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Agenda para a transparência
Mesmo com o avanço recente, ainda precisamos nos adaptar ao padrão mundial

, Agenda para a transparência, Capital AbertoAs companhias brasileiras listadas em bolsas de valores valem hoje mais de R$ 2 trilhões. Nos últimos 20 meses, em agosto de 2007, 104 companhias abriram o seu capital, captando no mercado R$ 71 bilhões, sendo R$ 51 bilhões do exterior. São todas notícias alvissareiras, mas que geram obrigações e responsabilidades correspondentes. Neste contexto, cabe às entidades ligadas ao mercado de capitais ampliar e acelerar o seu envolvimento na melhoria da prestação de contas e na adoção das melhores práticas mundiais de governança corporativa. Para tanto, proponho aqui a discussão de três pontos que ainda carecem de atenção.

O primeiro é o distanciamento dos auditores independentes dos analistas de mercado e vice-versa. Os analistas fazem suas análises e emitem recomendações principalmente com base nos press releases das companhias e nas informações prestadas pelos departamentos de Relações com Investidores (RIs). A maioria dos auditores e os conselheiros independentes não tomam conhecimento do conteúdo dos press releases, informações anuais (IANs) etc. Da mesma forma, os analistas não tomam conhecimento apropriado das informações contábeis, fornecidas via informações trimestrais (ITRs), e das demonstrações contábeis anuais.

Em países que têm bolsas de valores com grande volume de operações, os auditores e os conselheiros independentes sempre acompanham, revisam e aprovam as matérias encaminhadas para o mercado de ações. Muitas vezes o fazem informalmente, mas sempre fazem. Ajudam efetivamente a administração a não cometer erros e lapsos. Aqui no Brasil os IANs são negligenciados por quase todos. Para as companhias com ações negociadas nos Estados Unidos, existe um formulário equivalente aos IANs, conhecido como 20-F. Como lá existem penalidades mais severas por erros e omissões na prestação de contas, todas essas companhias têm processos documentados de elaboração, revisão e aprovação desses documentos, antes de seu envio para o mercado. Acredito que um melhor entrosamento e entendimento entre auditores e analistas propiciará informações mais apuradas, claras e objetivas para todas as partes interessadas. Também é essencial que auditores e conselheiros independentes acompanhem e revisem as matérias encaminhadas pelas companhias abertas para as partes interessadas.

Em segundo, proponho refletirmos sobre algumas distorções nas demonstrações contábeis criadas pela influência tributária. Por exemplo, a amortização de ágio em cinco anos — sem fundamento econômico — e a contabilização de impostos de incentivos fiscais na conta de resultados como se devidos fossem, entre outras. Esses lançamentos de despesas, que não refletem despesas “reais”, trazem benefícios na redução de imposto sobre a renda. Elas são corrigidas nos pro formas incluídos nos press releases. Como existe pouca orientação da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) sobre a forma de preparar e divulgar informações pro forma, há muita criatividade no Brasil na sua preparação.

Nos Estados Unidos há regulamentação do que se pode ou não fazer nos press releases. Considerando as deficiências na legislação societária, a CVM permite a adoção de melhores práticas contábeis, previstas nas NICs, nas demonstrações financeiras consolidadas, desde que haja uma reconciliação com as informações contábeis preparadas de acordo com a legislação societária. Na prática, poucas empresas usam esta prerrogativa, para melhorar o conteúdo técnico dos balanços submetidos ao mercado acionário. Com a adoção das normas internacionais de contabilidade e de auditoria e a introdução de uma regulamentação de emissão de pro formas, inspiradas em materiais técnicos usados nos mercados de capitais mais maduros, acredito que teríamos mais confiabilidade nas informações contábeis para a tomada de decisão pelas partes interessadas.

O último ponto diz respeito à incipiência da auditoria independente no País. Temos no Brasil em torno de 1 auditor independente para 18 mil habitantes. Nos mercados desenvolvidos há, em média, cerca de 1 auditor independente para cada 3 mil habitantes. Inúmeros países ricos têm 1 auditor independente para cada mil habitantes. Parece que fugimos da prestação de contas como o diabo foge da cruz. Fora do Brasil, a auditoria é obrigatória para empresas na maioria dos países e, com algumas exceções, para micro e pequenas empresas. Retidão e transparência se obtêm por meio de uma prestação de contas clara, que é propiciada com a seriedade da contabilidade e atestada pela auditoria independente.

Ressalto ainda a importância de estarmos alinhados às normas internacionais de contabilidade para a prestação de contas. Está claro que as regras brasileiras não mais atendem às nossas demandas técnicas, nem refletem o crescimento e a complexidade do mercado financeiro, que evoluiu consideravelmente desde 1976. Novamente, o momento é de reforço da importância de se criar um clima favorável à aprovação da reforma da Lei 6.404. Ela alinhará os nossos registros contábeis aos padrões do International Accounting Standards Board (Iasb) e remeterá aos livros auxiliares a base para a tributação, removendo grande parte dos nossos desafios e problemas.

Contabilidade é a linguagem universal de negócios. Usaremos a mesma linguagem de negócios que mais de 100 países, incluindo os desenvolvidos, que já adotaram o padrão contábil global IFRS ou estão em vias de adotar. A incorporação das melhores práticas mundiais de prestação de contas ajudará efetivamente todos os tomadores de decisão.

A despeito dos desafios que ainda temos pela frente, julgo necessário destacar o trabalho extraordinário da CVM, xerife incansável e educador exemplar, desde sua instituição, em 1976. E também o da Bovespa, popularizando o mercado de ações e introduzindo o Novo Mercado para companhias abertas, com regras mais rígidas de proteção de interesse das partes envolvidas. Todavia, ambas não podem assumir sozinhas as responsabilidades de um mercado acionário com as proporções atuais. É essencial que as entidades ligadas ao mercado de capitais façam mais, chamando para si as melhorias necessárias.


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