Realidade escondida
Medir o desempenho pelo EVA permite enxergar detalhes da gestão que mercados baixistas — ou em euforia — insistem em disfarçar

O último ano provou-se um período de fortes emoções para investidores, analistas e gestores de companhias em todo o mundo. Frente às incertezas que rondavam o ambiente corporativo, a grande maioria das empresas sofreu expressiva desvalorização no preço de suas ações. Eventualmente, muitos executivos que tinham uma parcela — muitas vezes relevante — de sua remuneração atrelada ao desempenho da cotação das ações viram-se injustiçados por um mercado em baixa, não obstante a qualidade de sua gestão e das decisões tomadas.

De fato, constatamos empiricamente que o desempenho operacional médio das companhias, medido pelo EVA®, não apresentou, de um ano para o outro, tamanha volatilidade que justificasse uma queda tão acentuada das ações. Isso se explica pelo fato de o mercado, ao precificar os papéis de uma companhia, incorpora nos valores as expectativas quanto aos cenários macroeconômicos nacional e internacional, à oferta de liquidez via bancos ou mercado de capitais, as tendências do mercado consumidor e inúmeros outros fatores que terão impacto sobre o desempenho futuro da organização e que não estão refletidos no desempenho atual da gestão. E, principalmente em períodos de incerteza, fatores psicológicos de aversão ao risco, ruídos de informação e outras variáveis acabam por prevalecer nas decisões dos investidores, em detrimento do desempenho gerencial. São em momentos como esse, portanto, que fica mais claro que usar somente as cotações das ações para incentivar e premiar os gestores pela criação de valor pode ser uma solução incompleta.

A questão é que, em períodos voláteis, o momento da concessão das ações ou opções torna-se um fator preponderante sobre a remuneração de longo prazo do executivo. Por exemplo, um executivo que recebe um pacote de stock options num momento em que as ações estão subavaliadas por circunstâncias de mercado, pode auferir grande lucro mesmo que não tenha melhorado efetivamente o desempenho da companhia. Basta que o cenário melhore e suas opções poderão ser exercidas com lucro. E a ocorrência de movimento análogo, porém inverso, é também perfeitamente possível. Dessa forma, torna-se imprescindível o acompanhamento de uma métrica interna que reflita os efeitos decorrentes das decisões dos gestores sobre a criação de valor para o acionista. Só esse monitoramento permite a avaliação da performance da administração independentemente do humor do mercado de capitais. Porém, a questão é: como definir uma métrica interna que alinhe os interesses dos acionistas e gestores e reflita adequadamente a criação ou destruição de valor ao longo do tempo?

Observamos, em companhias de diferentes portes e setores, a utilização de métricas contábeis, como lucro líquido e Ebitda, que podem gerar julgamentos distorcidos sobre o desempenho da gestão. O lucro líquido, por exemplo, incorpora resultados não operacionais, como a venda de ativos. Caso a venda de um ativo gere um prejuízo contábil, ainda assim essa medida pode ser uma decisão geradora de valor, uma vez que libera caixa retido em ativo não produtivo. Vemos, nesse caso, que a redução do lucro líquido não significa necessariamente destruição de valor. O lucro líquido ainda pode aumenta significativamente quando se reduz o nível de endividamento líquido, mesmo quando a alavancagem é favorável à empresa. Aqui, a companhia poderia se aproveitar de benefícios decorrentes da dedutibilidade fiscal da dívida. Ou seja, aumentar o lucro líquido pode significar menos caixa na mão dos acionistas e maior custo de capital.

O Ebitda também é um indicador bastante utilizado, tanto pelo mercado, quanto pelos administradores para a avaliação do desempenho operacional das empresas. Porém, assim como o lucro líquido, o Ebitda despreza muitos itens que evidenciam aspectos relevantes da gestão, tais como capital de giro e investimentos. Ou seja, o Ebitda pode crescer ao longo do tempo em função apenas de maiores investimentos, mesmo que os retornos obtidos sejam inferiores ao custo de oportunidade.

Alguns argumentam que o fluxo de caixa livre é a medida definitiva de criação de valor, uma vez que, conforme a teoria econômica, o valor justo de uma empresa depende da expectativa de geração de fluxos de caixa livre no longo prazo. Apesar de ser considerado um avanço em relação ao Ebitda, o fluxo de caixa não leva em conta o risco inerente ao negócio e também não atrela temporalmente o ônus dos investimentos com seus benefícios. Em poucas palavras, um fluxo de caixa negativo não significa necessariamente mau desempenho.

Tal situação pode ser muito bem exemplificada pelo caso da cadeia de lojas de varejo Wal-Mart, atualmente o maior varejista do planeta, com receitas da ordem de US$380 bilhões em 2008. Durante anos, principalmente na década de 80, período no qual o faturamento passou de US$1,6 bilhão para US$ 32,6 bilhões, um crescimento médio anual de 35%, o Wal-Mart apresentou fluxos de caixa livres consistentemente e consideravelmente negativos, apesar da valorização de suas ações. Como explicar essa contradição? No caso do Wal-Mart, os fluxos de caixa negativos foram resultados de um gigantesco plano de investimentos em oportunidades com retornos acima do custo de capital, portanto, geradoras de valor.

Observa-se, assim, que a definição de uma métrica interna para mensurar a criação de valor para o acionista não é tarefa trivial. Nesse sentido, na década de 80, a Stern Stewart desenvolveu o conceito EVA®, que sistematiza a aplicação da antiga noção do lucro residual. Ou seja, para que o investidor obtenha uma taxa de retorno adequada, o retorno deve ser grande o suficiente para que, no mínimo, compense o risco do capital investido no longo prazo. Matematicamente, o EVA® é o resultado operacional após impostos subtraído de um encargo de capital, que é todo o capital líquido investido, multiplicado pela taxa ponderada entre custo de capital próprio e de terceiros. O fato de haver uma melhoria da medida de EVA® de um período para outro significa geração de valor ao acionista. O EVA® é, portanto, uma métrica interna que pode ser usada como ferramenta de gestão e como medida de resultado para as decisões operacionais, independente do humor dos mercados, sempre visando a adicionar valor ao negócio.

Diferentemente do cálculo do fluxo de caixa, no qual os fluxos de investimentos são deduzidos do caixa gerado pela operação no momento em que ocorrem, no cálculo do EVA® o custo do capital investido é diferido no longo prazo, acompanhando o benefício gerado pelo investimento. Ainda assim, quando descontados a valor presente, tanto o fluxo de caixa livre como o EVA® resultam no mesmo valor. Além dessa identidade matemática, o EVA® oferece aos administradores a vantagem de possibilitar a mensuração e a análise do desempenho da empresa período a período.

É natural que, no longo prazo, o valor das ações e o resultado do EVA® gerado tendam a convergir. Porém, enquanto o valor das ações possui alta volatilidade, devido a fatores conjunturais, o EVA® é uma medida mais consistente e reflete os resultados entregues pela gestão na condução dos negócios.

A premiação dos executivos deve estar alinhada à criação de valor de longo prazo. Incentivos incorretos podem levá-los a cometer ações que vão de encontro aos interesses dos acionistas, gerando resultados desastrosos para a companhia. E, por isso, principalmente em momentos de crise, os gestores não devem tomar decisões buscando resultados somente de curto prazo, seja por meio da maximização do fluxo de caixa, seja por meio da formação um grande “colchão” de liquidez, muito acima das necessidades estratégicas do negócio. A atitude sensata é de sempre, mesmo em meio a crises, buscar investimentos que remunerem o custo de capital ou liberar ativos com retornos abaixo do dele. Resumindo, o objetivo, em qualquer momento, tanto de acionistas como de executivos, deve ser o de maximizar o EVA® e adicionar valor ao negócio.


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