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Preparando o terreno
Medidas para colocar a casa em ordem e se preparar para a vida de companhia aberta

, Preparando o terreno, Capital Aberto

Uma vez decidido que a abertura de capital é mesmo o caminho para a sua empresa, uma série de providências precisam ser tomadas para preparar a oferta inicial de ações. Da seleção dos intermediadores à montagem da equipe interna, passando por uma revisão na estrutura societária, essa fase marca o início de um processo intenso em que o envolvimento direto dos principais acionistas é fundamental.

Tal estágio contempla a montagem das demonstrações financeiras e a revisão dos processos de controle, que serão a base para os bancos calcularem o valor da companhia (valuation). É também o momento de remodelar a estrutura societária vigente, se necessário, ou cindir as partes do negócio que se pretende vender. Nesta fase, a companhia deverá ainda contratar os bancos e outros consultores com os quais pretende trabalhar, além de comunicar o projeto para o público interno.

Como em toda grande obra, é a montagem dos alicerces que irá definir a robustez e o preparo para enfrentar inevitáveis turbulências. Selecionar bem aqueles que irão lançar as bases desse projeto, mantendo-se atento a todos os detalhes, é imperativo para uma estréia em grande estilo.

Separando o joio do trigo, para vender só o que interessa


Dez meses antes de abrir o seu capital, a sucroalcooleira São Martinho realizou uma reorganização societária para segregar os ativos que não estavam relacionados à sua atividade principal, como a exploração e o aproveitamento de jazidas minerais, atividades de pecuária e de construção civil. O grupo estava dividido em duas empresas principais: a Companhia Industrial e Agrícola Ometto (antiga Usina Iracema) e a Usina São Martinho. A Ometto detinha 11,4% do capital social da São Martinho que, por sua vez, participava de outras oito sociedades.A primeira providência foi transferir essas participações para empresas de capital fechado. A segunda, tornar a Usina São Martinho uma subsidiária integral da Companhia Industrial e Agrícola Ometto, por meio de uma operação de incorporação de ações. Os antigos acionistas, que detinham 88,6% do capital da Usina São Martinho, receberam ações da nova companhia.A medida permitiu que a estrutura de participações fosse simplificada, conferindo maior transparência ao fluxo de geração de resultados. Possibilitou também que a companhia objeto da oferta abarcasse apenas os ativos relacionados à industrialização da cana-de-açúcar, fabricação e comercialização de açúcar, álcool e seus derivados.A M. Dias Branco passou pelo mesmo processo, cindindo as atividades não-relacionadas ao ramo de alimentos (como hotelaria, operação de portos privados e incorporação de imóveis residenciais) da estrutura da companhia que realizou o IPO em outubro de 2006.

Quais providências devo tomar quando decidir abrir o capital?
A primeira coisa a fazer é avaliar a necessidade de ajustes nas estruturas societária e fiscal, já que a maior parte das companhias que abriram o capital recentemente passou por um processo prévio de reorganização. Todos os atuais acionistas desejam permanecer na empresa após a oferta? Será necessário ajustar participações ou permitir a saída de sócios antes dela? E quanto à segregação de ativos ou de negócios não-relacionados à atividade principal? Mauro Guizeline, sócio do TozziniFreire Advogados, explica que o propósito dessas adaptações é transformar “estruturas arcaicas”, que geralmente utilizam mais de uma pessoa jurídica para realizar negócios, ou afastar procedimentos e hábitos considerados pouco saudáveis dentro do aspecto societário. Para identificar onde estão os ativos essenciais e congregá-los numa só empresa, cindir o restante, acomodar os interesses e as participações dos diferentes sócios e, ainda, pesar os efeitos fiscais dessas mudanças, é fundamental contar com o conhecimento de um escritório de advocacia com experiência na área. “O objetivo de uma reestruturação pré-IPO é garantir que o fluxo de resultado e, consequentemente, da origem dos dividendos, fique transparente para o investidor”, diz Carlos José Rolim de Mello, sócio do Machado Meyer Sendacz e Opice Advogados. A história da usina São Martinho, que abriu o capital em fevereiro deste ano, ilustra bem um processo de reestruturação societária anterior a uma oferta inicial de ações (veja quadro ao lado).

Quem deve ser envolvido nesse processo de reestruturação?
O ideal é que se forme uma equipe para “arrumar a casa”. Antonio Manuel França Aires, sócio do Demarest e Almeida Advogados, explica que, além de pensar uma eventual reestruturação, esses profissionais devem levantar contingências e fatos importantes que possam afetar o futuro e, consequentemente, a precificação das ações; organizar a documentação jurídica da empresa; realizar alterações estatutárias; formalizar contratos “não escritos” com administradores e, por fim, ajustar as demonstrações financeiras. Para que essas atividades possam ser realizadas, a equipe deve envolver, além dos advogados, representantes do departamento de controladoria, assessores financeiros e, claro, contar com o comprometimento dos principais executivos para que as decisões envolvidas sejam tratadas com prioridade. “Esse time deve ser destacado para cuidar de todo o processo sem que a sua dedicação afete negativamente o funcionamento da empresa, o que pode levar à necessidade de novas contratações”, destaca Aires. Ana Carolina de Salles Freire, sócia do TozziniFreire que participou de diversas operações do tipo, recomenda que os trabalhos de governança — como montagem de conselho com membros independentes e adaptação dos sistemas internos de controle — sejam desenvolvidos simultaneamente à reestruturação societária.

Que outros ajustes devo realizar antes da oferta?
O mais importante deles é adaptar o sistema de apuração dos números financeiros, estabelecendo as pontes necessárias entre os sistemas de controle gerencial e a contabilidade. Uma das exigências para abrir o capital é apresentar as demonstrações financeiras dos últimos três anos auditadas. Como o sistema contábil de uma empresa fechada nem sempre observa os critérios aplicáveis a uma companhia de capital aberto, muitas vezes é necessário reconstituir os números dos exercícios anteriores — um processo para o qual a equipe de contabilidade da empresa nem sempre está preparada, principalmente por falta de experiência. Edimar Facco, sócio diretor de auditoria da Deloitte, diz que uma solução possível é contratar uma empresa especializada para auxiliar na elaboração dos números que serão auditados posteriormente. “O problema nesses casos é que os profissionais da empresa contratada, apesar de conhecerem a técnica, não conhecem a empresa e seu histórico e, portanto, precisam trabalhar em conjunto com a equipe interna.” Durante essa etapa de reconstrução do passado, é recomendável que as necessidades de ajustes identificadas sejam implementadas em paralelo. Essa organização dos controles internos permitirá à empresa atingir o grau de transparência necessário, alinhando conceitos e acertando as métricas. Segundo José André Viola Ferreira, sócio de auditoria da Terco Grant Thornton, a estrutura de retaguarda deve estar preparada para obter informações no prazo certo e com a profundidade adequada, assegurando que os sistemas de controle gerencial estejam adaptados para os critérios que o mercado lê e exige.” Trata-se de implementar uma cultura de fechamento contábil em que toda a empresa esteja voltada ao processo de divulgação — uma estrutura raramente encontrada no ambiente de capital fechado e que demanda uma completa revisão no modo de trabalhar e, na maioria das vezes, investimentos significativos em tecnologia. O ideal é que essa estrutura de retaguarda contemple mecanismos que permitam o monitoramento pela alta administração e pelo conselho e uma avaliação regular da segurança desses dados.

É a firma de auditoria que se encarrega do trabalho de adaptação dos controles internos?
Não. Mauro Terepins, presidente da Terco Grant Thornton, lembra que o auditor não pode criticar um sistema que ele mesmo tenha preparado. “Seu papel é confirmar se os números elaborados pela empresa estão corretamente documentados e se atendem aos padrões contábeis estabelecidos por lei, além de endossar, perante o mercado, a eficácia dos sistemas de apuração.” Facco, da Deloitte, diz que, no entanto, a auditoria pode identificar com a empresa os recursos de que ela já dispõe e aqueles que deverão ser providos por terceiros. “Montamos uma linha do tempo e apontamos os procedimentos que podem ser conduzidos em paralelo, sem concorrer com a reconstrução das demonstrações”, afirma o auditor. Diego Fresco Gutierrez, sócio da PricewaterhouseCoopers, acrescenta que “a firma pode até criticar o que existe e recomendar melhorias, contanto que não as desenhe ou implemente”. Isso por que a principal missão da auditoria é justamente identificar inconsistências nos números apresentados, numa espécie de teste de força das demonstrações apresentadas. O auditor da Price aconselha que esse trabalho de montagem do sistema de controles internos e de suporte à divulgação de informações financeiras esteja concluído no momento da oferta. Mas reconhece que, muitas vezes, isso não ocorre na prática. “Existe um entendimento de que a dinâmica do mercado nem sempre permite uma adaptação completa dos sistemas, visto que ela consome tempo e pode implicar na perda do melhor momento para realizar a oferta”, afirma Gutierrez.

Quais critérios devo utilizar para selecionar a auditoria?
Os executivos dos bancos de investimento, advogados, investidores e os próprios auditores ouvidos pela Capital Aberto concordam que o mais importante deles é a reputação da firma no mercado. Quanto mais respeitada, maior a confiança dos investidores de que as informações apresentadas são consistentes e verdadeiras. Experiência internacional é outro fator que deve pesar em seu processo de escolha, visto que uma das exigências dos segmentos diferenciados de governança da Bovespa é a apresentação de demonstrações financeiras conforme o padrão internacional (IFRS) ou o norte-americano (US Gaap). Experiência no setor de atuação da empresa é um diferencial importante, visto que a familiaridade dos profissionais de auditoria com a dinâmica e as métricas específicas de cada indústria não apenas agregam eficiência e agilidade ao trabalho, como conferem mais credibilidade aos números analisados.

Quanto tempo preciso para preparar as demonstrações?
Depende do estágio em que o sistema atual se encontre. É um processo que pode levar entre três e 12 meses. Como este é um dos principais gargalos num projeto de abertura, é importante trabalhar com antecedência para garantir a qualidade dos resultados. Diego Fresco Gutierrez, da PricewaterhouseCoopers, lembra que as demonstrações financeiras são um dos principais elementos utilizados pelos bancos para estimar o valor de mercado da companhia. Há empresas que já adotam as práticas contábeis, contam com sistemas de controle que integram os dados gerenciais aos contábeis e ainda não são auditadas. Para estas o tempo de elaboração das demonstrações será certamente menor do que nos casos em que o sistema está estruturado apenas para atender às exigências do Fisco. Há outras, ainda, em que os números já são auditados, mas por uma firma de pequeno ou médio porte. Nestas, tudo o que precisa ser feito é a transição para a nova firma e o ajuste de alguns aspectos apenas para o último exercício. Edimar Facco, da Deloitte, ressalta que, quanto mais sólidos forem os controles internos, menor será a extensão dos trabalhos nessa fase. Ele pondera, no entanto, que não adianta entrar na guerra para contar os mortos. “É fundamental ser realista e não subestimar a quantidade de trabalho requerida, tendo em mente que o limite da velocidade é justamente a acurácia dos números.”

E quando devo contratar o banco que irá coordenar a operação?
Esse momento pode variar, também dependendo da situação de cada empresa. Há aquelas que preferem contar com um banco desde o princípio, antes mesmo de a decisão estar tomada. Bruno Padilha, diretor do banco de investimentos do Unibanco, considera esse o melhor cenário. “O trabalho que realizamos de preparação com empresas dura cerca de dois anos e envolve o desenho de um bom plano de negócios, a adequação da estrutura de capital, aquisições para ganhar massa crítica, reestruturação de dívida e organização societária, além de planejamento fiscal e tributário.” Nesses casos, a empresa pode contar com o conforto extra de vir a mercado pelas mãos de uma instituição financeira que conhece bem a sua história. Há também casos em que a empresa é procurada por um banco ou mais bancos que nela identificam um bom potencial para a abertura de capital. Se o setor de atividade não for muito conhecido e se não houver dados de desempenho suficientes para o trabalho de estimativa do valuation, ter as demonstrações financeiras prontas e em processo de auditoria será fundamental para que o banco possa começar a trabalhar. José Olympio Pereira, diretor do banco de investimentos Credit Suisse, afirma que, no mínimo, são necessárias cerca de 12 semanas para realizar uma oferta, embora considere que este não seja o tempo de relacionamento mais recomendado. “A responsabilidade quanto ao preparo da empresa para a oferta é do coordenador líder, que precisa dedicar um tempo mínimo para garantir a qualidade de sua avaliação.” Olympio lembra que cabe ao banco recomendar, em determinados casos, que a companhia segure a oferta e se prepare melhor. Ou, então, que realize uma colocação privada, sem registro na Comissão de Valores Mobiliários.

Muitas ofertas utilizam dois bancos como coordenadores. Existe uma estrutura ideal? Devo contratar pelo menos um banco internacional?
A vantagem de se trabalhar com dois bancos coordenadores, na opinião de Bruno Padilha, do Unibanco, é ter mais de uma instituição envolvida nas discussões de valuation, tornando o processo mais eficiente. Outros especialistas também apontam essa como a estrutura ideal, especialmente porque permite contratar um banco nacional e outro estrangeiro e, desta forma, contar com a expertise de cada um em seus mercados de origem. Mas há quem considere a necessidade de um banco internacional discutível, já que as grandes instituições locais com experiência em ofertas de ações já têm presença lá fora, e que os investidores interessados em papéis brasileiros estão bem mapeados. Estatísticas não-oficiais apontam que cerca de 200 institucionais correspondem a 90% dos investidores que aplicam recursos no País. Assim como no caso das auditorias, a experiência do banco com empresas do seu setor de atuação deve ser computada como vantagem, especialmente porque os executivos da instituição já têm relacionamento estabelecido com investidores deste segmento e conhecem bem os aspectos mais valorizados por eles. “Quanto maior for o conhecimento da indústria, melhor será a capacidade de auxiliar a companhia no processo de educação do investidor”, afirma Alberto Kiraly, do Banco Espírito Santo. Outro aspecto crucial, mencionado por 100% dos especialistas entrevistados, é o envolvimento dos executivos seniores do banco no desenho e na condução da oferta. “Quanto mais envolvidos diretamente em todo o processo, maior o sinal de que aquele é um negócio importante para o banco”, diz Padilha. Antonio Manuel França Aires e José Setti Diaz, sócios do Demarest e Almeida Advogados, chamam a atenção para o cronograma das outras ofertas em que o banco estiver trabalhando no momento, visto que, quanto maior o número de lançamentos programados para uma data próxima do seu, menor será a capacidade de dedicação exclusiva. O quadro na próxima página ilustra como companhias que realizaram IPOs recentemente conduziram o processo de seleção dos bancos coordenadores.


E quanto às chances de obter uma boa cobertura de analistas? Este também deve ser um critério na hora de contratar o banco?
Os bancos dizem que sim, porque é sempre bom listar-se em bolsa com pelo menos uma ou duas equipes de pesquisa qualificadas acompanhando o papel. Mas é importante que você tenha ciência do que isso significa. O trabalho que os analistas irão realizar deve ser independente dos objetivos da equipe envolvida com o IPO. Enquanto o papel dessa última é vender a operação ao mercado, o da equipe de pesquisa é avaliar as perspectivas de valorização e, de acordo com elas, recomendar a compra, a venda ou a manutenção das ações. Existe, portanto, a chance de o analista do banco que você contratou recomendar venda para o seu papel, certo? Em teoria a resposta é sim, e esta chance deveria ser real, para benefício de todo o mercado. É essencial que os conflitos de interesses entre essas duas áreas (pesquisa e banco de investimentos) sejam bem administrados pela instituição. Vale lembrar que a credibilidade dos relatórios publicados por cada banco depende diretamente de sua isenção.

E quanto aos advogados?
Geralmente, quatro escritórios diferentes atuam numa oferta de ações: dois representando a companhia, dois representando o(s) banco(s) coordenador(es) — isso porque um deles se dedica a atender às exigências do Direito brasileiro e o outro, as do Direito internacional. Ana Carolina de Salles Freire, do TozziniFreire, diz que a distribuição das atividades entre cada um dos quatro escritórios é muito bem definida e que, como os coordenadores costumam trabalhar sempre com as mesmas bancas e até recomendar as de seus clientes, as equipes estão habituadas a trabalhar juntas, numa série de ofertas diferentes. Os advogados da companhia se encarregam, primordialmente, de escrever o prospecto e preparar o processo de registro como companhia aberta junto à Comissão de Valores Mobiliários. Os advogados do(s) banco(s) coordenador(es) cuidam de todos os documentos relacionados à oferta propriamente dita, como os contratos de distribuição e estabilização, pedido de reserva, avisos ao mercado (melhor detalhados a partir da página 26). Apesar dessa distribuição, todos participam, junto com a auditoria, da revisão do prospecto, que é o documento mais importante de toda a oferta. Os critérios a observar no momento de contratar o escritório são basicamente os mesmos detalhados no caso do banco e da auditoria. Lucas Guimarães, da Positivo Informática que estreou na bolsa em outubro do ano passado, recomenda também que “se consulte os diretores financeiros de outras companhias para pegar referências do trabalho dos escritórios pré-selecionados”.


Na hora de escolher o banco, histórico e afinidade contam pontos


Ao procurar o banco de investimentos para estruturar uma oferta inicial de ações, empresas observam critérios de seleção que vão da presença internacional da instituição ao compromisso de envolvimento pessoal dos principais executivos no projeto, passando por uma avaliação criteriosa do histórico de operações já realizadas. Enquanto algumas optam por contratar uma casa com a qual já tenham relacionamento, outras preferem partir para um processo tradicional de concorrência para fornecedores de serviços.A Positivo Informática, que fez o IPO em outubro de 2006, se valeu de um processo interessante para selecionar o banco que iria coordenar a sua estréia em bolsa. Lucas Guimarães, diretor vice-presidente financeiro e de Relações com Investidores, conta que era exigida de cada concorrente a apresentação de um case investment da Positivo, que incluía um exercício de simulação de valuation. Esse modelo permitia avaliar o quanto os bancos que buscavam o mandato haviam entendido do negócio e do potencial de crescimento da empresa. “O case investment revelava a percepção de valor do banco e, consequentemente, indicava a maneira com que iria vender a companhia para os investidores durante o processo de bookbuilding”, afirma o diretor.A São Martinho promoveu uma concorrência, mas acabou selecionando um banco com que já tinha trabalhado num projeto de estudo de novos mecanismos de financiamento, quando começou a considerar a possibilidade de emitir debêntures, três anos antes do IPO.A Profarma, que contou com o auxílio de uma assessoria especializada durante todo o processo de abertura de capital, decidiu ouvir cinco instituições diferentes em seu processo de concorrência. Um dos critérios de decisão mais importantes utilizados pela distribuidora de produtos farmacêuticos foi o histórico de performance das ofertas de cada uma, diz o diretor administrativo financeiro e de Relações com Investidores, Max Fischer.

Há também as companhias que são procuradas por bancos interessados em lhes propor a abertura de capital. Foi o que aconteceu com a M. Dias Branco que, após a aquisição da marca de massas e biscoitos Adria, ganhou projeção nacional e despertou o interesse dos bancos de investimento. A empresa avaliou três propostas antes de se decidir. Marcos Pimentel de Viveiros, diretor de controladoria societária e gerencial, chama a atenção para um outro quesito importante: a empatia entre as equipes. “Afinidade e confiança são fundamentais na escolha de pessoas que vão ser colocadas dentro de casa, terão acesso a todos os seus segredos e com as quais se vai conviver num momento de trabalho e de pressão intensos.

E internamente, quem devo envolver na estruturação da oferta?
No início, os principais acionistas e executivos, em especial o financeiro e o jurídico. Antonio Felix de Araújo Cintra, sócio do TozziniFreire, observa que “o bom andamento da oferta está diretamente relacionado ao envolvimento do controlador”. Antonio Manuel França Aires, do Demarest e Almeida, destaca que, ao acompanhar de perto todo o processo, o principal acionista, que muitas vezes é o fundador, vivencia como será trabalhar com acionistas minoritários e ganha a experiência de enfrentar as exigências do mercado. Isso não significa que ele precise participar de todos os minutos de cada reunião, mas que esteja sempre disponível para os responsáveis pela condução do processo. Uma solução interessante é ter reuniões fixas para atualizar a todos sobre o andamento do processo. Lembre-se que a montagem de uma oferta de ações demanda dedicação exclusiva de profissionais chave e que o seu envolvimento no projeto não pode colocar em risco o andamento das atividades da empresa. É comum destacar um executivo para liderar o processo e providenciar um substituto para a sua vaga. Também é importante ter em mente que a equipe de coordenação da oferta pode precisar da cooperação de diversos departamentos e profissionais da empresa, em momentos diferentes. Mas estes não precisam, necessariamente, conhecer o projeto em toda a sua dimensão, desde que os diretores responsáveis por cada área estejam conscientes do grau de prioridade que as solicitações da equipe coordenadora da oferta devem ter.

Qual a hora certa de comunicar aos funcionários a abertura de capital da companhia?
Esse momento pode variar de uma empresa para outra e também de acordo com a posição ocupada pelo funcionário na hierarquia. Mais uma vez, essa decisão depende de uma série de fatores, que têm de ser ponderados caso a caso. Quanto mais estratégica for a contribuição de um determinado profissional, mais cedo ele deverá ser envolvido no projeto. Os especialistas consultados pela reportagem recomendam que todas as pessoas que participarem da estruturação da oferta assinem contratos de confidencialidade, prevendo punições em caso de vazamento das informações. Os outros funcionários administrativos só devem ser avisados sobre o início da oferta quando o pedido de registro for protocolado na CVM, momento em que a informação se torna oficialmente pública. A maior parte das companhias opta por organizar eventos formais para a divulgação do projeto e a exposição da forma como cada profissional atuará. Em empresas nas quais a estrutura é muito fragmentada, a equipe de comunicação interna costuma produzir informativos. Foi o que aconteceu na Diagnósticos da América, por exemplo: todos os funcionários dos laboratórios que fazem parte da rede receberam um jornal que explicava o que era uma ação, quem podia comprar e que respostas eram as mais adequadas a perguntas que os próprios clientes do laboratório poderiam fazer a enfermeiros, atendentes e médicos a respeito das ações da companhia. A Gol Linhas Aéreas desenvolveu um portal de acesso restrito, uma espécie de intranet, por meio do qual todos os funcionários têm acessos aos dados que são divulgados para o mercado. Antes disso, todos passaram por um treinamento presencial a respeito do significado de ser uma companhia aberta. Na Totvs, onde a estrutura conta com um número bem menor de níveis hierárquicos, foram realizados treinamentos individualizados para cada área (veja detalhes no quadro abaixo)


É recomendável contratar uma assessoria especializada para orientar a administração durante o processo de oferta?
Depende do caso. Há empresas que optam por fazê-lo antes de ter decidido se o IPO é a solução para suas necessidades de financiamento. Nestas situações, as assessorias auxiliam na identificação do melhor caminho a seguir. O fato de terem contatos tanto com os bancos quanto com fundos de investimento privados (private equity) é visto como um fator positivo. A Profarma, que realizou sua oferta inicial de ações em junho de 2006, já trabalhava desde abril de 2005 com uma assessoria. Max Fischer, diretor financeiro e de RI da distribuidora de produtos farmacêuticos, conta que optaram por contratar a assessoria justamente porque não tinham familiaridade com as opções disponíveis para a captação de recursos. “Eles nos auxiliaram muito na busca de informações sobre as diferentes possibilidades”, diz. Ele acrescenta que a figura do assessor foi muito importante durante o período de preparação e estruturação da oferta, pois ajudou a coordenar todas as instituições envolvidas. Outras empresas optam por trazer um profissional do mercado para dentro de casa, como no caso da usina São Martinho. A atual gerente de RI foi contratada um ano antes do IPO e participou, junto com o diretor financeiro e com o presidente, de toda a montagem da oferta, desde o processo de seleção do banco coordenador. Outra que também fez essa opção foi a M. Dias Branco, que contratou como diretor de controladoria o advogado associado de um grande escritório nacional, que havia trabalhado com a empresa na operação de aquisição da Adria.

Quando devo montar a equipe de Relações com Investidores?
De acordo com João Pinheiro Nogueira Batista, presidente do Instituto Brasileiro de Relações com Investidores (Ibri) e co-presidente da Suzano Petroquímica, o ideal é contratar o profissional de RI depois que a decisão de abrir o capital estiver tomada. “É desejável que esse executivo esteja no projeto de oferta desde seu início, participando da contratação dos intermediários, da confecção do prospecto e de todo o trabalho de venda da operação no road show.” Há empresas que deixam para estruturar os seus departamentos de Relações com Investidores depois da realização da oferta, o que, na opinião do presidente do Ibri, deve ser evitado. Ele recomenda também que esse profissional seja procurado prioritariamente “dentro de casa”, uma vez que a profundidade de conhecimento da empresa, de sua história e das especificidades de seu setor de atuação é determinante para a construção de uma boa imagem junto à comunidade de investidores. Ele observa que um profissional sem experiência prévia na área pode deter as outras habilidades requeridas para o cargo — como facilidade de comunicação e conhecimentos na área jurídica e de finanças.

E quanto à comunicação externa, que providências devo tomar?
A primeira medida é adaptar o website da companhia. Boa parte das empresas que realizou IPOs recentemente preferiu contratar os serviços de uma consultoria especializada, que possa montar um programa de comunicação dirigido exclusivamente para o mercado. Rodolfo Zabisky, presidente da MZ Consult, atendeu muitas delas e resume o trabalho realizado em três passos. “O primeiro é fazer um levantamento de como os pares daquela empresa se comunicam com o mercado, incluindo uma avaliação das práticas adotadas pelos concorrentes internacionais”, conta. Depois, um levantamento das bases de acionistas interessados e de analistas que cobrem aquele setor, de modo que se tenha um mailing preliminar, que será utilizado no processo de divulgação da oferta. O terceiro passo é treinar os principais executivos para o relacionamento com investidores, analistas, imprensa especializada e o público em geral. Zabisky defende que a maneira com que uma companhia se comunica com o mercado influencia diretamente a percepção de risco do investidor. “Por isso, é importante desenhar uma estratégia direcionada ao mercado que lhe permita não só fornecer as informações desejadas, mas também se diferenciar.”

Treinamentos simulam diversas situações da vida de uma companhia depois de abertaNa correria que usualmente precede a abertura de capital, há uma preocupação que não consta da cartilha de obrigações com o regulador ou com o banco, mas deve ser igualmente prioritária. Trata-se do treinamento de pessoas chave para o seu ingresso neste mundo totalmente novo que é o mercado de capitais, no qual haverá muito mais exposição e, por isso mesmo, mais riscos.

As equipes de planejamento e de Relações com Investidores da Totvs passaram por um treinamento que envolvia as mais diversas possibilidades de uma companhia aberta, como as ofertas hostis de aquisição de controle, por exemplo. Ouviram também sobre as conseqüências danosas do uso indevido de informações privilegiadas (insider trading), em sessões que incluíram a transmissão de filmes norte-americanos considerados clássicos como “Wall Street, poder e cobiça”, em que um jovem corretor da bolsa se associa a um outro mais experiente e bem-sucedido e passa a realizar negócios de caráter duvidoso, guiado pelo princípio de que a cobiça é uma virtude.

Foi realizada ainda uma simulação de todo o processo de preparo, convocação e realização de assembléias gerais de acionistas envolvendo as duas equipes, sob a coordenação de um escritório de advocacia externo. José Rogério Luiz, vice-presidente financeiro e diretor de RI, conta que essa simulação chegou a envolver uma assembléia fictícia em que os executivos da companhia representavam diferentes papéis — acionistas pessoa física, investidores institucionais e advogados portadores de procurações e instrução de voto.

Com relação à governança, devo fazer adaptações devo fazer antes da listagem nos segmentos diferenciados da bolsa?
Um passo fundamental e recomendado pelo Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) é a montagem de um conselho de administração e a estruturação da sua forma de atuação. José Guimarães Monforte, presidente do IBGC, afirma que o conselho precisa ser tratado e posto em funcionamento como um órgão da administração e não apenas um foro dos acionistas fundadores. Ele se refere, especificamente, à necessidade de trazer para o conselho a perspectiva de profissionais externos, independentes, e afastá-lo de uma composição em que só participem os principais acionistas e pessoas ligadas a ele — uma estrutura que o mercado costuma rejeitar. O IBGC também recomenda que a empresa contrate uma auditoria e passe a publicar as informações financeiras no formato exigido pelo mercado, dando uma demonstração de transparência. Ana Carolina de Salles Freire, do TozziniFreire Advogados, observa que as boas práticas de governança corporativa e as medidas de transparência devem ser colocadas em curso antes da abertura, para que os funcionários possam se adaptar à nova cultura e adequar seu discurso a um ambiente competitivo. Algumas empresas que já declararam o plano de fazer um IPO no futuro — como Nutrella, Netuno Pescados e Democrata Calçados — alteraram suas estruturas como forma de se preparar para a nova realidade. Outras, que abriram o capital recentemente, como a Totvs, também já haviam sofrido transformações para se aproximar do ambiente de capital aberto (veja quadro abaixo).

Mesmo que o IPO seja um projeto para o futuro, governança pode começar desde jáNo intuito de adaptarem suas estruturas às exigências do mercado, muitas empresas que têm na abertura de capital um projeto de longo prazo aderiram a boas práticas de governança bem antes do IPO. Algumas delas ainda nem chegaram à bolsa, mas decidiram que a melhor forma de se preparar era aproximar o seu dia-a-dia da realidade de uma companhia aberta.

A Netuno Pescados, com sede em Recife (PE), instituiu um departamento de Relações com Investidores e tem seus números auditados mesmo sem ter uma expectativa de prazo definida para sua chegada à bolsa. O plano de abertura de capital reflete a visão dos acionistas fundadores para o futuro do setor. Eles esperam uma consolidação da indústria pesqueira semelhante à que foi vivida pela de frango há pouco mais de uma década — e, nesse cenário, a produtora e processadora de peixes e frutos do mar, que já figura entre as maiores da América Latina, aspira ser um player poderoso do mercado mundial e mira o exemplo dos grandes frigoríficos nacionais. Há dois anos, a Netuno recebeu um aporte de recursos do Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDES). O financiamento do BNDES, aliás, é um traço que as empresas com planos futuros de abertura de capital e estruturas de governança adiantadas têm em comum.

A fabricante de pães gaúcha Nutrella teve na venda de 25% de seu capital o ponto de partida para as transformações na estrutura de gestão, que foram marcadas pela substituição de membros da família por gestores profissionais e pela formação de um conselho de administração. A Democrata Calçados, do interior de São Paulo, foi outra que optou por nomear diretores executivos para posições antes ocupadas pelos sócios fundadores, que passaram a fazer parte de um colegiado cuja função é acompanhar de perto os resultados obtidos por essa nova diretoria.

A Totvs, que abriu o capital em março de 2006, implementou um plano de opções de ações para seus executivos dois anos antes. A proposta era incutir a cultura de alinhamento de interesses e de remuneração atrelada à geração de resultados, de maneira a chegar à bolsa em sintonia com os seus pares.


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