O ano de 2006 reservou fortes emoções para os mercados financeiros globais. A alta liquidez presente na economia mundial elevou o desempenho dos ativos e proporcionou um ano de condições excepcionais, na opinião da maioria dos especialistas. O mercado brasileiro de capitais, depois de um período já bastante aquecido em 2005, avançou mais de 66% no volume de ofertas registradas na Comissão de Valores Mobiliários (CVM), atingindo R$ 118,8 bilhões.
É claro que a performance dos ativos nacionais poderia ter sido ainda melhor caso o País tivesse alcançado um crescimento mais robusto. Mesmo assim, fatores como inflação e taxa básica de juros (Selic) em queda deram o tom positivo à política monetária do Banco Central, à toda a economia e ao mercado de capitais. Da mesma forma, o excelente fluxo de capitais internacional viabilizou a captação de recursos de companhias brasileiras com emissões de ações e títulos de renda fixa.
Para 2007, as perspectivas de continuidade dessa abundância de recursos estão, da mesma forma que no ano anterior, centradas nos Estados Unidos. Permanecem as dúvidas sobre os efeitos das altas consecutivas que ampliaram a taxa de juros daquele país para 5,25% ao ano, mesmo diante da aparente adaptação do mercado ao novo presidente do Federal Reserve, Ben Bernanke. Um corte da taxa, impulsionado por dados de inflação e pela redução no ritmo do setor imobiliário, seria hoje considerado ‘ideal’ pelo mercado.
“A preocupação com uma desaceleração forte continua, em especial, no mercado imobiliário”, explica Ricardo Amorim, diretor de pesquisa e estratégia para América Latina do WestLB. A projeção do executivo sobre o comportamento dos juros norte-americanos é de três cortes de 25 pontos base, com o primeiro em abril. “O cenário de leve desaquecimento é o mais provável”, afirma.
Já o diretor de mercados emergentes da Goldman Sachs, Paulo Leme, aposta que, mesmo com uma desaceleração maior da economia dos EUA, o Brasil tende a ser, mais uma vez, beneficiado pela liquidez internacional. “Há outras regiões que demandam os produtos brasileiros, em especial a Ásia, e que continuarão com um crescimento muito forte, compensando a queda dos EUA”, avalia.
No âmbito interno, a melhora da economia também é consenso entre os analistas. O risco Brasil baixou cerca de 100 pontos base no último ano e a percepção é de que o País esteja mais preparado para enfrentar adversidades externas. Daniel Araújo, diretor da Standard & Poors, reconhece que o crescimento econômico foi modesto, mas exalta a estabilidade verificada durante os escândalos políticos e, também, nas eleições. “A situação foi muito melhor do que em 2002, por exemplo”, diz. Para ele, 2007 pode ser melhor, mas não se deve esperar um avanço substancial. Crescimento baixo e reformas estruturais pendentes ainda travam o desenvolvimento — o que deixa a conquista do selo investment grade um tanto mais distante.
ANO SEGUE AQUECIDO — Para o mercado de capitais, o ano deu ótimos motivos para comemorações. Foi registrado movimento recorde de aberturas de capital e de novas emissões de ações na Bovespa (ver nota na página 6). Na opinião de Alfredo Setúbal, diretor de Relações com Investidores do Itaú e presidente da Associação Nacional dos Bancos de Investimento (Anbid), 2007 deve ser tão ou mais aquecido do que o ano passado. “Existe uma fila de empresas que contrataram bancos para IPOs e muitas emissões de companhias já listadas que estão encaminhadas. Posso dizer que é mais do que víamos há um ano”, afirma.
Em 2006, as companhias ligadas à construção civil, em especial, foram responsáveis por seis das 26 aberturas de capital. Luiz Fernando Resende, vicepresidente da Anbid, prevê ao menos 30 IPOs durante 2007, incluindo as operações que estavam em análise na CVM desde dezembro passado. “O mercado de capitais vai seguir em ebulição”, diz. Sua expectativa é que o setor de construção também continue forte este ano, acompanhado da agroindústria.
A previsão da Anbid para o Índice Bovespa neste ano, segundo Setúbal, é de valorização de 20%, o que significa uma pontuação na casa dos 52 mil pontos. A maioria dos analistas consultados pela Capital Aberto projeta o índice entre 50 a 55 mil pontos ao final de 2007.
Apenas em dezembro, o Ibovespa bateu quatro recordes e superou os 43 mil pontos. No dia 15 do mês, a valorização em relação ao final de 2005 superava 30%, o que fazia da bolsa de valores a melhor aplicação financeira do mercado brasileiro. “Se analisarmos a relação Preço/Lucro dos ativos de emergentes, os brasileiros continuam baratos. Outro aspecto é que, no Brasil, ao contrário dos outros países, a taxa de juros vai cair, o que deixa a bolsa ainda mais atrativa”, disse Amorim.
A presença dos investidores estrangeiros foi relevante em 2006. Na média, correspondeu a 35% do volume anual da Bovespa. No caso de renda fixa, as aplicações externas foram incrementadas pela Medida Provisória 281, que determinou a isenção de imposto aos investimentos de fora. O Boletim Focus, elaborado pelo Banco Central com base nas expectativas do mercado, aponta para 2007 um investimento estrangeiro estável, com ingresso de US$ 16 bilhões no Brasil. Previsões para 2007 e 2008 do Credit Suisse distribuídas a clientes no final do ano estimam volume de investimento estrangeiro estável na renda variável e levemente em queda na renda fixa.
OPORTUNIDADES PARA RENDA FIXA — Responsável por 55% das emissões de títulos privados de renda fixa, as debêntures também tendem a seguir aquecidas. “Não sei se vamos superar 2006, porque uma emissão como a da Vale do Rio Doce, por exemplo, distorce a análise do mercado como um todo”, comenta Setúbal. No dia 13 de dezembro, a Vale registrou uma emissão de debêntures no valor de R$ 5,5 bilhões. A operação representa 8,5% dos R$ 64,7 bilhões emitidos no ano. No geral, o setor financeiro ainda é o grande responsável pelas emissões. Até 15 de dezembro, mais de 70% do total (R$ 44,9 bilhões) haviam sido captados por empresas de leasing.
Uma notícia que preocupou o segmento de renda fixa privado em 2006 foi a proposta da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) para reforma da Instrução 409. Em minuta submetida a audiência pública, a autarquia obrigava os fundos de renda fixa a restringir as aplicações em ativos privados de renda fixa a 30% do patrimônio. A expectativa, contudo, é de que a medida seja menos severa que a indicada na versão inicial. O tratamento dado às debêntures será menos restritivo, afirmou Carlos Alberto Rebello Sobrinho, superintendente da CVM, durante encontro técnico da Associação Nacional das Instituições do Mercado Financeiro (Andima), realizado no final de novembro.
Outro instrumento de renda fixa que entra 2007 com o pé direito são os Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC). A expectativa é de que o interesse dos investidores por esses títulos seja crescente, uma vez que a queda do risco país diminui a rentabilidade dos títulos públicos e os juros em baixa limitam os ganhos atrelados ao CDI. As emissões de cotas de FIDCs cresceram 44% em 2006, para R$ 12,4 bilhões.
Utilizado para captações que normalmente variam entre R$ 100 milhões e R$ 150 milhões, o FIDC é uma das grandes atrações do mercado na atualidade. “Dá para crescer 100% em volume em 2007”, avalia com otimismo o CEO da Boa Esperança Recebíveis, Eduardo Rocha. Prova do potencial do instrumento é que ele vem crescendo não só em volume, mas em sofisticação, desde 2003. Também têm boas perspectivas os Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI). Ano passado, eles registraram queda de 53,1% em volume, para R$ 984,8 milhões, embora tenham dobrado em quantidade de operações. Fabio Nogueira, presidente da Brazilian Mortgages, estima um potencial para atingir até R$ 3 bilhões em 2007.
PATAMARES HISTÓRICOS — A queda dos juros se refletiu também no mercado de fundos de investimento. De janeiro a dezembro, esses instrumentos tiveram captação líquida de R$ 68,8 bilhões, significando um avanço de mais de 213% na comparação com 2005 e recorde histórico para o segmento.
A previsão da Anbid para o patrimônio dos fundos de investimento é superar R$ 1 trilhão no decorrer de 2007. Atualmente, está em R$ 904 bilhões. Os multimercados alavancaram o setor e captaram no período (em valores brutos) R$ 50,1 bilhões. Os de previdência foram responsáveis por R$ 13,1 bilhões, FIDCs, por R$ 9 bilhões e ações, por R$ 8,4 bilhões.
O crescimento dos fundos multimercados demonstra uma mudança no perfil do investidor. Na opinião de André NG, economista-chefe da Infinity Asset, com os cortes dos juros, os multis deverão representar parcela cada vez maior do patrimônio total dos fundos. “Creio que o caminho destes produtos será decisivo para a melhora do mercado”, ressaltou NG.
Rodrigo Boulos, diretor do Banco Banif de Investimento, tem opinião semelhante sobre o comportamento dos investidores no País. “A substituição de títulos atrelados aos juros por outros vinculados à inflação seguirá em 2007”, afirmou. Com isso, segundo o executivo, o mercado continuará acompanhando a demanda do investidor acostumado a aplicar em títulos públicos e em fundos tradicionais por alternativas mais sofisticadas. De acordo com dados de 2006 da Anbid, os fundos referenciados DI e renda fixa apuraram resgates líquidos de R$ 1,7 bilhão e R$ 12,2 bilhões, respectivamente.
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