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Desafio para iniciantes
Se você ainda está montando ou quer montar uma área de RI, prepara-se: falar a língua do investidor requer, sim, muita prática e habilidade

 

ed22_p040-043_pag_4_img_001Todo mundo sabe que montar um bom departamento de Relações com Investidores é tarefa de qualquer empresa que se prepara para alçar vôo no mundo das S.As de capital aberto. Mas faça isso na prática e verá o quanto é difícil vencer este desafio com êxito.

A começar pela escolha da equipe de RI. Melhor contratar um profissional de fora ou deslocar alguém interno para o cargo? Tomada a decisão, e antes mesmo do novo diretor se ajeitar na cadeira, será preciso que ele ensine a rotina do mercado aos funcionários. Isso tudo num prazo recorde, pois, em meio à trabalheira para a realização de um IPO (oferta pública inicial de ações, na sigla em inglês), é muito provável que a instalação da área de RI tenha ficado para a última hora. Sem esquecer, é claro, da delicada tarefa de convencer os donos do negócio de que, dali em diante, haverá um porta-voz para falar com os investidores. E que não será um deles.

Definitivamente, começar uma área de RI do estágio zero não é missão das mais tranqüilas. Em qualquer empresa, lidar com a experiência de dormir com um ou dois controladores e acordar com milhares de acionistas batendo à porta, ávidos por informações, requer habilidades especiais. Para mapear as agruras dessa via-sacra – e tentar, de certa forma, encontrar soluções que possam auxiliar as companhias que passam ou estão prestes a passar por ela – a Capital Aberto perguntou às recém- chegadas no pregão (e a uma instituição financeira que se prepara para desembarcar nele) quais foram os erros e acertos na implementação da sua área de RI.

Nossa primeira constatação: a maioria trouxe pelo menos uma pessoa de fora, que já entendia a língua dos corretores, analistas e investidores em geral. Das sete pesquisadas – Diagnósticos da América (Dasa) , Submarino, Porto Seguro, Grendene, Natura, Nossa Caixa e Renar Maçãs –, apenas as duas últimas ainda não contrataram ninguém novo. Mas ambas concordam: esse profissional faz falta.

Quer um exemplo? Se tivesse alguém mais experiente ao seu lado, a gerente de RI da Nossa Caixa, Angélica Perboni, não teria gasto tanto tempo aprendendo sozinha seu novo papel dentro do banco. “Quando a área foi montada, em 2002, não fazia idéia do que era isso”, revela. É claro que ela tentou reverter o prejuízo visitando outras instituições financeiras para entender como as coisas funcionam. Mas sua dedicação foi quase isolada já que, nesses três anos, a gerência de RI passou pelas mãos de três diferentes diretorias – contabilidade, controladoria e, finalmente, no início de 2005, ficou sob a tutela do setor financeiro do banco. “Nosso processo foi um pouco atípico”, explica. “Numa estatal, os diretores podem ser trocados de quatro em quatro anos. E gente de fora só entra com concurso público.”

Com a abertura de capital programada para o segundo semestre, a Nossa Caixa tenta dar sinais de que vai superar o estigma de empresa fechada. Mas isso não é simples. No final de maio, o banco ensaiou sua primeira participação na Bovespa, com o leilão do controle acionário da Nossa Caixa Seguros e Previdência, uma das duas subsidiárias criada em 2002, após a lei que permitiu a abertura de capital da estatal. A oferta serviu como amostra do que pensam os bancários sobre a nova realidade. No dia da venda, houve não só um protesto em frente ao pregão, como também a tentativa de obter uma liminar na Justiça para impedir a negociação. Explicar aos funcionários que abertura de capital não é privatização será, sem dúvida, um grande desafio para Angélica. Perguntada se, devido a essas peculiaridades, os analistas devem ter uma tolerância extra com a Nossa Caixa, ela assume a responsabilidade: “Não. Estamos bem preparados.”

Na Renar Maçãs, o diretor de RI, Evito Coldebella, que também responde pelo setor administrativo e financeiro da empresa, promete algo semelhante. Porém, com tantos cargos acumulados, confessa que vem precisando de uma mãozinha para melhor se relacionar com os investidores. A Renar está para contratar uma consultoria especializada em RI que irá ajudá-la em questões operacionais como, por exemplo, a preparação de um manual de conduta. “Sozinho, não dou conta”, diz Coldebella. Por causa da estréia no Novo Mercado, em janeiro, o diretor passou os últimos fins de semana de 2004 no escritório. Varou madrugadas até finalizar os relatórios trimestrais. A dedicação às tarefas financeiras, contudo, custou-lhe o baixo empenho na área de relacionamento com o investidor propriamente dita. O diretor orgulha-se por ter feito a lição de casa e criado o departamento, mas hoje sente falta de um preparo maior para conversar com os analistas. “Acho que eles percebem que não sou do mercado só pelo meu jeito de falar”, desconfia.

Sim, Coldebella, os analistas percebem o jeito ainda incipiente da Renar de lidar com o mercado. Além de ouvir as empresas, a reportagem também foi atrás de bancos, corretoras e gestoras independentes de recursos. Perguntamos como avaliam as áreas de RI das novas empresas abertas. No caso da Renar, por exemplo, a analista da Coinvalores Tatiane Pereira diz que o rico conteúdo apresentado pela empresa nas reuniões com as corretoras impressiona. Mas cobra modificações no site, como uma videoconferência na divulgação dos balanços trimestrais e um espaço para que os analistas possam se cadastrar e receber fatos relevantes. “É preciso entender como funciona a cabeça do analista”, aconselha. Eduardo Kondo, da Concordia, acredita que o diretor financeiro pode até acumular a função de RI. Porém, faz uma ressalva: “A presença de alguém com experiência de mercado na equipe é fundamental”, sentencia. No coro dos que vêem o trabalho facilitado quando conversam de igual para igual está o superintendente de renda variável do BankBoston Asset Management, Mario Quaresma. “É diferente lidar com quem já sabe o que queremos.”

Atendendo pedidos como esses, a Porto Seguro não só terceirizou os serviços operacionais de RI para a MZConsult, como também acaba de trazer Guido Lemos para gerenciar essa área. Seus oito anos de experiência no mercado financeiro vêm completar uma lacuna que havia na companhia na hora de lidar com os analistas. A missão de Guido é clara: ser pró-ativo, antecipar as respostas ao mercado e ajudar na padronização dos balanços da empresa e suas subsidiárias. “Não vim reinventar a roda”, explica. “A diferença é que conheço o modo de pensar do investidor.”

Empresas se preocupam em atender às exigências do regulador e deixam para a última hora a área de relações com investidores

A Natura também foi rápida e, em abril, convidou para o seu time Helmut Bossert, ex-superintendente de RI da Sabesp. Sua primeira providência foi desmistificar a imagem que o público interno tinha do mercado acionário. “Certa vez, ficaram espantados quando mencionei que as corretoras chegam a negociar bilhões de dólares”, conta. “Não acreditavam que houvesse operações nessa cifra.” Por outro lado, Bossert teve de aprender sobre biodiversidade e essências naturais. E mesmo ele, que já está na estrada há algum tempo, não escapa da alfinetada dos analistas: “A Natura nunca nos dá o guidance que queremos”, aponta Tania Sztamfater, do Unibanco. O diretor de RI responde que isso é uma política da empresa, já que a Natura prefere as previsões qualitativas às quantitativas.

COMUNICAR-SE É FUNDAMENTAL – Se até esse parágrafo você estava convencido de que basta ter um profissional experiente em RI para essa área ser um sucesso, preste atenção na história da Grendene. A empresa trouxe para sua equipe Doris Wilhelm, RI há 14 anos, atual presidente do Ibri (Instituto Brasileiro de Relações com Investidores), ex-Coteminas, VCP, Ambev e Unibanco. No entanto, alguns corretores apontam justamente a falha na comunicação com os investidores para explicar a queda brutal das ações. Os papéis despencaram para menos da metade do valor, se comparados com o preço de oferta na abertura do capital, há seis meses. A desvalorização do dólar e a alta dos insumos reduziram os lucros da companhia. Até aí, qualquer um está sujeito às intempéries da economia. O erro, na avaliação do mercado, foi a ausência de um discurso pró-ativo, com guidance e números detalhados, durante a trajetória descendente das ações. “Poderiam ter chamado a imprensa ou feito um pronunciamento”, afirma Fabio Anderaos, da Planner. “As informações devem ser divulgadas, sejam elas boas ou más notícias.” O analista chegou a redigir um relatório com críticas construtivas para a Grendene. “Sabíamos que a culpa não era da profissional de RI, e sim um problema interno dos controladores”, diz, referindo-se a Doris.

Para a gerente de RI da calçadista, o episódio trouxe lições importantes. A empresa reconheceu o tropeço e, no início de maio, trocou seu diretor financeiro e de relações com investidores. Saiu Gelson Rostirolla, que ficou com a diretoria administrativa e controladoria da empresa e, no seu lugar, entrou Marcus Peixoto. A nomeação de alguém com passagens pelos bancos Pactual e Credit Suisse First Boston é um recado de que a Grendene está tentando virar essa página. “Tivemos um desconto maior do que merecíamos e agora vamos recuperar nossa credibilidade com um discurso mais focado para o mercado”, argumenta Doris. A nova gestão também pretende cuidar com carinho da comunicação interna, ensinando a todos os funcionários a liturgia de uma empresa de capital aberto.

Quem também vem mandando os executivos para a sala de aula é Odélio Filho, gestor de RI na Dasa. Ele conta que seu trabalho é facilitado pelo fato de o grupo já passar por experiências com investidores desde que os laboratórios foram adquiridos por um fundo de private equity. Mas ainda encontrou médicos sem entender a importância de não sair por aí passando informações. “Até eu e o Marcelo Marques (diretor de RI da Dasa) tomamos algumas lições”, conta, referindo-se ao curso de RI preparado pelo escritório Mattos Filho Advogados Associados, que freqüentaram no final do ano passado. Como preparo nunca é demais, trouxeram ainda a consultoria Global RI para auxiliá-los em trabalhos operacionais: conference calls, elaboração de mailing, envio de informações para Bovespa, entre outros.


FOCO EM PROJEÇÕES – Enquanto a preocupação da maioria das novas áreas de RI é entender a cabeça do analista, no Submarino o diretor Martín Escobari procura navegar numa direção um pouco diferente. Seu esforço é fazer o mercado enxergar a empresa não só pelos resultados numéricos dos últimos balanços, mas por suas perspectivas futuras. “O lucro obtido em um ano até é um bom indicador para avaliar uma companhia que cresce 10% anualmente. Mas não é o caso do Submarino, que cresce 60%”, explica. Para transmitir esse recado, Escobari definiu uma agenda de reuniões com grandes investidores institucionais para vender seu peixe. Às vezes, chega a falar com quatro, cinco deles num só dia. Tudo para convencê-los de que o desempenho prometido no momento em que lançou suas ações irá se concretizar.

Para o presidente da Apimec Nacional (Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais), Milton Milioni, obstáculos como esses poderiam ser evitados se as empresas começassem a aprender a linguagem e as idiossincrasias do mercado com mais antecedência. De preferência, muito antes de anuncia- _ rem a abertura de capital. Ele faz elogios à Nossa Caixa e à Caixa Econômica Federal por já terem organizado encontros com esse objetivo na Apimec. E puxa a orelha da Localiza, que estreou no Novo Mercado no último dia 24. “Ainda não vieram falar conosco.”

Semanas atrás, o Ibri iniciou uma espécie de campanha para que as empresas dêem mais atenção à área de RI durante seu processo de abertura. O instituto nota que o volume de trabalho para atender às exigências da Comissão de Valores Mobiliários deixa pouco tempo para estruturar o departamento que vai lidar com os investidores. Em geral, o diretor que mais se envolve na apresentação dos balanços é quem acaba assumindo essa função. Para poupar o trabalho de quem vai ocupar esse cargo nas futuras empresas abertas, o Ibri decidiu investir na raiz do problema: passou a visitar bancos de investimentos a fim de que eles alertem as companhias que os procuram a não deixar para a última hora o diálogo com o mercado. Sugestão de lema para a campanha do instituto: “Não esqueçam o RI!”


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