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Moeda Digital

O Enigma das bitcoins

O que faz a criptomoeda atrair uma crescente legião de usuários em todo o mundo

Redação Rodrigo Petry        Edição Rejane Aguiar

Direção de arte e ilustração Rodrigo Auada

Quando a suposta identidade do criador do Bitcoin foi revelada, no início do mês de maio de 2016, a comunidade internacional da moeda digital ficou dividida em relação à veracidade das notícias que pipocaram na imprensa e nas redes sociais. Será que enfim seria conhecido o verdadeiro autor do já clássico “White paper”? Teria finalmente chegado a hora de o mundo conhecer a figura real por trás do enigmático pseudônimo Satoshi Nakamoto, que assina o texto?

  • O que é o “White paper”?

    Trata-se do documento acadêmico que lançou as bases e estabeleceu as diretrizes de um novo e complexo sistema de troca de valores — descentralizado e sem a tradicional intermediação de instituições financeiras. Ele foi divulgado em outubro de 2008.

Em entrevistas à BBC e às revistas The Economist e GQ, Craig Steven Wright, um cientista da computação australiano de 45 anos, se apresentou como o criador da mais famosa das criptomoedas em circulação no mundo. Nem todos, contudo, acreditaram nas declarações de Wright: extensas análises e reportagens da mídia especializada — caso da Coin Telegraph — questionaram o fato de o Bitcoin ser obra de um homem só. Dada a complexidade do sistema, especula-se que seja resultado do trabalho conjunto de muitos desenvolvedores.

  • O que é a criptomoeda?

    É a denominação para moedas digitais (que circulam na internet) passíveis de criptografia — ou seja, podem ser convertidas em um arquivo com um código secreto, ao qual apenas o emissor e o receptor têm livre acesso.

VOCÊ SABIA?

Segundo a revista The Economist, Satoshi Nakamoto teria uma reserva de aproximadamente 1 milhão de bitcoins, que correspondem a uma montanha de US$ 500 milhões.

Afinal, o que é Bitcoin?

Em um breve resumo, Bitcoin é um software de código aberto que faz pagamentos e trocas de valores de forma totalmente digital ou virtual, ponto a ponto (peer-to-peer). Esse desenho permite remessas de valores sem a intermediação de uma autoridade central — um banco, uma bandeira de cartão de crédito ou uma empresa de pagamentos on-line. O Bitcoin é como uma cédula da internet. Um dinheiro programável, que não exige de ninguém permissão para ser usado. Basicamente, tudo dentro do Bitcoin é estatística, inclusive a certeza de que uma transação é legítima ou não.

  • O que é um software de código aberto?

    É um software que pode ser modificado e redistribuído de forma gratuita e colaborativa entre todos os usuários da rede, que vão aperfeiçoando o sistema.

Quem não está habituado ao raciocínio particular do mundo digital pode se perguntar: mas como é possível confiar nas transações feitas por um sistema que descarta a participação das instituições financeiras e até dos bancos centrais, que no sistema tradicional de troca de valores chancelam as operações e tentam impedir fraudes? Quando se fala em Bitcoin, todas as transações são “carimbadas”, de forma criptografada, em um gigantesco banco de dados público.

Todas as transações com bitcoins são “carimbadas”, em um gigantesco banco de dados público

Blockchain

O Bitcoin é como a ponta de um iceberg. Sob essa pequena parte visível está estruturada uma grande rede pública que armazena todo o histórico de movimentações — em uma correspondência com o mundo analógico, ela seria o equivalente a um registro contábil, a um livro-razão. Essa rede é a blockchain, cujo conceito é um dos grandes méritos do sistema formulado por Satoshi Nakamoto.

 

Sempre que uma troca de valores entra no sistema, são checadas todas as transações relacionadas já realizadas, o que respalda a operação. Se alguém quiser fraudar uma das transações terá um trabalho colossal: terá que fazer isso, sucessivamente, também com os blocos anteriores — já que todos estão interligados, como numa teia. Assim, a fraude fica praticamente impossível, pois em algum ponto da cadeia a irregularidade será identificada. Nesse sistema de blocos, portanto, a transação mais antiga é a que conta para a autenticação de cada operação.

 

Exército digital

Nesse ambiente peculiar não existe algo similar ao que um banco central representa no mundo real. Mas se não há autoridade central, quem faz essas checagens? A autenticação das transações fica a cargo de uma comunidade de usuários denominados mineradores. Eles são responsáveis por adicionar as cadeias de blocos à rede. Como ferramenta para verificar a autenticidade das transações os mineradores usam a resolução de problemas matemáticos e de determinados algoritmos, criptografados — e precisam contar com computadores de grande capacidade de processamento. Como incentivo a esse esforço, que requer gasto de tempo e de eletricidade, o minerador é recompensado com uma nova unidade de bitcoin. Essa é a forma da moeda entrar em circulação, já que não existe uma autoridade central para fazer o papel da emissão de novas moedas.

 

No sistema do Bitcoin, essa comunidade deve monitorar toda a teia de transações e evitar duplicidade. Para cada transação há uma checagem, que leva cerca de dez minutos. Só entram na blockchain as transações realmente comprovadas e “aprovadas” por pelo menos seis mineradores. Cabe ressaltar que o trabalho dessas pessoas não é voluntário. Pela verificação no banco de dados, os mineradores são recompensados com unidades de bitcoins, o que contribui para a expansão da quantidade dessa moeda digital em circulação no mundo. Eles têm a opção de vender as bitcoins que recebem do sistema como gratificação pela geração dos blocos no processo de mineração a quem quiser comprar ou guardá-las em uma carteira virtual para esperar eventual valorização futura.

Só entram na blockchain as transações realmente comprovadas e “aprovadas” por pelo menos seis mineradores

Sistema finito

O Bitcoin se espelha na natureza ao adotar o princípio dos recursos finitos. Assim como os minerais e os metais preciosos, ao longo do tempo as unidades da moeda virtual tornam-se cada vez mais escassas e de difícil “extração”. Desde o início do sistema, ficou determinada a emissão de 21 milhões de unidades, e estima-se que existam hoje 15 milhões em circulação.

 

“Apesar da previsão de choque na oferta em julho, quando a emissão das moedas vai cair pela metade, acreditamos no aumento da demanda, o que vai exercer uma pressão positiva no preço”, diz Safiri Felix, CEO da CoinBR, que atua nas áreas de mineração, câmbio e soluções em moedas digitais.

 

Estima-se que a última bitcoin possa ser extraída por volta do ano 2140. Quando isso acontecer, o trabalho dos mineradores será exclusivamente de checagem das transações, e eles devem ser remunerados por taxas sobre o montante financeiro movimentado a cada operação.

 

9 de julho de 2016 é dia do “halving” — data em que, a cada quatro anos, a quantidade de novas bitcoins geradas diariamente cai pela metade. Segundo a Coin.Br, passarão a ser criadas 1.800 unidades por dia, e não mais 3.600, o que reduzirá a inflação anual de 8,7% para 4%. Essa é a política monetária do Bitcoin: padronizada, sem controle governamental, e baseada na matemática.

Prazo para esgotar

A quantidade de novas bitcoins se reduz à metade a cada quatro anos, por meio da diminuição do que é pago aos mineradores

Ano

Mineração rende...

2009

50 bitcoins

2012

25 bitcoins

2016*

12,5 bitcoins

*previsão para julho

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Moeda volátil

A disseminação do Bitcoin foi lenta e marcada por extrema volatilidade. As diretrizes foram lançadas no fim de 2008, mas as primeiras transações aconteceram apenas a partir de 2009.  Dois anos depois, a moeda superou US$ 1.

 

Em 2013, tornou-se visível a legitimação da bitcoin, que passou a atrair a atenção inclusive de grandes fundos de investimento. O valor da moeda, por consequência, saltou de um patamar de US$ 13 no início daquele ano, para encerrar o período perto de US$ 780 — depois de ter atingido um pico próximo a US$ 1 mil. A cotação e a volatilidade tiveram impulso positivo com declarações como a do então presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA), Ben Bernanke. Ele disse ver áreas “nas quais [a bitcoin] representa oportunidades”. Em 2014, por outro lado, a moeda se desvalorizou, após uma das maiores casas de câmbio de bitcoins do mundo, a MtGox, registrar perda de cerca de 700 mil bitcoins por causa de suposta invasão de hackers. Posteriormente, a casa decretou falência.

 

Os contratempos, entretanto, não afastaram os investidores. Acredita-se que os irmãos Winklevoss, cofundadores do Facebook, teriam algo como 1% de toda a carteira virtual do Bitcoin. Eles estimam que, em algum momento no futuro, esse mercado poderá valer US$ 1 trilhão. Se a previsão se confirmar, cada unidade pode ser cotada a impressionantes US$ 47,6 mil! Especialistas alertam, contudo, que a falta de fundamentos técnicos que permitam a construção de uma tese de investimentos dificulta o cálculo de um preço-alvo para a moeda.

 

No Brasil, no início de junho, a moeda superou a barreira dos R$ 2 mil — uma alta de 132% sobre a cotação de R$ 860 de um ano antes, segundo o relatório BitValor.

VOCÊ SABIA?

Em maio de 2010 foi registrada, nos Estados Unidos, a primeira comercialização de um produto com bitcoins: duas pizzas foram compradas por 10 mil bitcoins, o equivalente à época a pouco mais de US$ 40. A cotação da moeda disparou desde então, para os atuais cerca de US$ 500 — assim, aquelas duas pizzas de 10 mil bitcoins por US$ 40 agora valeriam US$ 5 milhões!

Investimento especulativo

Aproximadamente 90% das transações com a moeda têm características de trade — compra e venda para a obtenção de ganhos com as diferenças de cotações, em investimentos especulativos. Apenas 10% referem-se a trocas entre pessoas e empresas para pagamentos.

 

No Brasil, cerca de 100 estabelecimentos estão cadastrados no sistema para receber em bitcoins — mas, na prática, as transações ainda são raras.

 

“Não há vantagem em se fazer pagamentos com bitcoins no Brasil, pois a cadeia de transações [de bancos e empresas de cartão de crédito] já é muito otimizada e eficiente. Por outro lado, no caso de transferências internacionais, é possível economizar entre 10% e 15% [pelas menores taxas]”, diz João Paulo Oliveira, Chief Blockchain Officer da FoxBit, corretora brasileira.

 

O uso da bitcoin no mercado brasileiro ainda se restringe ao pagamento de serviços como programação, advocacia ou recarga de celulares, por exemplo. No exterior, entretanto, há mais opções, como mostra o vídeo “I lived on bitcoin for 24 hours”, produzido pela CNN.

Onde comprar bitcoins?

A comercialização de bitcoins é parecida com a aquisição de ações de uma empresa de capital aberto — as transações são intermediadas por corretoras remuneradas por taxas de corretagem. A moeda é fracionada, o que permite a aplicação de pequenos valores, e o montante comprado pode ficar em uma carteira virtual.

 

As bolsas de valores estão atentas a esse desenvolvimento, seja pela possibilidade de atuar como elo entre empresas e investidores ou pelos benefícios que a nova tecnologia pode oferecer aos sistemas de negociação. A BM&FBovespa acompanha de perto esse movimento, com grupos de estudos internos que estão se aprofundando no tema. A americana Nasdaq já anunciou que deve usar o Blockchain como sistema de registro de ativos financeiros a serem comercializados.

O mercado de bitcoins no Brasil

Em 2015, a movimentação de bitcoins no País atingiu R$ 113,1 milhões, contra um total de R$ 43,9 milhões em 2014 — um avanço de 157,63%. A projeção para 2016 é de que seja transacionado um montante entre R$ 240 milhões e R$ 300 milhões, segundo o BitValor.

Quanto vale cada bitcoin? (em R$)

Período

Cotação

Jan/15

712

Jan/16

1.682

Abr/16

1.708

Jun/16

2.000

Jul/16

2.286*

*Em 1/7

Fonte: relatório BitValor

  •  

Apenas o começo

Apesar de sua fama, as bitcoins não estão sozinhas no universo de moedas virtuais. Elas disputam a atenção dos investidores e aficionados em meios digitais com as chamadas altcoins, que usam os mesmos princípios do Bitcoin, mas, em muitos casos, têm tecnologia mais avançada. Um dos problemas do sistema criado por Satoshi Nakamoto é a restrição da quantidade de transações — na prática, entre quatro a cinco por segundo, o que é muito pouco quando se observa o número exorbitante de operações de grandes empresas de cartão de crédito, por exemplo.

 

O principal concorrente do Bitcoin hoje é a rede do Ethereum, que emite a moeda digital ether e surge com credenciais para inaugurar uma nova fase para as criptomoedas. A rede soluciona problemas existentes no blockchain do Bitcoin. Um exemplo é o tempo de transação, que cai para menos de 20 segundos. Além disso, ao contrário do blockchain do Bitcoin, o Ethereum possibilita a rodagem de aplicativos em sua rede, a criação de moedas criptografadas sobre sua base e o desenvolvimento de contratos inteligentes (smart contracts) — executados automaticamente assim que as condições estabelecidas no acerto são atingidas. “De qualquer maneira, as outras criptomoedas, mesmo que sejam mais evoluídas tecnicamente, não contam com a liquidez do Bitcoin, que já está espalhado em diversos países”, pondera Oliveira, da FoxBit.

As bitcoins disputam a atenção dos investidores e aficionados em meios digitais com as chamadas altcoins

Regulação

Um ponto sensível das moedas virtuais é a falta de regulação. O Banco Central do Brasil, por exemplo, não considera a bitcoin e a altcoin como moedas eletrônicas, que são tratadas por uma lei específica (12.868/13). Elas também não são reconhecidas como valores mobiliários — assim, não podem ser envolvidas em contratos do mercado financeiro ou reguladas pela CVM (Comissão de Valores Mobiliários). Uma das explicações é a baixa representatividade no sistema financeiro nacional. Nada, no entanto, que não possa mudar no futuro, com uma regulação específica.  Em 2014, o BC divulgou um comunicado com sua interpretação a respeito de moedas virtuais.

 

Potencial

Mesmo diante das incertezas, os investimentos de fundos de venture capital no Bitcoin e na blockchain só crescem. Na avaliação do Goldman Sachs, que tem um estudo sobre o tema, a tecnologia sobre a qual o Bitcoin está estruturado pode redefinir transações e o back office de uma ampla gama de setores e atividades — bancos, pagamentos a cartórios, sistemas de votação, registros de veículos, taxas de transferências internacionais, registros de armas e de trabalhos acadêmicos, liquidações financeiras e de propriedades de obras de arte, entre muitos outros.

 

“Primeiramente, nos posicionamos para ser uma das principais pontas de liquidez do mercado de bitcoins no Brasil e, a partir daí, estamos desenvolvendo uma série de produtos”, afirma João Canhada, CEO da FoxBit. “Falamos de blockchain com os bancos, que estão muito interessados nas possibilidades”, reforça. O potencial do Bitcoin, e da tecnologia que o ampara, é inconteste, embora ele ainda enfrente barreiras, assim como qualquer disruptura tecnológica. Quem não acompanhar o movimento vai ficar de fora do jogo — e a partida está apenas começando.

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editora executiva Simone Azevedo

editoras Rejane Aguiar e Luciana Tanoue

 

redação Rodrigo Petry

 

direção de arte e ilustração Rodrigo Auada

 

data de fechamento 8.7.2016

 

negócios e patrocínios Anna Ortiz  

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