o adquirente de ônus e gravames, a realidade pode ser outra sem uma adequada análise dos riscos.
Eliana Azar ([email protected]) é sócia de NFA Advogados
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