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Que tal um auto-retrato?
Eis um bom momento para gestores de recursos refletirem sobre as críticas que afloram no Brasil e no exterior ao ativismo predatório

ed51_p40-44Os investidores institucionais foram, durante os últimos anos, os principais fomentadores das práticas de governança corporativa. Exerceram papel fundamental ao incentivar as empresas das quais são acionistas a adotar procedimentos mais transparentes e eqüitativos. Agora, o comportamento deles, principalmente em situações de embate com as companhias, está na mira do mercado, no Brasil e lá fora. Estariam as iniciativas desses “ativistas” assumindo, em algumas situações, um lado mais oportunista e menos construtivo?

A dúvida é o capítulo mais recente de um movimento que começou a ganhar musculatura em meados dos anos 90, quando o termo governança corporativa apenas começava a ganhar fama e prestígio. Organizados, engajados e determinados a agregar valor a companhias subavaliadas, investidores passaram a dar palpites na gestão, a cobrar dos administradores uma postura alinhada com os interesses dos acionistas e a lançar campanhas em favor de temas considerados relevantes para o que chamavam de boas práticas. No Brasil, a estratégia se deu, principalmente, na forma de investidores que buscavam agregar valor defendendo seus direitos como acionistas minoritários.

Com o passar dos anos, viu-se que essas iniciativas não haviam contribuído apenas para ampliar a consciência de emissores e investidores acerca das boas práticas de governança corporativa. Elas também tinham garantido ganhos robustos àqueles que se valeram delas — o que levou muita gente a pensar se, por trás de medidas supostamente moralizadoras, não estariam também interesses de curto prazo e, em alguns casos, até conflitantes com os da companhia. Tal suspeita foi ainda alimentada pela sofisticação de ferramentas que favorecem desalinhamentos desse tipo, como o aluguel de ações e os derivativos. De posse de uma posição acionária inflada por esses instrumentos — e, portanto, não correspondente à sua verdadeira participação econômica —, ativistas mal-intencionados podem se valer do direito a voto no sentido de favorecer vantagens individuais, em detrimento dos interesses das companhias.

No País, aluguéis de ações e derivativos ainda não se tornaram uma preocupação real quando o tema é o ativismo predatório. Mas os eventos que geram conflitos entre acionistas controladores e minoritários, sim. Para alguns, reações de indignação como as manifestadas por investidores nas incorporações de Telemar e Ipiranga devem-se muito menos ao mérito da questão e mais ao interesse por um ganho extra, caso a reclamação resulte em ofertas mais abonadas para os minoritários. Prova disso, segundo os críticos, seria o fato de que alguns desses investidores, quando se queixam das operações de incorporação, assumem novas posições compradas na companhia incorporada (potencial beneficiária de um aumento na oferta de troca) e vendidas na incorporadora (que, nessa hipótese, perderia a briga e teria de desembolsar mais). Em situações como essa, a dúvida é se a contenda teria sido motivada pela real percepção de um direito desrespeitado ou pela tática de criar um fato novo capaz de abrir oportunidades para uma operação de arbitragem potencialmente lucrativa na bolsa de valores.

A discussão é intrincada. Como provar que um fundo está agindo em razão de interesses individuais e de curto prazo, e não simplesmente defendendo seus direitos de forma legítima? Além do mais, em querelas como essas, é muito comum estar em jogo o critério para avaliação de determinado ativo, tipo de assunto que pode contrapor argumentos dos mais variados. Também não parece razoável afirmar que a arbitragem com posições compradas e vendidas seja suficiente para caracterizar o ativismo predatório. Faz parte da estratégia dos gestores de fundos de ações, principalmente aqueles com perfil de fundos hedge, desenhar operações de arbitragem para alavancar ou proteger seus investimentos. Do mesmo modo, está na base da filosofia de muitos investidores ampliar o valor de suas carteiras por meio de um engajamento ativo em temas como fusões e aquisições, composição do conselho de administração, política de dividendos e estrutura de capital.

A dúvida é se o investidor está motivado pelo desejo real de defender seus direitos ou pela tática de criar fatos novos para extrair um ganho extra

“Tenho uma obrigação legal de empreender os melhores esforços para rentabilizar o investimento dos meus cotistas”, afirma Marcos Duarte, sócio da Polo Capital, gestora de recursos que tem se destacado nas brigas contra os modelos de reestruturação societária propostos pelas companhias. Duarte garante que só entra numa briga quando entende que seu direito foi lesado. “Nós investimos nas companhias acreditando no bom desempenho futuro delas. É daí que vem a maior parte de nossos resultados, e não das brigas com os controladores”, afirma. Para o gestor, além de necessários para garantir o interesse dos cotistas, esses entraves têm um caráter “profilático”, no sentido de prevenir novas atitudes danosas ao mercado.

A defesa de Duarte é corroborada por um estudo do Comitê Executivo de Governança Corporativa da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), publicado em agosto, sobre o impacto dos chamados veículos de investimento alternativo sobre a governança e o desempenho das empresas. O grupo concluiu que, no geral, esses investidores atuam positivamente ao ampliar o nível de informações para o restante do mercado e fomentar o exercício ativo dos direitos de acionistas. Esse movimento, segundo a OCDE, tende a gerar melhor alocação dos recursos corporativos e maior eficiência econômica como um todo.

ZONAS DE PERIGO — A governança dos investidores institucionais foi um dos temas discutidos pela OCDE na mesa-redonda para a América Latina realizada em outubro, em Medellín, Colômbia. No relatório Institutional Investors and Corporate Governance in Latin America: Challenges, Promising Practices and Recommendations, preparado para o encontro, a organização ressaltou que devem ser oferecidas todas as condições para que os acionistas exerçam seus direitos de participação nas companhias de forma responsável e ativa. Mas alertou para a possibilidade de abuso desse direito com o intuito de manipular o mercado ou de exercer posições de controle sem a devida adequação às regras para aquisições e concorrência. No mesmo trabalho, a OCDE chamou a atenção para situações que, ao contrário das anteriores, venham a inibir o ativismo. Principalmente em grandes conglomerados financeiros, a área de gestão de recursos pode se ver desestimulada (ou até repreendida) caso pretenda exercer seus direitos em companhias que tenham relações comerciais significativas com o banco de investimento do mesmo grupo.

É por essas e outras que Daniel Blume, chefe do Departamento de Relações Corporativas da OCDE e gerente da Mesa-Redonda Latino-Americana sobre Governança, afirma que a transparência é fundamental para dirimir potenciais conflitos de interesse. Sua recomendação é para que os investidores abram informações sobre as zonas de perigo. Por exemplo, administradoras de recursos ligadas a instituições financeiras deveriam informar melhor seus clientes sobre sua política de votação em assembléias. Ao assumir uma postura mais transparente sobre estratégias e posições acionárias, os ativistas reduziriam eventuais suspeitas provenientes tanto de cotistas como do mercado. Na maioria das vezes, porém, o estilo low profile das gestoras de recursos, considerado fundamental para as tacadas de investimento se provarem bem-sucedidas, é incompatível com maiores níveis de transparência.

Renato Chaves, diretor de participações da Previ, o fundo de previdência dos funcionários do Banco do Brasil, explica por que a instituição precisa manter certa discrição sobre sua posição em questões societárias. Sinalizações desse tipo, segundo ele, podem até ser nocivas ao mercado, uma vez que influenciam outros agentes. Opinião similar tem Pedro Rudge, sócio da gestora de recursos Investidor Profissional. Segundo ele, a comunicação freqüente com o mercado pode funcionar como estratégia de marketing para influenciar as cotações. “Sempre que vejo uma manifestação pública de um gestor, procuro entender os motivos que o levaram a se pronunciar. Por que não usar essa informação em benefício próprio?”, questiona. Outro ponto a ser considerado é a eficácia da transparência em certos casos. Quando as negociações vão bem e o relacionamento entre as partes é amistoso, uma exposição pública pode prejudicar o processo.

Pesar em que medida a transparência é importante ou necessária é um desafio para os ativistas que estiverem atentos a sua própria sustentabilidade. Afinal, a boa governança, para produzir resultados satisfatórios, precisa estar em toda a cadeia do investimento. Depois de muito contribuírem para a evolução do mercado com suas propostas, esses investidores têm, agora, a ótima oportunidade de fazer um autoretrato. Experientes no tema, eles não vão demorar para encontrar as suas “zonas de perigo”.

Anbid vai exigir voto em assembléia

O uso do voto por investidores institucionais é uma das principais atrações do novo código de autoregulação da Associação Nacional dos Bancos de Investimento (Anbid). Até o fechamento desta edição, a versão final da minuta aguardava o aval da diretoria da entidade para ser levada à audiência pública. Preparado com a ajuda da Associação de Investidores do Mercado de Capitais (Amec), o capítulo denominado “Política de exercício de direito de voto em assembléias” visa estimular o exercício do voto, tornando-o obrigatório em todas as matérias consideradas “relevantes” (veja lista abaixo).Exceções estão previstas para os casos em que a assembléia ocorrer fora da capital de estado (e não houver voto a distância), o custo do exercício do voto não for compatível com a participação do ativo financeiro no fundo, a matéria em questão implicar conflito de interesse para o gestor ou as informações disponibilizadas pela empresa não forem suficientes para a tomada de decisão. “Quem tem participação superior a 5% na companhia deverá tomar parte em todas as assembléias. Já em matérias que dependem de quórum, a presença será obrigatória, independentemente da participação”, conta Edison Garcia, superintendente da Amec.A política deverá estar em conformidade com as diretrizes, as normas e os manuais elaborados pelo conselho de auto-regulação da Anbid. No documento devem constar os princípios gerais que nortearão o gestor, os procedimentos a serem adotados em casos de conflitos de interesses, o processo decisório e sua formalização. Os votos proferidos pelos gestores deverão ser comunicados aos cotistas dos fundos na forma estabelecida pela política. (Y.Y. e S.A.)


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