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Enquanto os sucessivos escândalos internacionais colocam em xeque a eficácia das opções de ações, cresce o interesse das companhias brasileiras por esta forma de remuneração

 

ed41_p034-037_pag_3_img_001O fantasma dos escândalos corporativos voltou a assombrar o mercado norte-americano nos últimos meses, com as recentes denúncias sobre operações de backdating — opções retroativas de compra de ações para a alta diretoria, que dão aos beneficiários um ganho imediato e sem risco. Quando todos já pensavam que a chance de haver novos episódios de manipulação contábil — a exemplo daqueles que marcaram a história de ex-grandes empresas como Tyco, Enron e WorldCom — já estava soterrada sob a rigidez da lei Sarbanes-Oxley, eis que surgem novos problemas envolvendo o ganho fácil dos principais executivos em detrimento dos demais acionistas e da própria sustentabilidade da companhia. Cerca de 100 empresas — entre elas, a poderosa Apple — estão sob investigação nos Estados Unidos por suspeita de fraudes envolvendo stock options, ou opções para compra de ações, uma forma de incentivo de longo prazo (ILP) que foi deturpada por alguns executivos do alto escalão para proveito próprio.

Por aqui, as stock options não são tão populares quanto nos EUA, tendo em vista o número reduzido de empresas com ações em bolsa. Mas vêm se firmando como a ferramenta preferida de ILP nas companhias abertas. Para se ter uma idéia, em 2006, das 14 estreantes que fizeram oferta pública inicial (IPO, na sigla em inglês), nove optaram por stock options, ou seja, dois terços do total; em 2004 e 2005, apenas um terço delas fez o mesmo (ver tabela). Consultores de algumas das maiores empresas internacionais que atuam na área de remuneração — Towers Perrin, Stern Stewart e Watson Wyatt — garantem, no entanto, que não há motivo para se preocupar: há poucas chances de escândalos semelhantes envolvendo stock options no Brasil. Pelo menos por enquanto.

“Quando se fala em programas de stock options, há uma grande distância entre as realidades do Brasil e dos Estados Unidos”, diz Marcos Morales, diretor de capital humano da Watson Wyatt. Para começar, afirma, o grupo de empresas alvo desse tipo de ILP é muito restrito no mercado local. É formado, basicamente, por companhias com ações em bolsa e listadas nos níveis diferenciados de governança, nos quais é mais explícita a preocupação em alinhar os objetivos dos administradores e investidores, criando valor para todos. “Além disso, entre as brasileiras, os programas são desenhados em uma base muitíssimo mais conservadora no que se refere ao potencial de ganho e à quantidade de ações ofertadas, em comparação ao modelo norte-americano”, diz. “Enquanto nos Estados Unidos as opções de ações são o componente de remuneração com o maior peso — chegando a significar 90% do ganho anual do executivo — por aqui elas costumam representar um terço da remuneração total, que é bem mais equilibrada entre salário fixo, benefícios, bônus anual e opções para compra de ações”, afirma.

Felipe Rebelli, sócio da Towers Perrin, concorda. “Não existe nenhuma empresa brasileira que conceda a mesma montanha de opções que as norteamericanas”, diz. Mesmo porque, lembra Rebelli, o que predomina no Brasil é o capitalismo familiar, no qual mais de 50% das ações das companhias estão na mão de um único acionista ou de um pequeno grupo de acionistas. Nos EUA, por sua vez, predominam as empresas de controle acionário pulverizado: o imenso número de pequenos investidores acaba enfraquecendo a figura do acionista e os rumos da empresa passam a ser ditados pelos administradores. Estes últimos se tornam os “super executivos” que, nos episódios de fraude, caíram na tentação de maquiar os balanços ou, mais recentemente, alterar a data que indica o valor do exercício da opção para maximizar os seus ganhos.

APRENDENDO COM OS ERROS — O fato de os planos de remuneração dos executivos brasileiros não contarem com uma presença tão expressiva das opções, porém, não deve ser motivo para nossas companhias descartarem o exemplo de fora. Até porque, embora o mercado brasileiro continue concentrado em empresas de controle majoritário, é crescente o movimento de pulverização de capital e de situações em que os administradores podem vir a se transformar nos tais “super executivos”. Isso torna o atual momento uma ótima oportunidade para as companhias nacionais de capital pulverizado aprenderem com os erros de fora.

“Seria bom que o mercado brasileiro criasse algumas normas para evitar algo semelhante ao backdating no futuro”, afirma Rebelli, que considera a necessidade de maior disclosure envolvendo a remuneração dos principais executivos. “O investidor tem que aprender a olhar mais para essa questão, que também tem impacto sobre o valor da empresa”, diz. Uma boa medida é a instituição do comitê de remuneração que, se não puder ser formado apenas com conselheiros independentes, pelo menos seja presidido por um deles, diz o consultor da Towers. Além disso, a estratégia de remuneração da companhia deve estar alinhada à do mercado — por meio de uma pesquisa anual de salários no setor, por exemplo —, e o ganho anual do executivo precisa ser bem equilibrado entre diversos componentes, como salário base e bônus, e não concentrado nas opções. “O que se deve evitar é uma remuneração excessiva e focada em um único componente”, afirma.

Opinião semelhante tem José Roberto Carneiro, sócio líder da área de auditoria da Deloitte. “Os planos de stock options criam um fator de risco adicional para a empresa, mas há formas de endereçar este risco com uma análise criteriosa da auditoria e também com a adoção de boas práticas de governança”, diz Carneiro, para quem a atenção ao modelo deve aumentar à medida que cresce o número de empresas de controle difuso.

Para Sérgio Pinheiro, vice-presidente sênior da Stern Stewart, os episódios vistos lá fora não devem ser motivo para que nossas companhias evitem o uso das stock options. “Talvez exista uma reação exagerada aos escândalos contábeis”, diz o consultor, que vem observando uma ligeira preferência por planos de incentivo envolvendo a ação física — diferentemente dos seus concorrentes da Towers Perrin e da Watson Wyatt, que registram o interesse crescente por opções. “Não existe uma receita de bolo: cada plano tem prós e contras e as empresas precisam investir mais tempo na escolha do desenho que atenda com maior fidelidade os seus objetivos”, afirma Pinheiro.

MAIS TRANSPARÊNCIA — A Lojas Renner, uma das poucas empresas de capital pulverizado na Bovespa até o momento, tem procurado se cercar de garantias que permitam o maior disclosure nos ganhos dos administradores. A empresa já conta com um comitê de remuneração formado por conselheiros independentes que têm, entre as suas atribuições, uma avaliação anual do programa de stock options. Na próxima assembléia geral ordinária (AGO), a Renner coloca em discussão uma mudança no Plano de Opção de Compra de Ações, referente ao “valor de bolsa”, ou seja, o valor da ação no exercício da opção. Pela regra atual, o valor de bolsa é o preço médio das ações registrado no último pregão em que tenha havido maior volume de negociação, dentro de um período que envolve os dez pregões anteriores à data de outorga. Na próxima AGO, vai ser proposta a ampliação para 30 pregões. “Vamos discutir com os acionistas a possibilidade de tornar o programa mais transparente, aumentando o período de observação das ações”, diz José Calos Hruby, diretor de Relações com Investidores (RI) da Renner. Em um ano e meio, desde a criação do plano, houve duas outorgas.

Para o seu primeiro programa de opção de compra de ações, a Profarma definiu como preço de exercício o valor da ação no IPO, realizado em outubro, que foi de R$ 22,50. “Quisemos adotar um parâmetro bastante claro para toda a equipe, que com isso ganhou um motivador adicional para trabalhar pela valorização do negócio”, diz Max Fischer, diretor financeiro e de RI da Profarma. De acordo com o plano, os executivos têm a chance de exercer 20% das opções a cada ano, sendo que todo o programa de stock options tem prazo de cinco anos, e o limite para a outorga de opções é de 5% do total de ações. No plano da Profarma, que tem 51% das suas ações nas mãos da família Birmarcker, são contemplados dez executivos, entre diretores e gerentes, que não fazem parte da família.

Aliado ao programa de stock options, os executivos continuam contando com bônus que variam de cinco a seis salários anuais e dependem de metas relacionadas ao seu desempenho individual e ao da empresa. Segundo Fischer, o principal monitoramento do compromisso dos executivos com a companhia é feito é pela controladoria interna, que atua de maneira independente. “Adotamos diversos processos internos que expõem o trabalho de todos esses executivos para toda a empresa. São realizadas também reuniões mensais, de dois dias de duração, em que o desempenho de cada um é acompanhado por todos”, diz.

FOCO NO LONGO PRAZO — Outra maneira de cercear possíveis efeitos negativos das stock options é o acordo de lock up, em que se proíbe a venda de ações em determinado período, que varia entre 120 e 360 dias. “Hoje, a maioria das empresas está estabelecendo regras de lock up também para os programas de stock options, em que o executivo deve reter uma parte daquelas ações no seu patrimônio por um período mínimo, a fim de receber as futuras outorgas”, diz Rebelli, da Towers. Até os escândalos contábeis nos EUA, os programas permitiam a revenda imediata de todas as ações, ou seja, o executivo poderia vender tudo no dia seguinte ao exercício da opção. “Com isso, ele permanecia como acionista da empresa por no máximo 24 horas, sem correr o mesmo risco que os demais com a volatilidade do preço das ações em bolsa”.

Desequilíbrios como esses foram responsáveis pelos vários casos de empresas estrangeiras que migraram do modelo de stock options para o de ações restritas. Mas não foi só isso. Desde o exercício iniciado em 1º de julho de 2005, as empresas norteamericanas e européias estão obrigadas a contabilizar suas opções de ações como despesa nos balanços, o que gerou alguma migração para as ações restritas. Neste último caso, explica Rebelli, o executivo recebe um lote menor de ações da empresa, que só pode ser vendido dentro de determinado período, quando ele terá o usufruto total. Em geral, para cada quatro ações que integram uma opção, afirma o consultor da Towers, as empresas estão concedendo uma ação restrita, o que faz com que as companhias diminuam sua despesa contábil.

No Brasil, ainda não existe uma legislação específica sobre como contabilizar planos de stock options. Apenas as empresas com títulos negociados no exterior estão obrigadas a seguir as regras internacionais. A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) determina, em sua Deliberação nº 371, que haja, no mínimo, a divulgação de três informações: a natureza e as condições dos planos de opção de compra de ações; a política contábil adotada; e a quantidade e o valor pelos quais as ações foram emitidas. Há também a indicação para que sejam apresentados, quando relevantes, os efeitos no resultado e no patrimônio decorrente do exercício das opções. Outra característica do mercado brasileiro é que a outorga de compra de ações é considerada fato relevante e, como tal, deve ser divulgada em jornais até o mês seguinte.

Com as companhias de capital pulverizado à vista, é provável que essas regras tenham de ser revistas e reforçadas para se adequar a um ambiente em que as opções serão mais representativas nos salários dos executivos brasileiros. Em alguns casos, vale ressaltar, elas já são. Algumas das companhias que vieram a mercado nos últimos anos tornaram seus principais executivos milionários depois da listagem em bolsa. Por enquanto, estamos em tempo de arrumar a casa para a nova realidade. Basta não perdê-la de vista.


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