Dentre os vários efeitos desencadeados pela chegada das plataformas abertas de investimento ao mercado brasileiro, como a maior concorrência na indústria de fundos, figura um que às vezes passa despercebido: o crescimento da quantidade de clientes e do volume de patrimônio sob responsabilidade dos gestores independentes — indiretamente, a proliferação das plataformas ajudou a fortalecer as assets sem ligação com bancos. Assim, se há alguns anos considerava-se que essas firmas poderiam passar por um processo de consolidação, hoje esse cenário parece bem mais distante.
Veja-se o caso da Leblon Equities. Na gestora criada em 2009, o número de clientes aumentou de 300 para 4 mil desde que os fundos passaram a ser distribuídos nas plataformas, há dois anos. “Essa evolução seria impensável sem esses canais de distribuição”, afirma o sócio Pedro Rudge. A Leblon Equities tem uma equipe de 16 pessoas no Rio de Janeiro e investidores do Brasil inteiro. Apenas três profissionais dão conta do trabalho de back office e cuidam dos cadastros — time que seria muito maior caso não existissem as parcerias de distribuição on-line. O fundo Leblon Ações foi colocado primeiro na prateleira da Órama e, em seguida, na da XP Investimentos. Hoje, ele está disponível também na Rico, no BTG Digital, na Easynvest e na Ativa. Dos 350 milhões de reais sob gestão da Leblon em fundos de ações e previdência, 60 milhões de reais foram captados por meio das plataformas abertas.
A ampliação de mercado também aconteceu na Ibiuna Investimentos, casa fundada em 2010, e na Valora Investimentos, que abriu fundos para captação em 2009. Ambas fizeram parte do rol dos primeiros gestores com fundos de investimento distribuídos na plataforma da XP. A Valora arrecadava recursos principalmente de áreas de gestão de fortunas de bancos e colocou o fundo Guardian na grade da XP em 2011, com o objetivo de diversificar o passivo. “Não tenho a menor dúvida de que a alteração da distribuição foi crucial para o desenvolvimento dos gestores independentes. Os que existiam antes eram ligados a pessoas famosas no mercado. As plataformas trouxeram mais confiança e aproximaram os gestores dos investidores”, afirma Daniel Pegorini, CEO da gestora. A Valora distribui seus produtos também na Genial Investimentos, no Modal Mais e na Guide. A importância da captação por meio de plataformas vem aumentando na gestora: em 2015, elas eram responsáveis por 47% do volume de recursos obtido pelos fundos abertos para captação; agora, representam 65%.
Já a Ibiuna começou distribuindo seus produtos em family offices. Em 2013 entrou na plataforma da XP e, logo em seguida, fez parte das primeiras assets com fundos distribuídos na plataforma do Itaú Personnalité. Hoje, seus fundos de investimento também são vendidos por Órama, Rico, Modal Mais, Easynvest, Banco Original, Mirae e Genial. Caio Santos, responsável pela área de relações com investidores, observa que essa estratégia confere mais sustentabilidade à gestora, que atualmente tem cerca de 5 mil clientes. O varejo, ressalta, responde por 1 bilhão dos 6,5 bilhões de reais sob gestão da casa — 500 milhões de reais captados pelo Personnalité. É a segunda categoria de investidores mais relevantes da gestora, atrás apenas de private banking e family offices.
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Bom também para os novatos
Para os gestores que surgiram recentemente, a possibilidade de contar com a distribuição via plataformas já na largada é muito bem-vinda. A Legacy é uma das casas que utilizam essa possibilidade. Lançada em junho deste ano, a gestora captou 1,3 bilhão de reais para o fundo Legacy Multimercado Macro, principalmente de investidores do private banking. Para não ficar dependente desse público, desde o início, colocou o produto nas plataformas de XP, Guide, Órama, BTG Digital, Modal Mais e Genial. E está em processo de diligência com a Easynvest e com o Banco Inter. “As plataformas diminuem a dificuldade de distribuição e possibilitam às gestoras captar recursos com investidores de perfis diversos”, observa o sócio José Eduardo Araújo. Até o momento, o percentual de recursos arrecadado via plataformas pela Legacy ainda é pequeno: representa de 10% a 12% do patrimônio sob gestão. Araújo atribui esse resultado ao momento de mercado e ao fato de a rentabilidade do fundo ainda não poder ser divulgada por ter histórico inferior a seis meses.
A expansão das plataformas abertas foi positiva não só para os gestores, mas também para os investidores, avalia Rudge, da Leblon Equities: elas proporcionaram o acesso a bons produtos e a redução dos tíquetes mínimos de aplicação e das taxas de administração. As plataformas ficam responsáveis pelo cadastro de clientes e back office, o que reduz custos para o gestor, que por sua vez pode repassar o benefício para o cotista — estratégia fundamental num mercado de alta competitividade. Em fevereiro deste ano, por exemplo, a Leblon Equities baixou a taxa de administração do fundo Leblon Icatu Previdência, de 2,75% para 2% ao ano. Além disso, reduziu a aplicação mínima do fundo Leblon Ações, de 100 mil reais para mil reais, em março de 2017.
Relação distante
Na visão de Rudge, o ponto negativo da distribuição via plataformas para as assets é o desconhecimento do cliente, já que o relacionamento com ele não fica a cargo do gestor. Por isso, recentemente a Leblon também passou a aceitar investimentos em seu site, usando para isso a plataforma da Órama — que desde o fim de 2016 oferece duas modalidades de aplicação: a “por conta e ordem fechado”, na qual faz todo o relacionamento com o cliente, e a “por conta e ordem aberto”, em que atua como provedora de serviços financeiros. Nessa segunda modalidade, o cadastro do cliente é feito via sistema da Órama, mas o investimento ocorre pelo site da asset ou por aplicativo, cabendo ao gestor atender o investidor.
Sócio responsável pelo setor de parcerias da Órama, Hélio Pio acredita que essa modalidade não canibalizará a distribuição feita pela empresa. Enquanto a modalidade na qual o gestor não sabe quem é o cotista tem 220 mil clientes cadastrados, a outra possui 9 mil. “Elas são complementares”, afirma. Dos 200 gestores que a Órama atende, cerca de 100 usam a modalidade aberta. A próxima candidata a entrar nesse nicho é a VS2, do Banco Bonsucesso.
Na avaliação de Gustavo Pires, sócio da XP Investimentos, as plataformas ajudam a aumentar a competitividade dos gestores com estruturas muito pequenas. Num ambiente onde a concorrência por recursos é ferrenha, e as exigências regulatórias são severas, quem não conseguir captar recursos logo no início pode ter dificuldade em atrair talentos e em se manter no mercado. A XP leva em consideração vários aspectos na hora de escolher os gestores que farão parte de sua plataforma — e um deles é o patrimônio dos fundos: produtos com menos de 50 milhões de reais impossibilitam o avanço do processo de análise. “A diferenciação deve se dar pela estrutura, pela capacidade de gestão, pela inovação para criar produtos e pelo relacionamento com os investidores”, afirma Pires. Não à toa, questões que antes pouco preocupavam as assets, como construção de marca e criação de páginas nas redes sociais para se aproximar de investidores, entraram no radar. Uma contrapartida pequena perto da imensidão de recursos que as plataformas permitiram às gestoras captar.
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